Olá pessoal, tudo certo?
Hoje falaremos sobre um tema que envolve “nomenclatura” (que em prova de concurso é questão de sobrevivência) e também tema indagado em prova oral.
Caiu em prova oral, Pedro?
Sim! Uma das questões realizadas na prova oral do VI Concurso da Defensoria Pública da União foi justamente a seguinte: “Candidato(a), conceitue e explique o que é FLAGRANTE FRACIONADO?”.
Antes de responder especificamente sobre o tema, é importante anotar algumas considerações sobre o tema prisão em flagrante. Não obstante a existência de algum debate na doutrina acerca da NATUREZA JURÍDICA da prisão em flagrante, a verdade é que, com o advento da Lei 12.403/2011, as divergências e debates arrefeceram, com a tendência, a partir daí, da prevalência do entendimento há muito defendido por Aury Lopes Jr., para quem a prisão em flagrante revelaria nítido conteúdo pré-cautelar.
De acordo com os ensinamentos do professor gaúcho, não é conveniente tabularmos a prisão em flagrante no rol das medidas cautelares pessoais, mas sim destacar o traço de pré-cautelaridade, haja vista que ela não se dirige a garantir o resultado do processo, mas antes se destina a viabilizar a colocação do preso à disposição do juiz para que, nesse momento, se aprecie a necessidade ou não da aplicação de medida cautelar (de prisão ou diversa da prisão).
A partir dessa leitura, destaca-se outra marca relevante para a compreensão da prisão em flagrante, qual seja a precariedade, uma vez que a detenção do agente sob essa justificativa somente está razoavelmente justificada pela brevidade de sua duração e dever de análise judicial no prazo de até 24 horas, a fim de se posicionar sobre a (i)legalidade da prisão e acerca da necessidade de fixação de medida cautelar (prisional ou não).
O que se deve concluir da análise ora feita é que ninguém poderá permanecer preso com fundamento no flagrante, pois esse não é um título judicial suficiente! Como aponta Aury Lopes, “a restrição da liberdade a título de prisão em flagrante não pode superar as 24 horas (prazo máximo para que o auto de prisão em flagrante seja enviado para o juiz competente, nos termos do artigo 306, parágrafo 2º do CPP[1]http://blog.ebeji.com.br/o-que-e-flagrante-fracionado/ – _ftn3[2])”[3].
Tecidas tais considerações, vamos responder à pergunta título do presente texto. Afinal, O QUE SERIA O FLAGRANTE FRACIONADO?
Para entendermos essa “espécie” de flagrante, antes de tudo é imperiosa a compreensão de crime continuado. A continuidade delitiva, cujos contornos estão plasmados no artigo 71 do CPB, ocorre quando se tem várias condutas que representam diversas infrações penais, mas, por opção do legislador (ficção jurídica), quando da aplicação da sentença condenatória, a aplicação da pena se revelará como se a conduta perpetrada representasse um só crime, exasperada de 1/6 a 2/3.
Trata-se da teoria da ficção jurídica do crime continuado ou teoria da unidade fictícia limitada, abraçada pela legislação pátria, para fins exclusivamente de imposição da pena.
Pedro, qual a importância do crime continuado para a compreensão do flagrante fracionado?
Como já explicado, no crime continuado haverá diversas ações independentes e, sobre elas, incidirá a possibilidade de se efetuar a prisão em flagrante (isoladamente, por cada uma das condutas).
Na medida em que os delitos que compõem o crime continuado guardam autonomia entre si, cada um dele autoriza, de forma independente no tocante aos demais, a efetivação da prisão, desde que presente uma das hipóteses do artigo 302 do CPP. É exatamente o que chama, na doutrina, de FLAGRANTE FRACIONADO OU PARCELADO.
Como sempre falo, meus caros, feliz ou infelizmente, em concurso público, nomenclatura é questão de sobrevivência! Espero que tenham compreendido (mais) essa!
Vamos em frente!
Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.
[1] Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa por ele indicada. § 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de seu advogado, cópia integral para a Defensoria Pública.
[2] Entendemos que o artigo 306 deve ser lido e interpretado em conjunto com o artigo 310 também do CPP, que aponta que o juiz deverá ser manifestar “ao receber o flagrante”, estando a doutrina inclinada a fixar um prazo razoável (24 horas) para essa deliberação. Vejamos:
Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente: I – relaxar a prisão ilegal; ou II – converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou III – conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. § 1º Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato em qualquer das condições constantes dos incisos I, II ou III do caput do art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento obrigatório a todos os atos processuais, sob pena de revogação. (Renumerado do parágrafo único pela Lei nº 13.964, de 2019) § 2º Se o juiz verificar que o agente é reincidente ou que integra organização criminosa armada ou milícia, ou que porta arma de fogo de uso restrito, deverá denegar a liberdade provisória, com ou sem medidas cautelares. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) § 3º A autoridade que deu causa, sem motivação idônea, à não realização da audiência de custódia no prazo estabelecido no caput deste artigo responderá administrativa, civil e penalmente pela omissão. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) § 4º Transcorridas 24 (vinte e quatro) horas após o decurso do prazo estabelecido no caput deste artigo, a não realização de audiência de custódia sem motivação idônea ensejará também a ilegalidade da prisão, a ser relaxada pela autoridade competente, sem prejuízo da possibilidade de imediata decretação de prisão preventiva. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019).
[3] LOPES JR. Aury. Direito Processual Penal, 11ª edição. Editora Saraiva, 2014, pág. 825.
Como já explicado, no crime continuado haverá diversas ações independentes e, sobre elas, incidirá a possibilidade de se efetuar a prisão em flagrante (isoladamente, por cada uma das condutas).
Na medida em que os delitos que compõem o crime continuado guardam autonomia entre si, cada um dele autoriza, de forma independente no tocante aos demais, a efetivação da prisão, desde que presente uma das hipóteses do artigo 302 do CPP. É exatamente o que chama, na doutrina, de FLAGRANTE FRACIONADO OU PARCELADO.
Como sempre falo, meus caros, feliz ou infelizmente, em concurso público, nomenclatura é questão de sobrevivência! Espero que tenham compreendido (mais) essa!
Vamos em frente!
Pedro Coelho – Defensor Público Federal e Professor de Processo Penal e Legislação Penal Especial.