A frase que intitula este artigo é uma brincadeira que costumo repetir para afirmar algo que não parece óbvio, especialmente para quem não costuma viajar muito, porém será facilmente compreensível a você depois que ingressar na carreira diplomática e tiver alguma lotação que lhe exija constantes deslocamentos, em especial para fora do País.
Como se sabe, os diplomatas costumam viajar com bastante frequência, dada a natureza da atividade que exercem. Em algumas áreas do Ministério das Relações Exteriores (MRE), no entanto, essas viagens são mais recorrentes do que em outras. É o caso, por exemplo, dos colegas lotados nos Cerimoniais, tanto do Itamaraty, que organiza as cerimônias no Brasil e exterior, de que participam o Chanceler e outras autoridades do Ministério, como o Cerimonial da Presidência da República (PR), que se ocupa das atividades do Presidente, inclusive em outros países[1].
Exatamente por proporcionar numerosas oportunidades de viagens ao exterior, pois o Ministro das Relações Exteriores mal para no Brasil[2], muitos jovens diplomatas sonham em ser lotados no Cerimonial assim que deixam o Instituto Rio Branco. Boa parte dos que conseguem, porém, logo percebem que o que parecia uma enorme vantagem (viajar mais do que colegas de outras áreas) na verdade tem alto custo do ponto de vista pessoal e principalmente familiar.
Diz a sabedoria popular que tudo o que é demais enjoa. Outros dizem, ainda, que é melhor viajar para a cidade vizinha de onde se mora de férias do que a Paris a trabalho. Quem viaja constantemente por razões profissionais tende a concordar com esses dizeres. Eu nunca trabalhei em nenhum Cerimonial, mas já ocupei alguns cargos, no MRE e em outros órgãos para os quais fui cedido, que exigiram de mim realizar algumas viagens que, para meus amigos, pareciam dos sonhos, mas eu as enxergava como pesadelos.
Isso porque viajar a trabalho é bastante cansativo e normalmente só se conhecem as cidades que se visitam pela janela do carro que te leva de um compromisso a outro. Em geral, não sobra tempo, ou se sobra é quase nada, para turismo. Até porque viagens financiadas por recursos públicos não devem mesmo manter diplomatas fora de suas sedes sem necessidade profissional. Ou seja, em geral é consideravelmente frustrante ir trabalhar em um país interessante ou que não se conhece e não poder visitar nenhum ponto turístico. É como passear pela praia de terno e gravata, sem poder ao menos molhar os pés no mar.
Isso sem contar o estresse, que só aumenta com o tempo e as repetições, para se fazer e desfazer malas, encarar filas de check-in de aeroportos, detectores de metais, longos voos apertado em classe econômica, noites de sono perdidas, instalação em hotéis, transporte que não aparece, câmbio de moedas etc. Quando se viaja muito e a maior parte dos deslocamentos é para locais distantes, o que não é tão difícil de ocorrer se considerarmos que Brasília está longe de tudo, há um determinado momento em que você chega à conclusão de que o melhor lugar do mundo é sua própria casa.
A lembrança que fica das viagens, no entanto, e também as diárias que se recebe (quando não é necessário gastar tudo), é, em geral, muito boa. É o que se chama de bagagem cultural, que poucas carreiras oferecem como a diplomática. No fundo, temos acesso a lugares, pessoas e ambientes que normalmente não teríamos com a renda que a carreira nos proporciona. Mas, por motivos profissionais, conhecemos tudo isso, e a experiência que fica é excelente. Por isso, repito sempre: ter viajado é melhor do que viajar (a trabalho, claro).
[1] O Cerimonial da PR é sempre chefiado e composto em sua maioria por diplomatas de carreira requisitados pela Presidência.
[2] O Cerimonial do Itamaraty se ocupa principalmente das viagens do Chanceler, mas também organiza os deslocamentos do Secretário-Geral das Relações Exteriores (número 2 do MRE) e participa das viagens presidenciais.
Prof.Jean Marcel Fernandes – Coordenador Científico
Nomeado Terceiro-Secretário na Carreira de Diplomata em 14/06/2000. Serviu na Embaixada do Brasil em Paris, entre 2001 e 2002. Concluiu o Curso de Formação do Instituto Rio Branco em julho de 2002. Lotado no Instituto Rio Branco, como Chefe da Secretaria, em julho de 2002. Serviu na Embaixada do Brasil em Buenos Aires – Setor Político, entre 2004 e 2007. Promovido a Segundo-Secretário em dezembro de 2004. Concluiu Mestrado em Diplomacia, pelo Instituto Rio Branco, em julho de 2005. Publicou o livro “A promoção da paz pelo Direito Internacional Humanitário”, Fabris Editor, Porto Alegre, em maio de 2006. Saiba +
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