O chamado bônus de retenção consiste em um valor oferecido pelo empregador para recompensar o empregado que se compromete a permanecer no emprego por determinado período, portanto, trata-se de um pagamento condicionado.
Para que uma verba tenha natureza salarial é indispensável a presença das características centrais do salário, dentre as quais se podem destacar, além de outras, a habitualidade e a contraprestatividade. Faltam, no bônus de retenção (retainer fee), ambas as características.
Com efeito, não se vislumbra a presença dos requisitos necessários para configuração da natureza salarial da parcela. Isso porque, o montante pago ao empregado não pretende remunerar o trabalho prestado, mas sim garantir sua permanência na empresa durante o prazo previamente estabelecido. Ademais, não possui qualquer habitualidade, sendo pago uma única vez ao final do contrato de trabalho. Desse modo, trata-se de parcela de natureza trabalhista, mas sem caráter salarial ou remuneratório.
Pelos motivos acima alinhavados, parcela da jurisprudência tem entendido que o bônus de retenção não possui natureza salarial, justamente porque o seu pagamento não é habitual, bem como por não ter por escopo retribuir o empregado pelo seu trabalho (contraprestatividade). Tal verba está, em verdade, condicionada à obrigação do empregado em manter o vínculo empregatício por determinado período.[1]
Por cautela, importante registrar que, de outra banda, há julgados, inclusive do C. Tribunal Superior do Trabalho, que entendem pela natureza remuneratória do bônus de retenção.[2]
Quanto ao CARF, no dia 12/12/2019 foi publicado acórdão proferido pela 2ª Turma de Julgamento da Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF, a qual, por unanimidade de votos, entendeu que incide contribuição previdenciária sobre o valor pago, pelo empregador ao empregado, para estimular a permanência do segundo na empresa.[3]
Dois foram os fundamentos para tal conclusão: (i) tratava-se de um pagamento habitual, pois a correspondente despesa era reconhecida mensalmente pela empresa, bem como (ii) não teria caráter indenizatório, mas, sim, remuneratório, pois era creditado ao funcionário como forma de contraprestação ao serviço prestado à companhia.[5]
No caso concreto, o valor era pago mensalmente e não de uma única vez. Logo, a decisão em comento entendeu haver habitualidade no pagamento, o que caracteriza a natureza salarial. Mas, além disso, entendeu-se que o fato de o pagamento ser realizado com o intuito de manter o empregado na empresa tem o condão de conferir natureza remuneratória à parcela, na medida em que era pago como contraprestação ao trabalho do empregado, posição que, com a devida venia, não nos parece acertada.
No entanto, em sentido diametralmente oposto, já entendeu a 1ª Turma Ordinária, da 2ª Câmara, da 2ª Seção de Julgamento, que, em 12.9.2017, proferiu o acórdão nº 2201-003.882 e concluiu, por maioria de votos, que não incidiria contribuição previdenciária sobre as verbas pagas a título de bônus de retenção:
BÔNUS DE RETENÇÃO AUSÊNCIA DE CARÁTER REMUNERATÓRIO. NÃO INCIDÊNCIA. Não integra o salário de contribuição o pagamento único de bônus por força de cláusula acessória ao contrato de trabalho, que tenha por objetivo que esse contrato seja transformado em contrato a prazo mínimo determinado, nos casos específicos de oferta de novo emprego recebida pelo empregado que se pretenda reter. Tais valores não ostentam natureza remuneratória, posto que não decorrem de prestação de serviços de pessoa física e sim de mera obrigação de fazer, manutenção do contrato de trabalho pelo tempo avençado, não relacionada ao fato gerador das contribuições previdenciárias. (…)”
Parece mais acertada a decisão acima, pois, nos termos do que constou no acórdão, ao realizar o pagamento do bônus de retenção, a empresa não estaria remunerando o empregado pelo seu trabalho, mas, sim, cumprindo uma obrigação de fazer, qual seja de pagar ao trabalhador quantia previamente acordada em razão de sua permanência na empresa por tempo pré-estipulado.
De todo modo, como se nota, a exemplo do que ocorre no âmbito dos tribunais judiciais, também na esfera administrativa a matéria não é pacífica.
Referências
[1] Nesse sentido, dentre outros julgados: RECURSO ORDINÁRIO DA AUTORA. BÔNUS DE RETENÇÃO. O prêmio tem o escopo de recompensar e estimular o empregado. Em regra, trata-se de liberalidade que não obriga o empregador a repeti-la e nessas condições, quando eventual e variável, não possui natureza salarial. Eis a hipótese dos autos, conforme confessado pela autora quando do depoimento pessoal. Logo, não há falar em integração de valores. Recurso a que se nega provimento. (TRT da 1ª Região, 0010433-67.2014.5.01.0051, Rel. Mario Sérgio Medeiros Pinheiro, DEJT 17/06/2015). Ainda: RECURSO ORDINÁRIO. BÔNUS DE RETENÇÃO.NATUREZA INDENIZATÓRIA. Dada a impossibilidade de se atribuir natureza salarial ao bônus de retenção pago por uma única vez e com o objetivo de manter o Reclamante no quadro de pessoal da Reclamada, tratando-se de parcela tipicamente indenizatória, resta indevida a integração pretendida. (TRT da 1ª Região, 0010433-67.2014.5.01.0051, Rel. José Antonio Piton, DEJT 17/06/2015).
[2] RECURSO DE REVISTA. GRATIFICAÇÃO DE RETENÇÃO. NATUREZA JURÍDICA. A matéria diz respeito à natureza jurídica da “gratificação de retenção” paga em duas parcelas ao reclamante, com o objetivo de manter o contrato de trabalho por 24 meses, de “01.01.2011 a 31.12.2012”. Diversamente do que entendeu o eg. Colegiado a quo, não há como atribuir natureza indenizatória à parcela, uma vez que seu pagamento não visa ressarcir nenhuma perda do empregado, mas sim manter sua permanência na empresa em face de seu valor profissional. Ainda que seu pagamento não seja habitual, podendo ser feito de forma única ou parcelado, sua natureza é contraprestativa, se assemelhando às luvas pagas ao atleta profissional, prevista no art. 12 da Lei 6.354/76 (revogada pela Lei 12.395/2001) e no art. 31, § 1º, da Lei 9.615/98. Não obstante o reconhecimento da natureza salarial da parcela, seus reflexos devem ser limitados, uma vez que paga somente em duas parcelas na forma contratualmente prevista. Precedentes da Corte. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá parcial provimento. (RR-10926-64.2015.5.15.0004, Relatora Desembargadora Convocada: Cilene Ferreira Amaro Santos, Data de Julgamento: 21/11/2018, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 23/11/2018)
[3] Acórdão nº 9202-008.275, proferido pela 2ª Turma de Julgamento da CSRF, em 23.10.2019.
[5] Eis a ementa: CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS PREVIDENCIÁRIAS. Período de apuração: 01/01/2010 a 31/12/2010. CONTRIBUIÇÕES DEVIDAS À SEGURIDADE SOCIAL. BÔNUS DE RETENÇÃO. PROCEDÊNCIA DO LANÇAMENTO. O pagamento de bônus de retenção ou gratificação de permanência vinculado e abatido posteriormente com o pagamento de sua remuneração representa um ganho fornecido como resultante de uma contraprestação e se encontra dentro do conceito do salário de contribuição.