A nova Súmula nº 619 do STJ e a impossibilidade de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias em bens públicos, na hipótese de ocupação indevida por parte do particular

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O Superior Tribunal de Justiça aprovou, no dia 24 de outubro de 2018, a súmula de número 619. É a mais nova Súmula daquele Tribunal e que, em razão de suas repercussões no âmbito do direito civil e administrativo, pode ser exigida em concursos públicos.
Trata-se de uma súmula que veio para sedimentar a jurisprudência em relação ao tema, deixando claro que o particular que ocupa indevidamente bem público não é possuidor, mas, apenas, detentor daquele imóvel. Do mesmo modo, a súmula ingressou na questão atinente à possibilidade (ou não) de indenização por benfeitorias nessa hipótese.
A referida Súmula resultou na seguinte redação: “A ocupação indevida de bem público é mera detenção de bem, inexistindo indenização por benfeitorias”.
Como se vê, tal Súmula possui natureza de Direito Material, estabelecendo, de forma clara, que, na hipótese de ocupação indevida, o particular não terá os direitos inerentes à posse.
Nesse contexto, torna-se importante relembrar que, consoante ao que estabelece o Código Civil, “possuidor é todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade” (art. 1196 do CC); e Detentor é todo “aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas” (art. 1197 do CC).
Essa distinção ganha relevância em razão dos efeitos de cada instituto, isso porque o “Possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado” (art. 1210 do CC), enquanto ao Detentor não são atribuídos tais direitos. Daí a relevância da referida súmula.
Observe-se, ainda, que ao Possuidor de boa-fé é assegurado “o direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis” (art. 1219 do CC), direitos esses que não são assegurados ao Detentor. Nesse sentido, veja-se o que fora decidido no REsp n° 1160658/RJ:

Na realidade, quanto à indenização pelas benfeitorias, veja-se, por oportuno, que a relação que se estabelece entre o particular e o bem público não configura posse, ao revés, mera detenção. Veja-se, outrossim, que o mero detentor não tem direito ao recebimento de indenização por benfeitorias.

Ademais, subjaz à indenização em questão (artigo 1219 do CC) o direito de retenção até que seu valor seja efetivamente pago. Sucede que, não se pode admitir que um particular retenha um bem público, sob pena de se reconhecer, por via oblíqua, a posse individual de bem de natureza coletiva, providencia incompatível com o regime jurídico aplicável aos bens em apreço (bens públicos) (AgRg no Ag 1160658  RJ  2009/0036809-0  Decisão:27/04/2010 DJe  DATA:21/05/2010).

Salienta-se que esse entendimento quanto à precariedade e consequente ausência de posse quando da irregular ocupação de bens públicos engloba tanto os pertencentes aos Entes, quanto os bens pertencentes às Entidades Públicas, sendo irrelevante, inclusive, se o ocupante irregular agiu de boa ou má-fé. A propósito:
Alega ainda que não há jurisprudência pacífica no STJ que se aplique aos autos, uma vez que, no caso, a posse do imóvel foi tomada de boa-fé pela recorrente, motivo pelo qual ela mereceria ser indenizada pelas benfeitorias realizadas.

Ao final, pede a reconsideração da decisão agravada, ou o julgamento do regimental pelo Colegiado.

(…)

2. “Os imóveis administrados pela Companhia Imobiliária de Brasília (TERRACAP) são públicos” (EREsp n. 695.928⁄DF, Relator Ministro JOSÉ DELGADO, CORTE ESPECIAL, julgado em 18⁄10⁄2006, DJ 18⁄12⁄2006, p. 278).

3. A indevida ocupação de bem público descaracteriza a posse, qualificando a mera detenção, de natureza precária, que inviabiliza a pretendida indenização por benfeitorias. Precedentes.

Nesse mesmo sentido, são precedentes da Súmula 619/STJ dentre outros, os seguintes: REsp n. 824129/PE, REsp n. 1319975/DF, REsp n. 460180/ES, REsp n. 699374/DF, REsp n. 1055403/RJ.
Portanto, compreende-se que a referida Súmula, de fato, explicita um entendimento sedimentado no âmbito do STJ, respeitando o regime especial inerente aos bens públicos, considerando a peculiar natureza que estes possuem, sobretudo quanto à imprescritibilidade e sobreposição do interesse público sobre o privado.
 


Nilton Coutinho
Doutor em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Direito pelo CESUMAR/PR. Especialista em planejamento e gestão municipal pela FCT/UNESP. Procurador do Estado de São Paulo, com atuação perante os Tribunais Superiores em Brasília. Professor junto ao programa de Mestrado em Direito da Universidade Católica de Brasília. Palestrante nas áreas de direito público e direitos humanos, com diversos livros e artigos publicados.


 

 
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