Às vezes me deparo com a notícia de que um(a) diplomata pediu exoneração. A frequência com que vi isso ocorrer nos últimos 20 anos (tenho, já, uma certa rodagem), pode ser contada nos dedos das mãos, aliás, de apensa uma delas. Como isso é possível, porém, se a maioria dos aprovados no Concurso de Admissão à Carreira de Diplomata (CACD) têm vinte e poucos ou trinta de idade e normalmente espera a expulsória – idade para aposentadoria compulsória no serviço público – para deixar os quadros do Itamaraty. Por uma razão muito simples: os prós superam, e muito os contras. Vejamos.
Não posso dizer, claro, que ninguém tem chateações no Ministério das Relações Exteriores, a ponto de questionar a própria decisão de se tornar diplomata. Eu mesmo cansei de fazer isso e duvido de qualquer um que afirme nunca haver feito o mesmo. Há momentos em que tudo parece dar errado, pois um chefe enche o saco, as atribuições são desinteressantes, tomam-se “caronas” (colegas que ingressaram posteriormente na carreira são promovidos antes de você) ou aquela remoção para Paris ou Nova Iorque parecia fechada, mas alguém passou na frente.
Nessas horas, a tendência é pensar: “por que estudei tanto para virar servidor público, quando, com preparo semelhante, poderia ganhar muito mais dinheiro e reconhecimento no setor privado?”. Sim, isso seria possível, assim como os jogadores de futebol que conhecemos são ricos, jovens, famosos e cobiçados. Mas são eles a maioria? Quais a probabilidade de uma criança que queira seguir esse caminho conseguir o mesmo feito, em vez de nadar, nadar e morrer na praia de um time de várzea?
Pois, no Itamaraty, eu diria que a chance de alguém se aborrecer com frequência é enorme, mas os benefícios que a imensa maioria recebem ao longo do tempo nos fazem relevar boa parte dessas contrariedades.
Comparada às oportunidades no setor privado, por exemplo, quantos podem dormir à noite com um belo emprego e salário sem a preocupação de ser demitido(a) no dia seguinte? E quando são despedidos depois dos 40 ou 50, como conseguir outra ocupação rapidamente com o mesmo ou maior nível de remuneração? Ou então, como manter um empregado eficiente e muito bem qualificado sem o risco de perdê-lo para a concorrência? A diplomacia, sendo carreira pública, nos preserva dessa insegurança que ronda permanentemente os que optam pela iniciativa privada. E se não é possível ficar rico no Itamaraty (ao menos licitamente), tampouco cheguei a conhecer alguém que passasse por extremas carências financeiras, pois há sempre a opção de passar um tempo no exterior, onde se ganha em dólares.
E no funcionalismo público, que outra carreira permite “escolher” entre trabalhar no Brasil ou em outro país? Alguns responderão as Forças Armadas ou a Receita Federal, que têm adidos em algumas embaixadas, mas essas funções são excepcionais nessas instituições, pois seguramente a esmagadora maioria cumpre expediente em território nacional, enquanto no Itamaraty a proporção é de aproximadamente 60% dos profissionais servindo no exterior;
Por último, como costumo dizer sempre, conheço poucas carreiras nas quais é possível ter diversos e variados empregos ao longo da vida. Quem, trabalhando na mesma instituição, pode em um dia tratar de temas ambientais em Brasília, no ano seguinte acompanhar a economia norte-americana em Washington e, três anos mais tarde, negociar acordos do Mercosul em Montevidéu? E se pegarmos apenas a carreira de um(a) diplomata experiente como exemplo, veremos que cada um de nós guarda recordações que renderiam um interessante livro de memórias.
2020 começou e, como sempre, nasce para muitos a expectativa de terminar o ano sentado em uma das cadeiras do Instituto Rio Branco. Se você nutre esse desejo, conte com o Gran Cursos Online para ajudá-lo(a) a conquistar esse espaço!