Motorista condenado por homicídio culposo pode ser contemplado por PRD? Recente entendimento lavrado pelo STJ e a Lei Penal no tempo

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Fala pessoal, tudo beleza?

O tema a ser analisado nesse texto é extremamente interessante e deve ser lido com muito cuidado, porque envolverá a análise de lei penal no tempo. Genericamente, o Código Penal Brasileiro prevê a admissibilidade de conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos, independentemente do quantum de pena, quando estivermos diante de crime culposo. Vejamos:

Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I – aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo;

Nesse cenário, o crime de homicídio culposo quando o agente estava sob influência de álcool ou outra substância psicoativa, em tese, admitiria essa conversão:

Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor:  Penas – detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. (…) § 3o  Se o agente conduz veículo automotor sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: Penas – reclusão, de cinco a oito anos, e suspensão ou proibição do direito de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor (Incluído pela Lei nº 13.546, de 2017).

Como eu sempre falo em aula, o Código de Trânsito Brasileiro é uma das normas mais desafiadoras no campo criminal, porque está em constante alteração. Uma dessas modificações relativamente recentes impactaram sensivelmente na conclusão da tese acima delineada, porque passou a vedar absolutamente a referida conversão. Refiro-me à Lei 14.071/2020:

Art. 312-B. Aos crimes previstos no § 3º do art. 302 e no § 2º do art. 303 deste Código não se aplica o disposto no inciso I do caput do art. 44 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal) (Incluído pela Lei nº 14.071, de 2020).

E aí Pedro? Quer dizer que o delito de homicídio culposo quando o agente estava sob influência de álcool ou outra substância psicoativa?

Se a pergunta se referir aos dias atuais, certamente a resposta será negativa. Afinal, o comando legislativo é peremptório e goza de presunção de constitucionalidade. Entretanto, CUIDADO para como será circunstanciado o tema e a abordagem na sua prova! Afirmo isso porque, como muito bem salientado pelo Superior Tribunal de Justiça, é imprescindível atentar para a aplicação da lei penal no tempo.

Analisando um caso concreto em que o delito tinha sido praticado em 13/07/2018, ou seja, antes da edição da Lei n. 14.071/2020, que acrescentou ao Código de Trânsito Brasileiro o art. 312-B, a Corte asseverou ser indiscutível que não há vedação legal para que, no crime de homicídio culposo na direção de veículo cometido sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência, praticado antes do início da vigência da nova redação do art. 312-B do CTB, ocorra a substituição da reprimenda reclusiva por sanções restritivas de direitos[1].

Ao tecer considerações sobre o caso concreto, o STJ destacou que a Justiça Estadual deixou de consignar motivação válida para afastar o direito do Condenado – notadamente porque concorre, em seu benefício, as circunstâncias de que a prova dos autos demonstrou que a luz traseira da motocicleta em que colidiu estava desligada, e de que no cálculo da pena o Tribunal estadual assinalou a primariedade do réu, seus bons antecedentes, que a conduta não extrapolou a culpabilidade normal e as consequências são próprias do delito. “A favorabilidade das circunstâncias mencionadas evidencia que a substituição da pena se mostra medida socialmente recomendável[2].

CONCLUSÃO: Cuidado com a sua prova! Se a questão for atualizada a partir da vigência do art. 312-B do CTB, essa vedação de conversão da pena privativa de liberdade em restritiva de direito é pressuposta na própria legislação. Entretanto, se ela se referir a fato anterior, deverá ser verificada a pertinência na situação concreta, mormente sob o crivo do juízo de ser ela socialmente recomendável ou não.

Espero que tenham gostado!

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.

 

[1] HC 673.337/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/06/2021

[2] STJ, HC 601.514/SC, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/03/2021, DJe 29/03/2021.

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