Em recentes casos enfrentados pelo Tribunal Superior do Trabalho discutiu-se o destino do depósito recursal realizado em data anterior ao deferimento do processamento da recuperação judicial. Nesses casos, indaga-se: a superveniência do deferimento da recuperação judicial tem o condão de impedir o levantamento pelo impetrante do valor depositado a título de depósito recursal?
Existem duas linhas de entendimento acerca do tema.
A primeira linha de entendimento defende que como o bloqueio/depósito judicial foi realizado antes do deferimento do pedido de recuperação judicial do impetrante e teve como finalidade principal garantir a satisfação de eventual crédito trabalhista, os valores, quando bloqueados, se desligam do patrimônio da empresa e assumem o papel de garantia de uma futura execução, razão pela qual não devem ficar à disposição do juízo falimentar, mas, sim, do juízo trabalhista.
Logo, como os valores não mais integravam o patrimônio da empresa ao tempo da decretação da recuperação judicial, torna-se a Justiça do Trabalho competente para promover atos executórios em relação à quantia, caso mantida a condenação. Para essa corrente, o art. 6º da Lei nº 11.101/2005 alcança apenas as constrições judiciais ou depósitos judiciais feitos após o deferimento da recuperação judicial, o que não ocorreu no caso em questão, em que o depósito recursal foi efetuado antes do deferimento do pedido de recuperação judicial da impetrante.
Esse foi o entendimento que prevaleceu na decisão no Informativo TST nº 177, cuja decisão ficou assim ementada:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. EMPRESA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DEPÓSITO JUDICIAL ANTERIOR AO PROCESSAMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. O depósito judicial realizado antes do deferimento do processo de recuperação judicial não mais integrava o patrimônio da empresa ao tempo da decretação da recuperação judicial, razão pela qual não se submete à vis atracctiva do juízo universal. O depósito judicial teve como finalidade principal garantir a satisfação de eventual crédito trabalhista, de forma que, quando realizado, desligou-se do patrimônio da empresa/impetrante, e assumiu o papel de garantia de uma futura execução, não devendo ficar à disposição do juízo falimentar, mas, sim, do juízo trabalhista. Inexiste direito líquido e certo que ampare a pretensão de ver cassada ou, pelo menos, suspensa a decisão judicial que determinou o regular prosseguimento do feito nesta Especializada. Recurso ordinário conhecido e provido. (RO-94-09.2016.5.20.0000, Relator Ministro: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 24/04/2018, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 27/04/2018). (grifos no original)
Por sua vez, a segunda linha de entendimento afirma que o Provimento nº 1/2012, que foi incorporado à Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho de 2012, já considera a jurisprudência do STJ e do STF, no sentido de que é do Juízo de Falências e Recuperações Judiciais a competência para a prática de quaisquer atos de execução referentes a reclamações trabalhistas movidas contra a Empresa Recuperanda.
O Provimento nº 01/2012 da CGJT não fazem qualquer distinção relacionada ao momento em que se deu a constrição ou depósito judicial da empresa cuja recuperação judicial foi declarada, limitando-se a prescrever que a prática de quaisquer atos de execução referentes às reclamações trabalhistas movidas contra a empresa recuperanda é de competência do Juízo Universal da Falência ou Recuperação Judicial. Portanto, ainda que alguns precedentes isolados de Turmas façam referida diferenciação, é certo que a Jurisprudência da SBDI-2 do Corte, em conformidade ao Provimento nº 01/2012 da CGJT, e também com os precedentes do STJ e STF, conduzem-se ao entendimento de que todos os atos de execução referentes às reclamações trabalhistas cuja recuperação judicial tenha sido declarada somente podem ser executados perante o Juízo Universal.
O fato de a constrição ou, ainda, um depósito recursal ser realizado antes da declaração de recuperação judicial, não constitui elemento diferenciador que possibilite adoção de procedimento diverso, cabendo à Justiça do Trabalho tão somente determinar a expedição de certidão de habilitação de crédito a ser submetida ao Juízo Universal. No caso, a competência da Justiça do Trabalho, em relação às reclamadas cuja recuperação judicial tenha sido declarada, limita-se à constituição do crédito trabalhista, até o momento da liquidação.
No informativo seguinte, o de nº 178, prevaleceu o entendimento da segunda corrente, ficando superado o entendimento noticiado no Informativo TST nº 177. A segunda corrente, adotada mais recentemente pelo TST, é a que reflete a atual posição do TST, que se coaduna com o entendimento do STJ:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. DEPÓSITO RECURSAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DECLARADA POSTERIORMENTE. EXECUÇÃO PROCESSADA NO JUÍZO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE LIBERAÇÃO DE VALORES DEPOSITADOS ANTERIORMENTE NO ÂMBITO DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Declarada a recuperação judicial da reclamada, a competência da Justiça do Trabalho fica adstrita à formação do título executivo até momento da liquidação. Nos termos da jurisprudência da SBDI-2 desta Corte, à Consolidação dos Provimentos da CGJT, e aos precedentes do STJ e STF, firmou-se o entendimento de que todos os atos de execução referentes às reclamações trabalhistas cuja executada tenha a recuperação judicial declarada somente podem ser executados perante o Juízo Universal, ainda que o depósito/ constrição tenha ocorrido em momento anterior à mencionada declaração, sendo do Juízo Universal a competência para a prática de quaisquer atos de execução referentes a reclamações trabalhistas movidas contra a Empresa Recuperanda. (RO-348-74.2016.5.13.0000, Redator Ministro: Renato de Lacerda Paiva, Data de Julgamento: 15/05/2018, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 08/06/2018).
Em conclusão, embora o depósito recursal fique à disposição do Juízo trabalhista, ele não integra o patrimônio do reclamante, ainda que realizado antes do processamento da recuperação judicial ou da decretação da falência da empresa, de modo que todos os atos de execução referentes às reclamações trabalhistas movidas contra a recuperanda são de competência do Juízo universal, consoante jurisprudência reiterada do STJ e, agora, seguida pelo TST.