Por: Fabrício Dutra
A velha e tradicional dúvida da nossa Língua Portuguesa. Trata-se de um polêmico assunto: a flexão de número dos substantivos (núcleos) compostos, palavras que contêm mais de um radical em sua formação. O plural de tais substantivos sempre gerou muitas dúvidas na mente dos estudantes, que costumam tentar recorrer à memória, no momento em que o questionamento surge.
“Qual será a forma menos esquisita?”
O que determina, na verdade, o plural de tais substantivos compostos – separados por hífen-, é a origem (a classe gramatical) das palavras que os compõem. É essencial conhecer as classes gramaticais que se podem flexionar (variáveis) e as que permanecem sem flexão (invariáveis). Por exemplo, o termo “couve-flor”, quando flexionado no plural, assume a forma “couves-flores”. No entanto, quando surgir a dúvida no plural das expressões “País-sede” e “cidade-sede”, o raciocínio é levemente diferente.
A regra é a seguinte: toda vez que o substantivo composto for formado por dois elementos variáveis, os dois substantivos flexionam-se no plural, por exemplo: abelha-mestra: abelhas-mestras (substantivo + substantivo), cirurgião-dentista: cirurgiões-dentistas (substantivo + substantivo), guarda-civil: guardas-civis (substantivo + adjetivo), guarda-noturno: guardas-noturnos (substantivo + adjetivo), segunda-feira: segundas-feiras (numeral + substantivo), cachorro-quente: cachorros-quentes (substantivo + adjetivo), surdo-mudo: surdos-mudos (substantivo + substantivo).
De acordo com esse pensamento, se um termo, que compõe o substantivo, for invariável, ou for um verbo, tal elemento permanecerá invariável. Exemplos: o guarda-roupa: os guarda-roupas (verbo + substantivo), abaixo-assinado: abaixo-assinados (advérbio + adjetivo), o bota-fora: os bota-fora (verbo + advérbio), beija-flor: beija-flores (verbo + substantivo), sempre-viva: sempre-vivas (advérbio + adjetivo), pica-pau: pica-paus (verbo + substantivo), alto-falante: alto-falantes (advérbio + adjetivo).
E no caso da CIDADE-SEDE, substantivo composto formado por dois elementos variáveis? Como agir?
Ocorre um caso especial em relação à regra. Não chamarei de exceção, pois odeio o desanimador termo “exceção”, sem contar que existe outra forma de flexão aceita por parte dos gramáticos modernos. Trabalharei, desse modo, o fato linguístico como um caso especial da Língua Portuguesa.
Nos casos em que existem dois elementos variáveis, se o segundo limitar o significado do primeiro, apenas o primeiro deve sofrer flexão. Notem a ideia limitadora da palavra sede, na expressão “cidade-sede”. O Brasil possui um número gigantesco de cidades; no entanto, somente poucas terão o privilégio de sediar a copa. O termo “sede” funciona como limitador, restringindo e indicando a finalidade da cidade.
Nesses casos – se o segundo termo delimitar (com comportamento adjetivo) o primeiro -, tradicionalmente, o segundo elemento deve permanecer invariável, dando-se preferência à flexão do primeiro. Por exemplo, palavra-chave: palavras-chave; bomba-relógio: bombas-relógio; notícia-bomba: notícias-bomba; livro-caixa: livros-caixa; manga-rosa: mangas-rosa; navio-escola: navios-escola; operário-padrão: operários-padrão.
Isso é o que diz a tradição gramatical – a qual eu, inclusive, recomendo, no entanto, modernamente, as duas formas têm sido aceitas. Ou seja, fica a critério do produtor do texto flexionar apenas o primeiro ou os dois. Formas como palavras-chave ou palavras-chaves; operários-padrão ou operários-padrões; cidades-satélite ou cidades-satélites podem ser usadas de forma correta na Língua Portuguesa, com preferência das primeiras ocorrências pela tradição gramatical.
Essa acepção moderna atinge diretamente o nosso exemplo cidade-sede. Embora a tradição diga que o plural correto é cidades-sede, existem duas possibilidades de flexão no plural: a supracitada, em que só o primeiro flexiona, e aquela em que é permitida a flexão dos dois elementos: cidades-sedes. As duas estão certas. Brasília, Rio de Janeiro, Manaus e Belo Horizonte são exemplos de cidades-sede (ou cidades-sedes) da nossa histórica Copa do Mundo.
Eliminada a dúvida gramatical, o meu desejo sincero é que esta seja a melhor de todas as copas e que, até o dia da abertura, a culpa de vibrar com o evento enfim tenha sumido da minha cabeça. Confesso não ter conseguido – até o momento – sentir empolgação com esta Copa do Mundo. Talvez por viver no Brasil e conhecer todos os nossos problemas (que vão da fome dos que votam à corrupção dos que estão no Poder), não saem da minha jovem cabeça todas as nossas prioridades, que inclusive resguardariam o direito à vida de muitos cidadãos brasileiros, violado a cada centavo desviado. O jeito é estudar, é hora de fazer a diferença. O mundo dos concursos não para.