Por Giovana Andreoli Gay
A questão refere-se à compatibilidade das normas dos juizados especiais com o NCPC, o qual também fora desenvolvido para promover celeridade ao sistema judiciário.
Com a entrada em vigor do novo CPC, diversos questionamentos surgiram quanto à aplicação do instrumento no dia-a-dia dos operadores do Direito, haja vista a mudança nos procedimentos processuais.
Entretanto, um ponto (dentre tantos) causou enorme discussão ante a lacuna nas normas adotadas, no que se refere à aplicação das alterações aos Juizados Especiais.
Conforme cediço, a criação dos Juizados Especiais teve como escopo facilitar o acesso dos cidadãos à Justiça para a resolução de causas de menor complexidade com maior celeridade e menos formalismo.
Ocorre que, por não seguir todos os procedimentos e etapas do Juízo Comum, o legislador preocupou-se em criar uma lei específica para regulamentar essas demandas, a qual, obviamente, não supre todas as lacunas, razão pela qual há a aplicação subsidiária do Diploma Processual.
A questão em debate refere-se justamente à compatibilidade dessas normas com o novo CPC, o qual também fora desenvolvido para tentar promover a agilização do sistema judiciário, oportunizando às partes, todavia, sanar ou regularizar eventuais vícios para o prosseguimento do feito sem a sua extinção sumária.
Pois bem, daremos como exemplo o cômputo dos prazos processuais somente em dias úteis, previsto no artigo 219 do NCPC1.
Antes mesmo de o Novo Código entrar em vigor, houve a preocupação de se estabelecer alguns enunciados para a inserção das normas aos Juizados Especiais, por meio do Fóruns Permanentes dos Processualistas Civis.
Nessas oportunidades, firmou-se que a regra do citado artigo 219 se estenderia ao procedimento sumaríssimo, conforme disposto nos enunciados 415 e 416, ex vi:
Enunciado 415. (arts. 212 e 219; lei 9.099/95, lei 10.259/2001, lei 12.153/09) Os prazos processuais no sistema dos Juizados Especiais são contados em dias úteis (Grupo: Impacto nos Juizados e nos procedimentos especiais da legislação extravagante).
Enunciado 416. (art. 219) A contagem do prazo processual em dias úteis prevista no art. 219 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, Federais e da Fazenda Pública (Grupo: Impacto do novo CPC e os processos da Fazenda Pública).
No entanto, em contraposição, a corregedora e ministra Nancy Andrighi manifestou em nota técnica que a contagem de prazos processuais em dias úteis não deve ser aplicada aos processos em trâmite nos Juizados Especiais, levando-se em conta os princípios fundamentais do rito.
Acontece que a questão ainda não restou pacificada, haja vista que, recentemente, as Turmas de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do Distrito Federal e dos Juizados Especiais Federais decidiram que o enunciado do artigo 219 do Novo Diploma Processual alcançará o rito previsto na lei 9.099/95.
Para exemplificarmos a falta de harmonização da norma, destacamos alguns Tribunais de Justiça que estão aplicando, por ora, a contagem de prazos prevista no Novo Código, tais como: Estados do Amapá, Amazonas, Ceará, Minas Gerais, Paraíba, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Roraima e Tocantins.
Vale ressaltar que um dos motivos para a aplicação dos prazos em dias úteis nesses Estados relaciona-se à própria configuração desenvolvida pelo sistema PJE (Processo Judicial Eletrônico), o qual fora adaptado para a contagem dos prazos na forma do CPC de 2015.
Desse modo, torna-se imprescindível aos operadores do Direito que seja firmado entendimento pacífico acerca da matéria, justamente para não gerar prejuízos ao regular processamento do feito (primazia do Novo Código).
Outro ponto em destaque diz respeito à questão da fundamentação das decisões judiciais, prevista no artigo 489, § 1º, do NCPC, em que se torna obrigatório o enfretamento de todas as questões com a indicação da relação da norma aplicada com a causa discutida, proibindo implicitamente as cotidianas “fundamentações padrões”.
No supramencionado Encontro dos Processualistas também houve indagações se este dispositivo se aplicaria ao sistema dos Juizados, concluído através do enunciado 309, adiante exposto:
Enunciado 309. (art. 489) O disposto no § 1º do art. 489 do CPC é aplicável no âmbito dos Juizados Especiais (Grupo: Impactos do CPC nos Juizados e nos procedimentos especiais de legislação extravagante).
Para os operadores do Direito que lidam diariamente com essas decisões judiciais proferidas por juízes leigos e homologadas por magistrados togados, muitas vezes verifica-se que as sentenças e até mesmo acórdãos emanados pelo órgão especial não preenchem tais requisitos, sob a justificativa de tal norma ir de encontro à celeridade e simplicidade do processo oral e sumário dos Juizados.
Por conta disso, já se sustenta a não aplicabilidade do dispositivo nos Juizados, especialmente se considerado que há disciplina própria da questão na lei 9.099/952.
A corroborar a possível inaplicabilidade do disposto citado no âmbito dos juizados, no dia 18 de março de 2016, reuniram-se magistrados no X Fórum dos Juizados Especiais do Estado de São Paulo (Fojesp), resultando na aprovação de alguns enunciados, dentre eles, o de número 2, a saber:
- “Não se aplica ao Sistema dos Juizados Especiais a regra do art. 489 do CPC 2015 diante da expressa previsão contida no art. 38, caput, da Lei 9.099/95” (passou a ser Enunciado 67 do Fojesp);
Destacamos, outrossim, outras questões debatidas quanto à aplicação do novo Codex no procedimento sumaríssimo, dentre as quais pinçamos alguns enunciados que trarão mudanças no próprio andamento do processo, quais sejam:
Enunciado 42. (art. 3393) O dispositivo aplica-se mesmo a procedimentos especiais que não admitem intervenção de terceiros, bem como aos juizados especiais cíveis, pois se trata de mecanismo saneador, que excepciona a estabilização do processo (Grupo: Litisconsórcio, Intervenção de Terceiros e Resposta do Réu).
Enunciado 93. (art. 982, I) Admitido o incidente de resolução de demandas repetitivas, também devem ficar suspensos os processos que versem sobre a mesma questão objeto do incidente e que tramitem perante os juizados especiais no mesmo estado ou região (Grupo: Recursos Extraordinários e Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas).
Enunciado 98. (art. 1.007, §§ 2º4 e 4º5) O disposto nestes dispositivos aplica-se aos Juizados Especiais (Grupo: Ordem dos Processos no Tribunal, Teoria Geral dos Recursos, Apelação e Agravo).
Enunciado 247. (art. 133) Aplica-se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica no processo falimentar (Grupo: Impactos do CPC nos Juizados e nos procedimentos especiais de legislação extravagante).
Enunciado 269. (art. 2206) A suspensão de prazos de 20 de dezembro a 20 de janeiro é aplicável aos Juizados Especiais (Grupo: Impactos do CPC nos Juizados e nos procedimentos especiais de legislação extravagante).
Enunciado 418. (arts. 294 a 311; leis 9.099/95, 10.259/01 e 12.153/09). As tutelas provisórias de urgência e de evidência são admissíveis no sistema dos Juizados Especiais (Grupo: Impacto nos Juizados e nos procedimentos especiais da legislação extravagante).
Enunciado 483. (art. 1.065; art. 50 da lei 9.099/95; Res. 12/09 do STJ). Os embargos de declaração no sistema dos juizados especiais interrompem o prazo para a interposição de recursos e propositura de reclamação constitucional para o Superior Tribunal de Justiça (Grupo: Impacto nos Juizados e nos procedimentos especiais da legislação extravagante).
Conclui-se, portanto, que, por ora, o Novo CPC terá aplicação restrita ao Sistema dos Juizados Especiais, gerando, indubitavelmente, questões passíveis de mudanças até que seja firmada jurisprudência acerca das controvérsias estabelecidas.
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1 Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis.
2 Art. 38. A sentença mencionará os elementos de convicção do Juiz, com breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado o relatório.
3 Art. 339. Quando alegar sua ilegitimidade, incumbe ao réu indicar o sujeito passivo da relação jurídica discutida sempre que tiver conhecimento, sob pena de arcar com as despesas processuais e de indenizar o autor pelos prejuízos decorrentes da falta de indicação.
4 Art. 1.007, § 2o. A insuficiência no valor do preparo, inclusive porte de remessa e de retorno, implicará deserção se o recorrente, intimado na pessoa de seu advogado, não vier a supri-lo no prazo de 5 (cinco) dias.
5 Art. 1.007, § 4o. O recorrente que não comprovar, no ato de interposição do recurso, o recolhimento do preparo, inclusive porte de remessa e de retorno, será intimado, na pessoa de seu advogado, para realizar o recolhimento em dobro, sob pena de deserção.
6 Art. 220. Suspende-se o curso do prazo processual nos dias compreendidos entre 20 de dezembro e 20 de janeiro, inclusive.
Fonte: Migalhas
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