Por Pedro Canário
Estados não podem editar leis sobre telecomunicações, já que a Constituição Federal determina que o assunto é de competência exclusiva da União. Por isso, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucionais leis estaduais que obrigaram operadoras de telefonia a instalar bloqueadores de sinal de celular em presídios.
Foram julgadas cinco ações diretas de inconstitucionalidade ao mesmo tempo, todas contra leis estaduais com o mesmo conteúdo. As decisões foram tomadas por maioria e seguiram os votos dos ministros Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Dias Toffoli em quatro delas. O ministro Luiz Edson Fachin, relator de uma das ADIs, ficou vencido.
Em seu voto, Marco Aurélio afirmou que a Constituição é clara quando diz, nos artigos 21, inciso XI, e 22, inciso IV, que “compete à União legislar privativamente sobre telecomunicações e explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão, os respectivos serviços”.
Segundo ele, “ao determinar às empresas de telefonia a instalação de equipamentos para interrupção do sinal nas unidades prisionais do Estado, o legislador local impôs a elaboração e a execução de projetos técnicos de radiofrequência que possam garantir a efetividade do bloqueio e evitar interferência indevida fora dos limites da unidade prisional”.
Jurisprudência firme
O ministro Dias Toffoli foi da mesma posição, e apenas reiterou que a jurisprudência do Supremo considera inconstitucionais leis estaduais que tratam de telecomunicações, tema de competência exclusiva da União. O voto foi, na verdade, uma reapresentação da cautelar que concedera para suspender os efeitos da lei tratada na ADI, que já havia adentrado o mérito da questão.
Antes de entrar no mérito do voto, no entanto, Toffoli lembrou que o debate girava em torno da legitimidade para edição de leis e sobre federação, “mas outra discussão é: como esses celulares entram nos presídios?”
O ministro Gilmar Mendes afirmou que, como a União é responsável pela prestação dos serviços de telecomunicações, “também lhe incumbe legislar sobre o regime das autorizatárias, concessionárias e permissionárias”.
E segundo ele, por mais que as leis tenham a intenção de tratar de matéria de segurança pública, “adentram competência da União” para tratar de telecomunicações. “O Supremo Tribunal Federal tem firme entendimento no sentido da impossibilidade de interferência do Estado-membro nas relações jurídicas entre a União e as prestadoras dos serviços de telecomunicações”, escreveu.
Experimentações federais
Fachin foi o segundo a votar. E ele reiterou sua posição a favor de um “federalismo cooperativo”. Para ele, as mudanças sociais e o surgimento de novas instituições desde a promulgação da Constituição, em 1988, exige que a compreensão da federação comporte uma interpretação menos centralizada na União.
“A compreensão e recompreensão do federalismo pela Corte não podem ser emudecidas por interpretações fatalistas que neguem, de antemão, a ver o tema à luz de novas questões postas ao longo da diacrônica experiência constitucional”, escreveu em seu voto.
O ministro se baseia na tese do experimentalismo democrático de Roberto Mangabeira Unger, segundo a qual “devemos então redescobrir nas pequenas variações a que o pensamento jurídico tradicionalmente se prendeu os começos das alternativas maiores que não mais encontramos onde costumávamos procurar”, conforme escreveu no livro O Direito e o futuro da Democracia.
A tese também foi citada pelo advogado Rodrigo Mudrovitsch em sua sustentação oral. Entretanto, para ele, o caso não permite experimentações, já que as telecomunicações precisam de regras uniformes e harmônicas entre si.
Mudrovitsch falou pela Associação Nacional das Operadoras de Telefonia Celular (Acel), autora de três das ADIs. Depois do julgamento, comemorou a decisão: “Acertadamente, o STF reconheceu que os estados da federação não possuem competência para legislar sobre a instalação de bloqueadores de celular em presídios estaduais. A matéria das telecomunicações exige tratamento uniforme em âmbito federal”.
Tangente
O ministro Luís Roberto Barroso discordou dos colegas. Para ele, “a lei apenas tangencia uma questão de telecomunicações”. Na verdade, diz ele, os dois temas de todas as leis estaduais em discussão são segurança pública e matéria penitenciária, cujas competências são compartilhadas entre a União e os estados.
Barroso afirmou que só haveria problema, no caso concreto, se houvesse uma lei federal para tratar do mesmo tema, mas com conteúdo diverso, o que não haveria no caso. O ministro Marco Aurélio interrompeu para lembrar o artigo 4º da Lei 10.792/2003, que diz que os estabelecimentos penitenciários “disporão de bloqueadores de telecomunicações para telefones celulares”.
Portanto, disse o vice-decano, há, sim, lei federal e que impõe ao poder público o ônus de instalar os bloqueadores, e não aos particulares. Barroso discordou da interpretação de Marco Aurélio, já que, para ele, “esse dispositivo não é claro a respeito de quem deve ser esse ônus”.
Depois, rebateu os argumentos da Acel de que as leis são desproporcionais e excessivas. Também discordou da tese de que o bem jurídico tutelado pelas leis, o uso de celular, tenha mais peso do que “a proteção dada à segurança pública da sociedade”.
“A medida é adequada [instalação de bloqueadores], não é excessiva e acho que a segurança publica da coletividade é um bem jurídico constitucional”, disse.
ADIs 5.356, 5.327, 5.253, 3.835, 4.861
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Fonte: www.conjur.com.br
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