Recentemente publiquei aqui, no Blog do Gran Cursos Online, um artigo intitulado “Simplificando a classificação das anemias” em que te mostrei que as anemias podem ser classificadas sob dois pontos de vista diferentes: a classificação fisiopatológica e a classificação morfológica, já conferiu? Se você ainda não leu, corra lá e leia antes de prosseguirmos, pois vai ser muito importante para que você compreenda o conteúdo do presente artigo.
Ótimo, então vamos prosseguir! Agora que você já sabe o conceito de anemia e que ela pode ter múltiplas causas, dentre elas alterações nos genes que regulam a produção da hemoglobina, que é a proteína responsável pelo transporte de oxigênio dos pulmões para os tecidos, pelas hemácias, vamos conhecer um pouco mais sobre as hemoglobinopatias.
As hemoglobinopatias constituem um grupo de doenças de origem genética, em que mutações nos genes que codificam a hemoglobina levam a alterações na sua produção. Estas alterações podem ser de dois tipos, que veremos a seguir.
Vamos começar pelas alterações estruturais em que a hemoglobina produzida não funciona da forma adequada, o que leva a redução na vida útil das hemácias. Ou seja, a medula consegue produzir a hemoglobina nas quantidades normais, porém o defeito estrutural na molécula limita sua capacidade de transporte de oxigênio ou afeta a estrutura da própria hemácia, favorecendo sua destruição periférica (hemólise). O principal exemplo deste tipo de hemoglobinopatia é a anemia falciforme.
A anemia falciforme resulta de uma mutação no cromossomo 11, em que ocorre uma substituição da base nitrogenada timina (T) por adenina (A), na posição 6 do gene responsável pela síntese da cadeia β de hemoglobina. Como resultado, ocorre a substituição do aminoácido ácido glutâmico por valina, o que dá origem a uma hemoglobina variante denominada hemoglobina S (Hb S, do inglês sickle que significa foice), a qual possui forte tendência a se polimerizar, levando a hemácia a adquirir um formato de foice, sempre que o sangue é exposto a menores concentrações de oxigênio. Neste formato o eritrócito se torna mais rígido, menos flexível, mais propenso à hemólise, com consequente instalação de um quadro de anemia no paciente (além de diversas outras alterações).
Se na posição 6 do gene responsável pela síntese da cadeia β de hemoglobina a mutação for um pouquinho diferente e levar à substituição do aminoácido ácido glutâmico por lisina, teremos um outro tipo de hemoglobina variante, a hemoglobina C, ok?
Também podem ocorrer as alterações de produção, em que a medula apresenta uma diminuição na taxa de produção da hemoglobina, levando a graus variados de anemia. O principal exemplo deste tipo de hemoglobinopatia é o grupo de hemoglobinopatias denominado talassemias.
Para entendermos as talassemias, vamos começar dizendo que além da hemoglobina S e da hemoglobina C, mencionadas anteriormente, também existem outras hemoglobinas variantes como por exemplo a hemoglobina A2 que possui duas cadeias α e duas cadeias δ ao invés da composição normal da hemoglobina A que é de duas cadeias α e duas cadeias β e a hemoglobina F (principal hemoglobina produzida pelo feto durante a gestação) com duas cadeias α e duas cadeias γ.
A produção da HbF diminui no nascimento e atinge os níveis de adultos em cerca de um ano mas em alguns distúrbios hereditários como em um tipo de talassemia denominado talassemia beta, permancem elevados.
Temos ainda a hemoglobina H, que ocorre em alguns casos de talassemia alfa,em que a molécula de hemoglobina é composta apenas de de quatro cadeias β ou seja, não há síntese de cadeias α. Neste caso, embora as cadeias β sejam normais, a função do tetrâmero não é. A molécula de hemoglobina resultante tem grande afinidade pelo oxigênio, o que diminui a liberação desse gás para as células gerando hipóxia nos tecidos.
Não podemos esquecer também da hemoglobina de Bart, que ocorre em alguns fetos com talassemia alfa. Eu disse fetos pois, infelizmente, esta molécula de hemoglobina, formada por quatro cadeias γ possui uma afinidade tão grande, mas tão grande pelo oxigênio que, com frequência, torna a mutação imcompatível com a vida.
Para finalizar, vamos entender melhor o que são as talassemias e como são classificadas.
As talassemias são um grupo de anemias hemolíticas hereditárias microcíticas, caracterizadas por defeito da síntese da hemoglobina. Quando este defeito é uma deleção de genes que sintetizam a cadeia α de globina, dizemos ser uma talassemia alfa. Já quando este defeito é uma deleção de genes que sintetizam a cadeia β de globina, dizemos ser uma talassemia beta. Em ambos os casos, há a formação de uma hemoglobina anormal (variante), o que resulta na destruição das hemácias e consequente anemia. Vale lembrar que no cromossomo 16 temos a informação genética para produzir a globina α e no cromossomo 11 para a globina β, não se esqueça!
E qual é o exame laboratorial utilizado para identificar e classificar as hemoglobinopatias? É a Eletroforese de hemoglobinas por meio do qual a amostra de sangue colhida em EDTA é submetida a uma corrente elétrica resultando na separação das hemoglobinas de acordo com sua capacidade de migração. Ou seja, as molécula de hemoglobina do paciente se dividem em bandas diferentes de acordo com seu peso molecular. O resultado é então comparado a um padrão normal, saudável, verificando a presença das hemoglobinas anormais.
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