Em caso de prejudicialidade externa heterogênea, por quanto tempo o processo do trabalho pode ficar suspenso?

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Recentemente o Tribunal Superior do Trabalho enfrentou um interessante caso tratando de duração razoável do processo e prejudicialidade externa heterogênea. A decisão, diante da sua importância, foi publicada no Informativo TST n.º 255. Portanto, há grandes chances desse entendimento vir a ser cobrado em concursos públicos. Sem mais delongas, vamos ao conteúdo.

Primeiramente, vamos falar rapidamente de duração razoável do processo. O princípio da duração razoável do processo está assentado no art. 5º, inciso LXXVIII, da CR/88, desde a EC n.º 45/2004: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Trata-se de direito fundamental de todos e está previsto em vários diplomas internacionais. Cite-se, exemplificativamente, o art. 8º do Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Americana de Direitos Humanos).

Desse modo, pode-se afirmar que  processo deve durar razoavelmente, ou seja, não pode ser rápido demais – a ponto de comprometer as garantias do contraditório e da ampla defesa –, tampouco demorar demais, a ponto de comprometer o próprio direito material.

Mas, o que é duração razoável do processo? Existem parâmetros objetivos para tanto? A Corte Interamericana de Direitos Humanos se vale de quatro critérios cumulativos para avaliar, em cada caso concreto, a duração razoável do processo: i) conduta das autoridades judiciais; ii) atividade processual do interessado; iii) complexiadade da causa; iv) afetação gerada na situação jurídica da pessoa envolvida no processo.

A propósito, o Brasil já conta com algumas condenações na CIDH por violação ao princípio da duração razoável do processo: a) Corte IDH, Caso Ximenes Lopes vs. Brasil, sentença de 4 de julho de 2006, Mérito, Reparações e Custas, Série C, nº 149; b) Corte IDH, Caso Empregados da Fábrica de Fogos de Santo Antônio de Jesus e Seus Familiares vs. Brasil, sentença de 15 de julho de 2020, Exceções Preliminares, Mérito, Reparações e Custas, Série C, nº 407, § 220.

Há responsabilidade civil do Estado pela duração irrazoável do processo?

A demora na prestação jurisdicional pode ensejar a responsabilidade do Estado, tendo em vista a violação do direito fundamental à razoável duração do processo consagrado no art. 5.º, LXXVIII, da CR/88. O STJ já enfrentou o tema e entendeu caracterizada a responsabilidade civil do Estado em indenizar por danos morais decorrentes da demora de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses para que o Judiciário proferisse despacho citatório em uma execução de alimentos. Neste precedente, foi firmado que:

A administração pública está obrigada a garantir a tutela jurisdicional em tempo razoável, ainda quando a dilação se deva a carências estruturais do Poder Judiciário, pois não é possível restringir o alcance e o conteúdo deste direito, dado o lugar que a reta e eficaz prestação da tutela jurisdicional ocupa em uma sociedade democrática. A insuficiência dos meios disponíveis ou o imenso volume de trabalho que pesa sobre determinados órgãos judiciais isenta os juízes de responsabilização pessoal pelos atrasos, mas não priva os cidadãos de reagir diante de tal demora, nem permite considerá-la inexistente.” (STJ. REsp 1.383.776/AM, Rel. Ministro Og Fernandes, julgado em 06/09/2018).

Assim, já é possível afirmar que a jurisprudência admite indenizações por danos morais decorrentes da tramitação processual em tempo desarrazoado.

Prejudicialidade externa heterogênea e suspensão do processo do trabalho

Nos termos do art. 313, V, “a”, do CPC, “suspende-se o processo quando a sentença de mérito depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente”.

Já o art. 315, caput, do CPC estabelece que “se o conhecimento do mérito depender de verificação da existência de fato delituoso, o juiz pode determinar a suspensão do processo até que se pronuncie a justiça criminal”.

Ocorre que o processo civil ou do trabalho não pode aguardar indefinidamente a solução do caso penal. Por isso, “se a ação penal não for proposta no prazo de 3 (três) meses, contado da intimação do ato de suspensão, cessará o efeito desse, incumbindo ao juiz cível examinar incidentemente a questão prévia” (art. 315, § 1º, do CPC).

Já se a ação penal for proposta, “o processo ficará suspenso pelo prazo máximo de 1 (um) ano, ao final do qual aplicar-se-á o disposto na parte final do § 1º do art. 315”, ou seja, decorrido 1 (um) ano sem o término do processo penal, cessará a suspensão do processo civil ou do trabalho, incumbindo ao juiz não penal examinar incidentemente a questão prévia.

Vale lembrar que as provas do processo penal podem ser utilizadas como prova emprestada no processo civil ou do trabalho, ainda que a sentença penal não tenha transitado em julgado.

Seja como for, nota-se que o Código de Processo Civil, preocupado com a duração razoável do processo, estabeleceu períodos máximos de suspensão em caso de prejudicialidade externa. Desse modo, é inadmissível o sobrestamento de processo trabalhista por tempo indeterminado ou por prazo superior ao previsto no art. 315, § 1º, do CPC, em virtude de instauração de inquérito policial, especialmente em razão a) da independência das instâncias e b) da natureza alimentar do crédito trabalhista.

Se o Juiz do Trabalho se negar a dar continuidade ao feito, cabe Mandado de Segurança, exatamente como se deu no caso concreto, no qual a SbDI-2 do TST concedeu a ordem para cassar os efeitos do ato coator e determinar o regular prosseguimento da reclamação trabalhista, com a retomada da instrução do feito, se a autoridade coatora entender necessário, e com a posterior e consequente prolação de sentença.

Em resumo, eis o entendimento do TST:

O sobrestamento de reclamação trabalhista, por prazo indeterminado (superior ao previsto no art. 315, § 1º, do CPC), em virtude de instauração de inquérito policial, importa em violação de direito líquido e certo, diante do i) princípio da duração razoável do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII, da CR/88, ii) da natureza alimentar do crédito demandado e iii) da independência entre instâncias. TST-ROT-10879-28.2021.5.03.0000, SBDI-II, rel. Min. Evandro Pereira Valadão Lopes, julgado em 24/5/2022 – Informativo TST n.º 255.

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