Olá pessoal, tudo certo?
Falaremos sobre essa importantíssima e excepcional técnica de investigação criminal, regulamentada, entre outras, na Lei de Organização Criminosa.
A infiltração de agentes é uma técnica especial de investigação, mediante a qual um agente policial, devidamente selecionado e treinado, e judicialmente autorizado, infiltra-se em uma organização criminosa, simulando ser um de seus integrantes, para buscar informações e reunir provas acerca de sua estrutura, funcionamento e identificação de seus reais membros, tendo por escopo apurar crimes passados e presentes, evitar crimes futuros e desmantelar referida organização.
No Brasil, o detalhamento de sua procedimentalização se deu pela Lei 12.850/2013, especificamente em seu artigo 10. Vejamos:
Art. 10. A infiltração de AGENTES DE POLÍCIA em tarefas de investigação, representada pelo delegado de polícia ou requerida pelo Ministério Público, após manifestação técnica do delegado de polícia quando solicitada no curso de inquérito policial, será precedida de circunstanciada, motivada e sigilosa autorização judicial, que estabelecerá seus limites. § 1º Na hipótese de representação do delegado de polícia, o juiz competente, antes de decidir, ouvirá o Ministério Público. § 2º Será admitida a infiltração se houver indícios de infração penal de que trata o art. 1º e se a prova não puder ser produzida por outros meios disponíveis. § 3º A infiltração será autorizada pelo prazo de até 6 (seis) meses, sem prejuízo de eventuais renovações, desde que comprovada sua necessidade. § 4º Findo o prazo previsto no § 3º, o relatório circunstanciado será apresentado ao juiz competente, que imediatamente cientificará o Ministério Público. § 5º No curso do inquérito policial, o delegado de polícia poderá determinar aos seus agentes, e o Ministério Público poderá requisitar, a qualquer tempo, relatório da atividade de infiltração.
Feitas tais considerações, passamos à análise do deliberado pela 6ª Turma do STJ, no julgamento do RHC 160.850/ES.
Segundo consta dos autos, houve alegação de ilicitude da infiltração realizada em razão de investigação realizada com o objetivo de desvendar um esquema de inserção de drogas no interior do Centro de Detenção Provisória de Guarapari/ES por meio de familiares, advogados e servidores públicos, denominada “Operação Vademecum”, culminando com a prisão preventiva e denúncia em face de determinada pessoa, com a imputação de envolvimento nos crimes de tráfico de drogas e associação para o mesmo fim, corrupção ativa, participação em organização criminosa e fraude processual tentada.
A ilicitude residiria no fato de que os elementos de informação foram coletados mediante a infiltração de agente que sequer seria servidor público ou policial, mas INSPETOR PENITENCIÁRIO em designação temporária contratado pelo regime celetista.
Ao se debruçar sobre o tema, a 6ª Turma que a infiltração de terceiros que NÃO sejam agentes policiais não se reveste de legalidade, conforme se extrai a contrário sensu da redação do art. 10 da Lei 12.850/2013, ainda que precedida de ordem judicial.
É importante destacar que, AINDA QUE SE TRATASSE DE AGENTE DE POLÍCIA PENAL (e não inspetor penitenciário), a medida também não seria lícita, uma vez que a polícia penal não detém atribuição investigativa. É que, de acordo com a CF/88, à Polícia Penal não cabe realizar atribuição própria de polícia investigativa, uma vez que estão vinculadas ao órgão administrador do sistema penal da unidade federativa a que pertencem, cabe a segurança dos estabelecimentos penais (art. 144, § 5º-A da CF/88[1]).
Conforme registrado pelo Min. Sebastião Reis Jr. (Relator), não há “como “fechar os olhos” para a gritante mácula e autorizar a permanência dos elementos de informação coletados de forma ilegal, por meio da infiltração efetivada por pessoa que não é agente investigativo, mas, pelo contrário, policial penal não preparado para a assumir a responsabilidade e que sequer consta dos quadros de servidores do Estado. Da atenta análise dos autos, percebo que várias medidas foram autorizadas para investigar os fatos, como busca e apreensão, interceptação telefônica, etc, a denotar que nem todos os elementos de informação coletados pela medida considerada nula estão contaminados, podendo alguns deles ter sido coletados por meio de fonte independente, daí a impossibilidade de trancamento da investigação e ação penal”[2].
Diante disso, a Corte reconheceu a nulidade dos elementos de informação que conduziram toda a investigação no caso concreto!
Espero que tenham gostado e, sobretudo, compreendido!
Vamos em frente!
Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.
[1]Art. 144, § 5º-A. Às polícias penais, vinculadas ao órgão administrador do sistema penal da unidade federativa a que pertencem, cabe a segurança dos estabelecimentos penais. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 104, de 2019)
[2] https://www.migalhas.com.br/arquivos/2022/9/2567AF630109A9_RHC-160.850(1)…..pdf