Olá pessoal, tudo certo?
Eu sempre falo que, para aqueles que buscam a aprovação em concurso público ou mesmo o melhor desempenho no exercício da atuação jurídica do ponto de vista prático, é imprescindível estar atualizado com os precedentes dos Tribunais Superiores.
E, por vezes, a leitura de informativos periódicos de jurisprudência não é suficiente. É preciso estudar por materiais, livros e aulas extremamente atualizadas. É isso que procuro fazer no exercício do cargo de Defensor Público e, claro, também de professor.
Nessa linha, gostaria de trazer uma ponderação e destacar uma novidade (ainda) pouco comentada acerca do art. 2º, § 1º da Lei de Organização Criminosa (Lei 12.850/2013):
Art. 2º Promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa: Pena – reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa, sem prejuízo das penas correspondentes às demais infrações penais praticadas. § 1º Nas mesmas penas incorre quem IMPEDE ou, de qualquer forma, EMBARAÇA a investigação de infração penal que envolva organização criminosa.
Em 2019, o STJ agasalhou o entendimento sufragado por Vinicius Marçal, Cleber Masson, Rogério Sanches e Nucci no sentido de que o tipo penal previsto pelo art. 2º, §1º, da Lei nº 12.850/2013 define conduta delituosa que abrange o inquérito policial e a ação penal.
Consoante deliberado à época pelo Superior Tribunal de Justiça, a tese de que a investigação criminal descrita no art. 2º, § 1º, da Lei n. 12.850/13 cinge-se à fase do inquérito, não deve prosperar, eis que as investigações se prolongam durante toda a persecução criminal, que abarca tanto o inquérito policial quanto a ação penal deflagrada pelo recebimento da denúncia. Com efeito, não havendo o legislador inserido no tipo a expressão estrita “inquérito policial”, compreende-se ter conferido à investigação de infração penal o
sentido de persecução penal, até porque carece de razoabilidade punir mais severamente a obstrução das investigações do inquérito do que a obstrução da ação penal. Ademais, sabe-se que muitas diligências realizadas no âmbito policial possuem o contraditório diferido, de tal sorte que não é possível tratar inquérito e ação penal como dois momentos absolutamente independentes da persecução penal[1].
Apesar de eu particularmente sempre ter discordado dessa posição, o fato é que tal orientação era indicada como pacífica para fins de concurso.
ATENÇÃO! É HORA DE ATUALIZAR! O mencionado delito é tipificado como “quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal”.
De acordo com o deliberado pela 2ª Turma do STF ao julgar o INQ 4720[2], o tipo legal restringe expressamente o âmbito de alcance da norma penal incriminadora aos atos de impedimento ou obstrução praticados na fase pré-processual de investigação. Entendimento contrário, na visão do colegiado, acarretaria violação do princípio da legalidade penal estrita, também conhecido como princípio da tipicidade, que está previsto no artigo 5º, inciso XXXIX, e no artigo 1º do Código Penal.
De acordo com essas normas: (a) não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal; (b) a interpretação dos tipos penais deve ser realizada de forma estrita, sendo proibido o uso da analogia in malam partem ou da interpretação extensiva para fins penais.
É o entendimento de José Paulo Baltazar Jr., Cézar Roberto Bitencourt e Busato, segundo o qual o objeto da ação (do crime de obstrução de justiça) será a investigação de infração penal que envolva organização criminosa, não podendo ser reconhecido o delito quando a conduta se der na fase de ação penal.
O julgamento foi efetuado em agosto e publicado em dezembro de 2021! Aguardemos para verificar como se posicionará a 1ª Turma e o Plenário da Corte!
Entretanto, já podemos afirmar que TEMOS DIVERGÊNCIA!
Gostaram dessa?
Vamos em frente.
Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.
[1] HC 487.962/SC, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 28/05/2019, DJe 07/06/2019
[2] Penal e processo Penal. Ação penal originária. Denúncia oferecida pelo crime de obstrução de justiça. Preliminar de incompetência do Relator para supervisionar as investigações. Rejeição. Alegação de inconstitucionalidade do art. 2º, §1º, da Lei 12.850/2013. Não acolhimento. Rejeição da preliminar de nulidade das interceptações telefônicas. Alegação defensiva de inépcia da inicial pela ausência de individualização das condutas. Requisitos do art. 41 do CPP. Doutrina. Precedentes. Acolhimento. Excesso acusatório. Não demonstração do vínculo direto dos parlamentares denunciados com os fatos descritos. Impossibilidade de acolhimento da denúncia com base apenas nas palavras de investigado que adota postura colaborativa. Atipicidade da conduta de obstrução de justiça ocorrida após o oferecimento da denúncia. Princípio da legalidade penal e da proibição de analogia in malam partem. Proibição da alteração da classificação jurídica do crime, por parte do órgão judicial, em desfavor do réu. Violação ao princípio da inércia e da imparcialidade. Doutrina e precedentes. Nulidade das provas produzidas por agente infiltrado sem prévia autorização judicial. Ausência de crime nos casos de condutas provocadas. Doutrina. Precedentes. Súmula 145 do STF. Rejeição da denúncia, nos termos do art. 395, I, II e III, do Código de Processo Penal. (Inq 4720, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 22/08/2021).