Os únicos dois casos em que a jurisprudência do C. Tribunal Superior do Trabalho e do Supremo Tribunal Federal entendem ser da competência da Justiça Comum se caracterizam quando o substrato fático revela contratação temporária ou admissão sob o regime estatuário ou especial, pois nestas hipóteses a relação é jurídico-administrativa.
Na prática, é preciso que reste provado o regime jurídico-administrativo, ou seja, que seja demonstrada a contratação por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público – inciso IX, do art. 37, da CRFB/88 – ou existência de lei/estatuto. Ausentes tais provas, a competência será da Justiça do Trabalho.
Vale lembrar que a mera arguição de configuração de regime jurídico-administrativo não afasta necessariamente a competência da Justiça do Trabalho, sendo necessário perquirir a natureza da relação jurídica estabelecida entre as partes, o que demanda prova. Não comprovada a regular inserção do trabalhador em relação jurídico-administrativa típica, impõe-se o reconhecimento da incidência do regime geral celetista, o que atrai a configuração da competência material da Justiça do Trabalho. Neste sentido:
RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO POSTERIOR À LEI Nº 13.015/2014. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. CONTRATAÇÃO SEM CONCURSO PÚBLICO APÓS A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO VÍNCULO JURÍDICO-ADMINISTRATIVO. O Tribunal Regional rejeitou a preliminar de incompetência da justiça do trabalho, visto que o reclamante foi contratado sem a prestação de concurso público e a sua contratação não se enquadra na hipótese de trabalho temporário prevista na Constituição. Com efeito, embora o ente público sustente que o autor foi contratado sob a égide do regime jurídico-administrativo, a Corte Regional foi taxativa em asseverar que a contratação do demandante se deu sem a realização de concurso público. Por outro lado, não tendo sido comprovada a relação jurídico-administrativa, resta preservada a competência desta Justiça Especializada para a apreciação de pedidos que encontrem fundamento na legislação trabalhista, conforme dispõe o art. 114, I, da Constituição Federal. Recurso de revista não conhecido. (RR-479-88.2016.5.22.0003, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 26/04/2019).
RECURSO DE REVISTA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. Segundo o entendimento da SDI-1/TST, a competência para processar e julgar demandas que versem sobre a contratação sem concurso público é determinada pela natureza do regime jurídico estabelecido no âmbito do ente público. Em se tratando de regime jurídico celetista, a competência é da Justiça do Trabalho; no caso de servidores públicos submetidos a regime estatutário, a competência é da Justiça comum. In casu, não restou consignado no acórdão recorrido a existência de lei municipal instituindo o regime jurídico estatutário ou a contratação temporária. Por conseguinte, a alegação recursal atinente à existência de contrato de trabalho temporário firmado entre a reclamante e o ente público esbarra no óbice da Súmula nº 126 do TST. Nesse contexto, o reconhecimento da competência da Justiça do Trabalho, pelo Tribunal Regional, não ofende o art. 114, I, da Constituição Federal. Arestos inservíveis. Recurso de revista não conhecido. (RR-16941-09.2017.5.16.0018, 8ª Turma, Relatora Ministra Dora Maria da Costa, DEJT 21/08/2020).
Se o trabalhador foi admitido sem prévia submissão a concurso público, já na vigência da Constituição Federal de 1988, mas não há registro nos autos de contratação temporária (art. 37, IX, da Constituição Federal) ou da lei que instituí o regime estatutário, permanecerá, portanto, a competência desta Justiça Especializada para o julgamento da lide. Ainda neste exato sentido:
RECURSO DE REVISTA REGIDO PELA LEI 13.467/2017. TRANSCENDÊNCIA RECONHECIDA. TRABALHADOR ADMITIDO SEM CONCURSO PÚBLICO APÓS A PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ACÓRDÃO REGIONAL EM QUE NÃO REGISTRA A EXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA (ART. 37, IX, DA CF) OU DE VINCULAÇÃO DA RECLAMANTE AO REGIME ESTATUTÁRIO INSTITUÍDO PELO ENTE PÚBLICO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. O Pleno do STF referendou liminar concedida pelo Ministro Nelson Jobim no julgamento da Medida Cautelar na ADI 3.395-6/DF, no sentido de que, mesmo após a EC 45/2004, a Justiça do Trabalho não tem competência para processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e o servidor que a ele seja vinculado por relação jurídico-administrativa. Todavia, somente serão submetidas à apreciação da Justiça Comum aquelas relações estabelecidas entre trabalhador e Administração Pública Direta tipicamente jurídico-administrativas, mantendo a competência desta Justiça Especializada para processar e julgar controvérsia envolvendo pessoal contratado por ente público sob o regime celetista. Precedentes. No caso, extrai-se do acórdão recorrido que a admissão da reclamante ocorreu sem prévia submissão a concurso público, já na vigência da Constituição Federal de 1988. Entretanto, não há registro de contratação temporária (art. 37, IX, da Constituição Federal) ou da lei que instituí o regime estatutário pelo ente público, permanecendo, portanto, a competência desta Justiça Especializada para o julgamento da lide. Julgados. Recurso de revista não conhecido” (RR-406-61.2017.5.22.0107, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes, DEJT 26/06/2020).=
Não se nega aqui que a Justiça do Trabalho não tem competência sobre os litígios entre o Poder Público e servidor que a ele esteja vinculado por relação jurídico-administrativa, ainda que sob o regime celetista. Não é disso que se trata. O busílis é que se não houver elementos probatórios que evidenciem tal relação jurídico-administrativa, requisito indispensável para que se declare a incompetência da Justiça do Trabalho, a competência não poderá ser atribuída à Justiça Comum.
Disso também se extrai que a mera alegação pelo ente público não tem o condão de alterar a competência. Como dito, é preciso prova do regime jurídico administrativo.