Na Antiguidade, os povos se individualizavam e, quase permanentemente, estavam em guerra de conquista entre eles; tanto que os estrangeiros eram considerados inimigos. Paradoxalmente, contudo, foi nessa época que surgiu o tratado internacional, instrumento pelo qual os potentados, que chefiavam as circunscrições de poder de então, negociavam e concluíam acordos bilaterais entre si; de certa forma, iniciando a configuração do princípio pacta sunt servanda.
A Idade Média tem, dentre suas características, a fragmentação do poder, em milhares de reinos, principados, cidades-livres, repúblicas, que, embora possuíssem sistema jurídico próprio, prestavam suserania ao Papa e ao Imperador do Sacro Império Romano-Germânico. Essa situação começaria a se modificar, por volta de 1500 da era cristã, com o surgimento da doutrina da soberania absoluta, que corporificou o Estado moderno, dotado de poder incontrastável e, por consequência, não mais sujeito a nenhuma outra instância. O corolário imediato disso, foi o surgimento do direito das gentes, depois conhecido como direito internacional público, ramo do direito apto a regular o relacionamento externo entre os Estados, uma vez que estes, como pessoas soberanas, eram insuscetíveis de se subordinarem a direitos internos de outros Estados[1]. Tratados, entretanto, não somente continuaram a ser concluídos, como, aumentaram em número e importância. Criou-se o tratado multilateral, que, como o próprio nome indica, passou a ser concluído por um número grande de Estados, servindo como meio para criar regras internacionais obrigatórias[2]
Os Estados aumentaram em número nos últimos cinco séculos, por várias razões — descolonização, princípio da livre determinação dos povos etc. —; viram sua soberania relativizar-se grandemente[3]; assistiram tentativas de outra instituição, a empresa multinacional, de dividir com eles a subjetividade de direito internacional. Apesar de tudo, o mundo continua dividido em Estados, tidos como soberanos e iguais juridicamente; sendo eles detentores principais do jus tractuum, ou seja do direito de concluir tratados[4].
Há problemas, cuja abordagem e decisão dependem do encontro de vontades e do empenho de um número razoável de Estados e que são insuscetíveis de serem dirimidos pela simples conclusão de um tratado internacional. Da necessidade de se administrar diuturnamente compromissos alcançados por um tratado internacional, surgiu uma instituição nova: a organização internacional intergovernamental. Do prisma de sua gênese, a organização é um tratado internacional, que, em busca de determinado fim, origina e mantêm órgãos administrativos permanentes, dotados de poderes próprios. Essa espécie de tratado é chamada de tratado constitutivo de organização internacional; possuindo suas disposições hierarquia superior com relação às demais regras jurídicas, que vierem a ser exaradas durante a vida da organização. O voluntarismo é princípio de direito internacional público de fulcral importância, pois ainda em homenagem ao velho princípio da soberania, afirma caber ao Estado aceitar ou não regras internacionais e ingressar ou não em organismos internacionais.
Conforme Reuter, organização internacional intergovernamental é conjunto de Estados possuidor de órgãos próprios, capaz de manifestar, juridicamente, vontade distinta da de seus membros. Os Estados, ao constituírem uma organização internacional emprestam parcelas de poder, de soberania a esse organismo permanente, gerido, no dia a dia, por funcionários internacionais (capitaneados por um secretário-geral) e controlado por meio de órgãos formados por Estados-Membros (conselho, assembleia-geral etc.). A corporificação das organizações internacionais foi lenta e em crescendo. Brotaram inicialmente, no século XIX, uniões administrativas, que pretendiam resolver, por meio da gestão conjunta, problemas comuns a certo número de países, de que são exemplos as Comissões Internacionais do Reno e do Danúbio. Nas negociações de paz que puseram fim à primeira guerra mundial, engendrou-se de um lado, organização internacional de vocação universal e de competência abrangente (Sociedade ou Liga das Nações) e, de outro, a Organização Internacional do Trabalho, que trazia a semente dos organismos especializados. No final da década de 50, do passado século, reforçou-se, tanto o conceito de organização internacional de vocação universal e de competência abrangente, com a criação da Organização das Nações Unidas; quanto o de organismos especializados, com o advento de vários organismos especializados: Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial, Organização Mundial da Saúde entre outros[5]. Nessa mesma época, importante inovação viria à tona, com a criação da Comunidade Econômica Europeia, que: iniciaria a era dos blocos econômicos regionais[6], que se espalhariam por todos os cantos do mundo; criaria a ideia de organismo internacional dotado de poderes supranacionais; e que, faria surgir um novo campo de interesse na esfera internacional, o direito internacional da integração.
Desde o Tratado de Paris (1951), que criou a Comunidade Europeia do Carvão e do Aço, e o Tratado de Roma (1957), que estabeleceu a Comunidade Econômica Europeia e a Comunidade Europeia de Energia Atômica, passando pelo Ato Único Europeu (1986), que aprofundou a integração; pelo Tratado de Maastricht (1992), que criou a União Europeia; e pelo Tratado de Lisboa (2007), que aumentou a competência legislativa do Parlamento Europeu, concebeu-se na Europa a mais completa integração de que se tem notícia, tanto pela soma de competências jurídico-econômica enfeixadas, quanto pelo número e importância dos Estados partícipes.[7]
Hoje o contingente de organizações internacionais chega a quatro centenas, sendo muito diferentes em sua abrangência, poderes, objetivos e importância. Contudo, são atores de primordial importância, quer no âmbito internacional (são sujeitos de direito internacional público e detentores do poder de concluir tratados); quer no fomento de políticas nacionais adotadas pelos cerca de duzentos Estados existentes no mundo (dificilmente um Estado, embora poderoso, pode formular suas políticas internas, nos mais variados setores, absolutamente à margem das políticas deduzidas por organizações de vocação política ou especializada).
Em razão do voluntarismo, um Estado pode ingressar tanto numa Federação de Estados, quanto em uma organização internacional. Diferença basilar entretanto existe: ingressar em uma federação significa abandonar o exercício singular de soberania e desistir do direito de secessão; já a afiliação em organizações internacionais não retira o exercício soberano, que pode ser exercido, inclusive para se retirar da organização.
A saída de organização foi um tema preocupante desde os primórdios da gênese de tais organizações. Os Estados passam a compor tal tipo de organismo em razão de necessidade e não por mero diletantismo, em colocar em comum parcelas de suas soberanias. Como a vontade da organização nem sempre agrada todos os membros, não é de se estranhar que um membro possa querer externar sua não aceitação, retirando-se da mesma. Por isso, desenhou-se a estratégia de se inserir no tratado constitutivo da organização uma cláusula, ao mesmo tempo protetiva e dissuasória, segundo a qual a retirada de um Estado somente se consumaria, após um prazo, geralmente de dois anos da comunicação da vontade de retirar-se, além do cumprimento de todas as obrigações assumidas até o exaurimento desse prazo.
As organizações diferem muito em complexidade; sendo óbvio que a retirada é muito mais trabalhosa, quando tenha havido imbricamento mais profundo do direito da organização e do dos Estados-membros. Isso ocorre, em particular nos organismos regionais de integração econômica; cuja dificuldade é crescente, quanto maior tenha sido a integração. Sair da União Europeia, que já percorreu todos os degraus da integração econômica (zona de preferência tarifária, zona de livre-comércio, união aduaneira, mercado comum e união econômica e monetária[8]) é particularmente penoso e demorado.
Aspecto digno de ser considerado é o afã ou não dos Estados em ingressar em organizações internacionais; bem como o afã ou não deles em nelas permanecer. Tal depende, obviamente, do valor que os Estados emprestam em estar em determinada organização internacional. Criada a Liga ou Sociedade das Nações, houve interesse crescente dos Estados em serem participantes da primeira organização internacional aberta, em princípio, a todos os Estados e cuja finalidade abarcava qualquer assunto, desde que internacional. Nas décadas de trinta e quarenta do séc. XX, não parecia tão arraigado o pensamento de que se manter no foro internacional fosse realmente necessário; tanto que alguns países, sem muita cerimônia, retiraram-se da Liga ou Sociedade das Nações: o Brasil (em 1926, pelo motivo fútil de não ter sido escolhido como membro permanente do Conselho); e Alemanha e Japão (ambos talvez para evitar a expulsão, como aconteceria mais tarde com a URSS). Contudo, esses países, voltaram a compor a organização sucessora — a ONU —, o Brasil como Estado-Fundador e os demais assim que as circunstâncias o permitiram. Nos anos 60 e seguintes, quando a descolonização tornou-se tema internacional por excelência, alguns países, que ainda possuíam colônias, lutaram bravamente contra sua expulsão de organismos especializados da ONU, em que parte de seus membros, extremamente politizados, utilizavam a expulsão como meio de punição e de pressão contra o colonialismo e o apartheid. Tal denota, o sentimento de que estar fora de organismos internacionais deixaria o país isolado , como que um pária internacional. Por outro lado, há de ser lembrado o interesse com que países, como a China, aguardaram anos até ser admitido na Organização Internacional do Comércio.
Há que se considerar, não obstante, que a retirada de Estado-Membro de blocos econômicos, mormente aqueles que já palmilharam grande parte do caminho em busca do ‘mercado comum e união econômica e monetária’ é particularmente difícil e demorada. No caso do Reino Unido, em que consulta popular indicou ao governo a saída da União Europeia, a respectiva efetivação será complexa e de consequências, principalmente econômicas, imprevisíveis. Tanto isso é verdade, que em alguns países componentes do referido Reino, há fortes indicações de que prezam mais sua manutenção como membros da União Europeia, do que a permanência no próprio Reino Unido. Pode-se concluir que o apego de Estados membros à permanência em organizações internacionais não diminuiu. O sinal enviado pela consulta feita no Reino Unido representa um ponto fora da curva!
Fonte: Conjur
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