Prezados candidatos ao exame da OAB, hoje passaremos algumas dicas sobre o importantíssimo Princípio da Insignificância (criminalidade de bagatela) e sua aplicabilidade pelos tribunais brasileiros.
O princípio da insignificância é originário do Direito Romano, e foi reintroduzido no sistema penal por Claus Roxin, na Alemanha, no ano de 1964. Fundado no brocardo minimis non curat praetor.
A aplicabilidade do postulado, cuja utilização tem sido admitida, em inúmeros casos, pelos tribunais pátrios tem a seguinte ideia: não é razoável que o direito penal e todo o aparelho estatal da persecução penal movimentem-se no sentido de atribuir relevância a uma lesão insignificante.
Observe-se que o princípio da insignificância deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade, subsidiariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal – tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material.
No ano de 2009, em julgamento realizado pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, os ministros aplicaram o princípio da insignificância a uma tentativa de furto de cinco barras de chocolate em um supermercado. No presente caso, o Superior Tribunal de Justiça havia analisado o caso limitando-se a extinguir a punibilidade do acusado, todavia o STF, seguindo voto do relator do processo, ministro Celso de Mello, reformou a decisão para absolver o réu e extinguir a ação penal porque, segundo ele, a conduta sequer poderia ser considerada crime.
O fundamento foi o seguinte: a extinção da punibilidade por si só não exclui os efeitos processuais, ou seja, a tentativa de furto ficaria registrada e poderia pesar contra o acusado no futuro, na qualidade de maus antecedentes. Ao ser absolvido, o acusado é considerado primário caso se torne réu em outra ação.
CUIDADO: O VALOR NÃO É O ÚNICO PARÂMETRO – segundo o STF é necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença dos seguintes requisitos:
(a) a mínima ofensividade da conduta do agente;
(b) a nenhuma periculosidade social da ação;
(c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento, e;
(d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada.
Nessa linha, o princípio possui a base em valores de política criminal, funcionando como causa de exclusão da tipicidade material do crime.
Nesse viés, o Supremo Tribunal Federal tem utilizado frequentemente o conhecido Princípio da Bagatela ou Insignificância para extinguir ações penais e liberar uma boa quantidade de presos no país. O STF vem concedendo Habeas Corpus alegando a existência de tal princípio, por exemplo, no julgamento de uma tentativa de furto de 10 brocas, 2 cadeados, 2 cuecas, 3 sungas e 6 bermudas de um hipermercado em Natal, no Rio Grande do Norte.
O ministro Gilmar Mendes, em julgamento sobre o tema, ressaltou que tal princípio deve ser analisado “como importante instrumento de aprimoramento do Direito Penal, sendo paulatinamente reconhecido pela jurisprudência dos tribunais superiores, em especial pelo Supremo Tribunal Federal”.
Outro Habeas Corpus concedido foi para um rapaz que teria furtado uma bicicleta no valor de R$ 120,00 (cento e vinte reais), a qual foi devolvida ao dono, ressarcindo o prejuízo. Também foi considerada como infração insignificante o não recolhimento de tributos de importação no valor de R$ 1.645,28 (Um mil seiscentos e quarenta e cinco reais e vinte e oito centavos).
Cabe destacar que o reduzido valor patrimonial do objeto material não autoriza, por si só, o reconhecimento dos crimes de bagatela. Deve-se analisar o crime e suas consequências em cada caso concreto – as circunstâncias do fato e os reflexos da conduta aparentemente ilícita no âmbito social.
Nesta linha, o STJ exige também requisitos de ordem subjetiva: a importância do objeto material do crime à vítima, as condições econômicas do ofendido, as circunstâncias e o resultado do delito.
Em suma, deve-se analisar subjetivamente, no âmbito do caso concreto, se houve uma relevante lesão.
Outra questão interessante diz respeito a não aplicabilidade do postulado para os casos de réus reincidentes. Sobre o tema, a 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Santa Catarina manteve uma condenação da comarca da Capital e negou a aplicação do princípio da bagatela para dupla já reincidente em crimes contra o patrimônio. Na oportunidade dois réus foram condenados por tentativa de furto qualificado.
De acordo com a denúncia, a dupla subtraiu um carrinho de mão e uma saca de 50 kg de cimento. Ambos, em recurso pediram a aplicação do princípio da insignificância.
Segundo o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, para o reconhecimento do crime de bagatela na hipótese de furto, além do valor ínfimo do bem, faz-se mister que o agente preencha outros requisitos, dentre os quais não possuir antecedentes. No presente caso, a Câmara não deu provimento ao recurso, uma vez que os apelantes praticavam habitualmente delitos contra o patrimônio, como revelaram suas folhas de antecedentes, . (Apel. Crim. 2010.085289-5).
Inteligentemente, sobre a reincidência, o TRF da 1º Região, em algumas decisões que envolvem o delito de descaminho impõe condições para aplicação do princípio, vejamos:
“Se o comércio de mercadorias importadas ilegalmente constitui atividade habitual do agente, não há que se falar em aplicação do princípio da insignificância penal que revela o crime de descaminho quando pequena a lesão imposta ao fisco, sob pena de converter-se em medida de incentivo à prática do delito” RT 763/679.
ATENÇÃO: O STF possui o entendimento que mesmo nos crimes contra a Administração Pública é admissível a aplicação da insignificância penal.
Sobre o tema, vejamos o STF/HC 96376 / PR – Julgamento em 31/08/2010:
EMENTA: Habeas Corpus. Descaminho. Imposto não pago na importação de mercadorias. Irrelevância administrativa da conduta. Parâmetro: art. 20 da Lei n° 10.522/02. Incidência do princípio da insignificância. Atipicidade da conduta. Ordem concedida. A importação de mercadoria, iludindo o pagamento do imposto em valor inferior ao definido no art. 20 da Lei n° 10.522/02, consubstancia conduta atípica, dada a incidência do princípio da insignificância. O montante de impostos supostamente devido pelo paciente (R$ 189,06) é inferior ao mínimo legalmente estabelecido para a execução fiscal, não constando da denúncia a referência a outros débitos congêneres em seu desfavor. Ausência, na hipótese, de justa causa para a ação penal, pois uma conduta administrativamente irrelevante não pode ter relevância criminal. Princípios da subsidiariedade, da fragmentariedade, da necessidade e da intervenção mínima que regem o Direito Penal. Inexistência de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado. Precedentes. Ordem concedida para o trancamento da ação penal de origem. (Destacamos).
Na mesma linha, o julgamento do HC 77.003-PE:
Por falta de justa causa, a Turma deferiu habeas corpus para trancar ação penal proposta contra ex-prefeita que fora denunciada pela prática de crime de responsabilidade (DL 201/67, art. 1º, XIII) por ter contratado, de forma isolada e por curto período, uma pessoa para a atividade de “gari”, sem a devida observância da exigência do concurso para provimentos de cargo público. Com base nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendeu-se configurada a insignificância jurídica do ato tido como criminoso. HC 77.003-PE, rel. Min. Marco Aurélio, 16.6.98.
Por fim, destaca-se que o Superior Tribunal de Justiça possui várias decisões em sentido contrário, defendendo a inadmissibilidade do princípio em estudo, no tocante aos crimes contra a Administração Pública.
Na maioria das suas decisões, o STJ sustenta que é inaplicável o princípio da insignificância nos crimes contra a Administração Pública, ainda que o valor da lesão seja ínfimo, uma vez que o legislador buscou resguardar não somente o aspecto patrimonial, mas a moral e a probidade da Administração Pública.
Em suma, para o Tribunal da Cidadania, nos referidos crimes existiria ofensa à moralidade administrativa, o que descaracterizaria o requisito do reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento.
Bons estudos e sucesso na prova da OAB!
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José Carlos – Professor Universitário e Advogado, com especialização em Direito Penal, Direito Processual Penal e Direito Ambiental e Recursos Hídricos. Doutorando em Direito Penal pela Universidade de Buenos Aires (UBA). Professor Titular de Direito Penal e Direito Processual Penal na Universidade Católica de Brasília (UCB). Professor Titular das Faculdades Integradas da União Educacional do Planalto Central (FACIPLAC) nas áreas de Direito Penal, Processo Penal e Laboratório de Prática Jurídica. Participante de bancas examinadoras de Concursos Públicos.
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