Direito da Sociedade: o direito da sociedade mundial e a hipertrofia da economia e da mídia

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19 de setembro3 min. de leitura

Caras e caros colegas,

Na semana passada, tivemos a oportunidade de falar sobre a corrupção sistêmica como um risco que decorre do acoplamento estrutural. Parece coisa de outro mundo, mas não é. O que se quis dizer foi algo simples: quando o sistema se abre para receber influências do meio que o cerca, ele corre o risco de perder a sua autonomia, ou seja, de ter o seu código de comunicação substituído pelo de outro sistema. Talvez um exemplo prático ajude a elucidar. Vejamos.

Pensemos na constituição como um acoplamento estrutural entre direito e política, o que significa dizer que ela serve como uma ponte entre os dois sistemas, o que é fundamental para ambos. Contudo, existe o risco de o sistema jurídico, por exemplo, ter o seu código (lícito/ilícito) substituído pelo código da política (governo/oposição). Nesse caso, estaremos diante de um processo de corrupção sistêmica e desdiferenciação funcional, no qual as decisões jurídicas não condenarão um cidadão por ele ter cometido um ato ilícito, mas sim pelo fato de ele ser oposição, entenderam?

Bem, como já dissemos em outras oportunidades, vivemos nessa sociedade mundial multicêntrica, caracterizada por uma pluralidade de autodescrições, fundadas em diversas racionalidades parciais conflitantes, que nos fazem reconhecer que o dissenso é estrutural, sendo múltiplos os centros de observação.

Não existe, pois, uma posição privilegiada para observar e descrever a sociedade ou um sistema social onisciente a partir do qual todos os demais devam ser compreendidos. Mesmo assim, os sistemas sociais operam com tendências imperialistas. “E o que significa isso, Chiara?”

O direito, por exemplo, não reconhece as suas limitações e busca impor os seus critérios de inclusão/exclusão aos demais sistemas, como, por exemplo, à política, à arte, à pedagogia etc. Eis um dos riscos da relação transversal entre os subsistemas sociais: a “expansão imperialista”.

Para exemplificar tal risco, Neves se utiliza da metáfora francesa, segundo a qual “uma árvore tende a crescer de tal maneira no jardim, que suas raízes e ramos poderão impedir ou prejudicar a sobrevivência das demais” (NEVES, 2009, p. 47). A expansão imperialista, portanto, não se confunde com a corrupção sistêmica, pois não se trata de sabotagem de códigos, mas de fragilização do código de comunicação de um sistema pela força excessiva de um outro, sem que haja quebra da consistência interna de um sistema por bloqueios externos.

Hoje são dois os sistemas que se destacam nesse processo imperialista sobre os demais: a mídia e a economia. Tais sistemas possuem códigos fortes, reconhecidos por todos no mundo, sendo impossível, por exemplo, negar a força do ter/não ter (código do sistema econômico) na sociedade mundial. A mídia, por sua vez, atua seletivamente em face das diversas autodescrições da sociedade, colaborando com a estabilização de expectativas cognitivas, que enfraquecem a política e o direito, por exemplo.

Segundo Neves, a “expansão imperial” ocorre quando o “sistema que dispõe de um código forte, ao relegar um outro à insignificância, não só prejudica as ‘pontes de transição’, como também dificulta que os respectivos sistemas atuem adequadamente em relação à sociedade: um por força da tendência hipertrófica; o outro, por força de uma propensão à atrofia” (NEVES, 2009, p. 47).

“Enquanto isso, na sala de justiça”, direito e política continuam presos à noção de soberania estatal, com fundamento territorial, o que os impede de fazer frente aos avanços da economia e da mídia. Ou seja, vivemos em uma sociedade mundial, mas o direito e a política continuam locais. Eis o problema que abordaremos nos próximos capítulos da série.

Até breve,

Chiara Ramos

Doutoranda em Ciências Jurídico-Políticas pela Faculdade de Direito da Universidade Clássica de Lisboa, em co-tutoria com a Universidade de Roma – La Sapienza. Graduada e Mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco. Procuradora Federal, desde 2009. Atualmente exerce o cargo de Diretora da Escola da Advocacia Geral da União. É Editora-chefe da Revista da AGU, atualmente qualis B2. É instrutora da Escola da AGU, desde 2012. Foi professora da Graduação e da Pós-graduação da Faculdade Estácio Atual. Aprovada e nomeada em diversos concursos públicos, antes do término da graduação em direito, dentre os quais: Procurador Federal, Oficial de Justiça do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Técnica Judiciária do Tribunal Regional do Trabalho 6ª Região, Técnica Judiciária do Ministério Público de Pernambuco, Escrivã da Polícia Civil do Estado de Pernambuco.

 

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