O direito de arrependimento no Código de Defesa do Consumidor

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Por: Projeto Exame de Ordem | Cursos Online
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa demonstrar a expansão do comércio eletrônico no Brasil, os seus conceitos e como este crescimento influenciou na norma consumerista, trazendo ao ordenamento jurídico o direito de arrependimento do consumidor a partir do recebimento do produto ou da execução do serviço contratado. Considerado uma característica peculiar das práticas comercias virtuais o direito ao arrependimento tem sido uma prática fundamental na equiparação das relações de consumo, outrora desequilibradas em razão da posição superior dos fornecedores.
2. AS RELAÇÕES DE CONSUMO EM AMBIENTE VIRTUAL
As relações de consumo se dão das mais diversas formas, porém, com o passar dos anos, novos meios de se estabelecer vínculos consumeristas surgem em nossa sociedade, decorrentes das grandes transformações geradas pelos avanços tecnológicos.
Um dos meios de aquisição de bens que trouxe às relações de consumo grandes inovações foi o comércio eletrônico, mais precisamente, a possibilidade de adquirir bens de qualquer natureza através da internet ou de qualquer outro ambiente virtual.
O e-commerce ou comércio-e, como é conhecido o comércio eletrônico, já existia mesmo antes do surgimento da internet, pois muitas compras eram realizadas por meio de contato telefônico, televisivo, entre outros meios. Sobrevindo a internet, esta modalidade de compra se expandiu estratosfericamente, ampliando os conceitos de consumo e os direitos dos consumidores no que tange a esta modalidade.
O comércio eletrônico é então classificado a partir da espécie do estabelecimento em que se celebra o vínculo jurídico. Este estabelecimento deverá ser sempre virtual e não necessariamente depende de uma conexão com a internet, mas sim de qualquer transmissão de dados ou meio de comunicação que permita a finalização do referido negócio. Assim, a natureza do bem ou serviço em negociação não influencia na classificação da atividade como eletrônica ou não, sendo irrelevante a materialidade do bem ou serviço para que sobre ele incida as disposições legais relativas à relação comercial eletrônica. (NEVES, 2014, p. 1 e 2).
Muitas são as especificidades existentes nas compras virtuais e embora antes o comércio eletrônico não tivesse um tratamento diferenciado, após o decreto 7.962/13, alguns pontos inerentes ao consumo em ambiente virtual passaram a ser melhores observados, como por exemplo, a prestação clara de informações, o atendimento facilitado ao consumidor, bem como, o direito ao arrependimento, que é o maior diferencial das relações convencionais.
Além deste decreto, temos também o Marco Civil da Internet, promulgado em 23 de abril de 2014 sob 12.965, que traz princípios a respeito do tratamento que o Poder Público deve dar às questões jurídicas ligadas à tecnologia. Embora esta legislação não atinja diretamente os consumidores, ela impacta significativamente a atuação do comércio eletrônico do Brasil, pois determina em linhas gerais limitações acerca do uso de dados, dispõe sobre a proteção à privacidade dos usuários, que só poderá ser quebrada mediante ordem judicial, bem como abrange outros aspectos que direcionam o exercício das empresas responsáveis pelos provedores, entre outros. No concernente à comercialização de bens e serviços por meio eletrônico o Marco Civil, embora não trate de forma individual este aspecto, versa sobre a proteção à privacidade de dados e a proibição à captação de dados indevida e estes quesitos influem substancialmente na atividade de comércio virtual. (TEIXEIRA, 2014)
3. O DIREITO DE ARREPENDIMENTO E O SEU SURGIMENTO
É possível observar que o comércio eletrônico se encontra em grande expansão. Além de propiciar ao consumidor conforto e praticidade, pois na maioria dos casos as compras de bens e serviços são rapidamente realizadas sem que se dispenda muito tempo para isto, os produtos são entregues diretamente nas respectivas residências em poucos dias. Ainda, é possível que cada consumidor tenha acesso à diversas plataformas diferentes de forma simultânea, escolhendo as melhores condições e preços.
Ocorre que, diante de todas estas facilidades, os meios pelos quais as empresas se utilizam para alcançar sua clientela também são os mais variados. Desde ofertas encaminhadas ao seu correio eletrônico, até simples anúncios em sua timeline do Facebook que são disponibilizados com base em suas pesquisas recentes e seus interesses de consumo. Todos estes mecanismos movimentam o grande comércio eletrônico. De acordo com dados da ABCom – Associação Brasileira de Comércio Eletrônico, este mercado arrecadou, apenas em 2016, a quantia de R$53,4 bilhões e cresceu 11% em relação ao ano de 2015. (ECOMMERCE, 2017).
De modo geral o Código de Defesa do Consumidor busca trazer equilíbrio às relações de consumo como um todo priorizando sempre a parte hipossuficiente que é o consumidor. No caso em questão, o direito de arrependimento surge como uma peculiaridade da negociação virtual, pois visa em princípio proteger o consumidor de eventuais propagandas enganosas, também de informações imprecisas sobre o produto e, conforme citado acima, das compras realizadas impulsivamente em razão do bombardeio de anúncios na internet.
O direito de arrependimento está previsto no Art. 49 do Código de Defesa do Consumidor que dispõe o seguinte:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Parágrafo único. Se o consumidor exercitar o direito de arrependimento previsto neste artigo, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados.

Conforme supramencionado, o direito de arrependimento é o prazo de sete dias concedido ao consumidor para que este se certifique de seu desejo de permanecer com o produto, verifique se o produto encaminhado está de acordo com as especificações informadas pelo comerciante ou mesmo desista da compra sem qualquer motivo.
Este prazo também é conhecido como “prazo de reflexão” pois possibilita ao adquirente do bem ou serviço avaliar a real necessidade daquela compra, neutralizando as chamadas práticas comerciais agressivas, que destacam produtos pesquisados durante a navegação do consumidor na internet. (BESSA, 2015).
O direito de arrepender-se gera ao comerciante o dever de restituir ao consumidor todos os valores gastos com o produto, inclusive o pagamento do frete, corrigindo-os monetariamente. Neste sentido, também é de obrigação exclusiva do fornecedor informar à instituição financeira ou administradora do cartão de crédito ou similar sobre o cancelamento da compra, a fim de evitar que a transação seja lançada na fatura do consumidor ou, caso já tenha sido lançada, seja realizado o estorno do valor, conforme dispõe o parágrafo 3 do art. 5 do Decreto 7.962/2013.
Outro aspecto importante deste instituto é a desobrigação do consumidor de prestar qualquer esclarecimento acerca da desistência da compra. O comerciante não poderá de forma alguma condicionar o cancelamento do produto a algum tipo de justificativa, pois é assegurado ao comprador o direito de não se explicar, mas de apenas solicitar o cancelamento do pedido no prazo legal com as devidas restituições corrigidas.
Desta forma, o fornecedor também está sujeito a informar ao consumidor de forma transparente e notória a respeito dos meios para exercício do seu direito de arrependimento. O consumidor pode ainda se utilizar do mesmo meio de aquisição para manifestar o seu interesse no cancelamento, sem prejuízo da utilização de outras formas de comunicação.
De acordo com o art. 49 do Código de Defesa do Consumidor, este direito se aplica apenas às relações celebradas fora dos estabelecimentos comerciais físicos. Isto posto, verifica-se a importância de entender como se identifica uma relação de consumo virtual, como feito anteriormente, a fim de que se entenda quais relações jurídicas se encaixam na legislação aqui apresentada.
O exercício do direito de arrependimento enseja também o cancelamento de eventuais contratos acessórios e o fornecedor deve comunicar imediatamente ao consumidor o recebimento da manifestação de arrependimento.
Há, no entanto, uma certa divergência no que se refere à contagem do prazo de sete dias. Em razão da omissão da lei, alguns entendem que o prazo é contado a partir da realização do negócio. Porém, tal entendimento não torna efetiva a proteção ao consumidor objetivada pelo direito de arrependimento, visto que, os produtos e serviços não são executados imediatamente após à contratação e não seria possível que o adquirente analisasse melhor a adequação da compra.
Desta forma, pacificou-se o entendimento de que a contagem do prazo de sete dias para desistência da compra se dá a partir do dia subsequente à entrega do bem ou do início da prestação do serviço. (FUNDAÇÃO PROCON – SP).
O descumprimento ao direito de desistência pode gerar para os fornecedores sanções administrativas, bem como o pagamento, na esfera judicial, de indenização de cunho moral ao consumidor. Em contrapartida, o consumidor não poderá pleitear o arrependimento da compra fora do prazo ordenado, nem compelir o fornecedor a cumprir tal solicitação, visto que o seu direito foi atingido pela decadência.
4. A INFORMAÇÃO NO DIREITO DE ARREPENDIMENTO
Conforme dispõe o Código de Defesa do Consumidor, o direito à informação é um princípio basilar da proteção às relações de consumo. O art. 4, inciso IV do referido dispositivo legal versa o seguinte:

Art. 4 A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo;

Em conjunto com o princípio da informação, podemos constatar também o princípio da transparência, que se encontra presente em nosso ordenamento e rege as relações de consumo.

“O princípio da transparência consagra que o consumidor tem o direito de ser informado sobre todos os aspectos de serviço ou produto exposto ao consumo, traduzindo assim no princípio da informação. Havendo omissão de informação relevante ao consumidor em cláusula contratual, prevalece a interpretação do artigo 47 do CDC, que retrata que as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira, mais favorável ao consumidor.” (MARTINS, 2002, p. 104 e 105).

Com base nisto, podemos observar que o direito à informação é um viés muito presente no direito de arrependimento, visto que este último, em vários casos, é exercido quando há uma grave falha na prestação de informações sobre o produto ou serviço contratado. Neste sentido, cabe ao fornecedor se atentar para que todas as especificações sejam prestadas ao consumidor de forma precisa e clara, como determinado em lei.
As informações não se limitam apenas ao produto ou serviço, mas, conforme mencionado anteriormente, o fornecedor também tem o dever de fazer com que o consumidor tenha ciência do seu direito de arrepender-se do negócio firmado. Embora pareça uma posição contrária ao interesse do comerciante, tal medida é mais um mecanismo de fazer com que as relações virtuais de consumo sejam pautadas em racionalidade e equilíbrio, protegendo a parte mais frágil da relação, que é o consumidor.
5. CONCLUSÃO
Diante de todo o exposto, podemos concluir que o direito ao arrependimento tem sido eficaz ao fim a que se destina, permitindo que os consumidores tenham meios de se defender de práticas abusivas de comércio, propagandas enganosas e do marketing agressivo praticado no ambiente virtual, através da desistência da compra e sem sofrer nenhum ônus patrimonial.
Assim, considerando as relações de consumo firmadas por meio eletrônico, podemos notar que o ordenamento jurídico tem conseguido acompanhar a expansão econômica do e-commerce, buscando apreciar as diferenças destas relações e assegurar a proteção ao consumidor em qualquer ocasião.
Por Raul Vallejos
Fonte: Migalhas

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