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O Tribunal do Júri, previsto na Constituição Federal, foi instituído no Brasil desde 1822 e tem como competência julgar crimes dolosos contra a vida. Neste tipo de tribunal, cabe a um colegiado de populares – os jurados sorteados para compor o conselho de sentença – declarar se o crime em questão aconteceu e se o réu é culpado ou inocente. Dessa forma, o magistrado decide conforme a vontade popular, lê a sentença e fixa a pena, em caso de condenação.
O julgamento é dividido por fases. A primeira fase, chamada de judicium accusationis ou juízo de acusação, tem por objeto a admissibilidade da acusação perante o Tribunal. Em poucas palavras, consiste em produção de provas para apurar a existência de crime doloso contra a vida.
A segunda fase, chamada de judicium causa ou juízo da causa, se refere ao julgamento, pelo Júri, da acusação admitida na fase anterior. Começa com o trânsito em julgado da sentença de pronúncia e se encerra com a sentença do juiz-presidente do Tribunal Popular.
Ao final da primeira fase do procedimento do Tribunal do Júri, é dado ao magistrado pronunciar o réu, impronunciá-lo, absolvê-lo sumariamente ou desclassificar o delito. Impronúncia é uma sentença terminativa pela qual o Juiz encerra a primeira fase do procedimento do júri sem atacar o mérito da decisão, por não haver elementos suficientes de autoria e materialidade.
Está prevista no art. 414 do CPP:
Não se convencendo da materialidade do fato ou da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, o juiz, fundamentadamente, impronunciará o acusado.
Há autores, entretanto, que defendem ser a impronúncia uma decisão interlocutória mista terminativa. Para Aury Lopes Junior[1], por exemplo, a decisão de impronúncia é uma decisão terminativa que encerra o processo sem julgamento de mérito. Não há, neste caso, a produção de coisa julgada material, pois o processo pode ser reaberto a qualquer tempo, até a extinção da punibilidade, desde que surjam novas provas.
Para a orientação minoritária, que tem por um dos maiores representantes o professor Paulo Rangel[2], a decisão de impronúncia é inconstitucional, pois não dá ao acusado a certeza de que o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública e do ônus da prova, em hipótese em que não conseguiu a comprovação do crime e indícios de autoria, pedirá a absolvição. Até porque o princípio da presunção de inocência informa esse dever do Ministério Público, que, ante a falta de materialidade do delito e/ou indícios de autoria, deve pedir a absolvição.
Se o réu é inocente e não se acharam indícios suficientes de que o acusado é autor do fato que foi imputado, não faz sentido manter o impronunciado aguardando indefinidamente a extinção da punibilidade, gerando profunda instabilidade em sua vida, pois ele fica sujeito, dessa forma, a ser processado novamente a qualquer tempo. O principal argumento dessa tese é que, com a decisão de impronúncia, o réu não estaria absolvido nem condenado. Em sua folha de antecedentes criminais, constará que o processo está paralisado pela impronúncia. Para os autores que concordam com essa tese, a impronúncia vai contra os postulados do processo penal moderno, que é instrumento de garantia, e não de punição.
No mesmo sentido, o doutrinador Aury Lopes Jr.[3] diz que, ao impronunciar o réu por não estar o juiz convencido da materialidade do fato ou de indício de autoria ou participação, estará o Estado falhando com a sua prestação jurisdicional, bem como submetendo o impronunciado a um inconveniente jurídico, pois a impronúncia gera um estado de pendência, de incerteza e insegurança processual.
Guilherme de Souza Nucci[4] defende que, no Estado Democrático de Direito, soa-nos contraditória essa posição na qual é inserido o acusado, após a impronúncia, uma vez que ele não tem direito de ir a Júri para ter o mérito da questão apreciado e conseguir, se for o caso, a absolvição definitiva, mas também não está absolvido desde logo. É lançado num limbo jurídico.
[1] LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal, 11 ed – São Paulo, Saraiva, 2014.
[2] RANGEL, Paulo. Curso de processo penal. 25. ed. Rio de Janeiro: Saraiva, 2017.
[3] LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal, 11 ed – São Paulo, Saraiva, 2014.
[4] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 11ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2014.
Cristiane Damasceno – Mestranda em Direito Constitucional pela EDB/IDP; pós-graduada em Direito Processual Penal pela Universidade Gama Filho; formada em Direito pelo Uniceub. Advogada, Conselheira da OAB/DF, professora de Direito Penal e Processo Penal da Escola de Direito de Brasília – EDB/ IDP. Coordena as atividades jurídicas de atendimento prisional do NPJ/EDB-IDP.
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