Revista íntima e lei estadual

STF não admite que lei estadual adentre essa competência legislativa federal

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    A revista íntima é aquela em que ocorre desnudamento ou apalpamento. Alguns empregadores utilizavam essa forma como maneira de controlar perdas de produtos. No Direito do Trabalho, ela, como regra quase que absoluta, é proibida, por violar a dignidade da pessoa humana, a intimidade, a vida privada, a honra, a liberdade e o valor social do trabalho. Assim, sua ocorrência gera direito a indenização por danos morais:

“(…) 6 – REVISTA ÍNTIMA. 6.1. No caso, a revista realizada não se limitava a bolsas e sacolas, pois os empregados tinham os corpos apalpados durante a fiscalização, conforme premissa fática consignada no acórdão e insuscetível de revisão, por força da Súmula 126 do TST. 6.2. A jurisprudência desta Corte vem, reiteradamente, entendendo que a revista corporal do empregado ou a que, de alguma forma, ingresse em sua esfera íntima enseja reparação por danos morais. Precedentes. Recurso de revista não conhecido. (…)” (RR-189-69.2012.5.08.0014, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaíde Miranda Arantes, DEJT 18/05/2018).

“(…) INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. REVISTA ÍNTIMA. (…)A Turma do TST registrou que o reclamante trabalhava no estoque, com mais 100 empregados, e que a vistoria era feita por um encarregado no local e outro junto à divisória existente na sala e envolvia 4 a 5 funcionários por vez, os quais tinham que se desnudar em uma sala e, assim, ir até a outra sala para colocar o uniforme, chegando à conclusão de que essa conduta empresarial configura clara ofensa ao direito à intimidade do empregado, previsto no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, não obstante a empresa atue em atividade que envolva manipulação de medicamentos tóxicos e psicotrópicos submetidos a controle estatal. (…)” (E-ED-RR-63000-79.2005.5.15.0058, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro José Roberto Freire Pimenta, DEJT 20/02/2015).

    Existe até mesmo uma regra expressa de proteção às mulheres que proíbe essa prática (art. 373-A, VI, da CLT):

“Art. 373-A. Ressalvadas as disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetam o acesso da mulher ao mercado de trabalho e certas especificidades estabelecidas nos acordos trabalhistas, é vedado:
VI – proceder o empregador ou preposto a revistas íntimas nas empregadas ou funcionárias.”

    Esta norma também é estendida jurisprudencialmente aos homens.

    Ocorre que, se uma lei estadual definir o conceito de revista íntima, seria essa norma constitucional?

    Ademais, ainda que a lei estadual reforce a proibição, haveria constitucionalidade da norma?

    A questão refere-se a um problema de competência. O art. 22, I, da Constituição Federal atribui a competência privativa para legislar sobre Direito do Trabalho à União:

“Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
I – direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;”

    O Supremo Tribunal Federal entendeu que existe um problema de inconstitucionalidade formal, por violação de competência exclusiva da União para legislar sobre Direito do Trabalho. A relevância material da norma não poderia superar esse vício:

CONSTITUCIONAL. FEDERALISMO E RESPEITO ÀS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO DE COMPETÊNCIA. USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA DA UNIÃO. DIREITO DO TRABALHO. VIOLAÇÃO AO ART. 20, I DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INCONSTITUCIONALIDADE. 1. As regras de distribuição de competências legislativas são alicerces do federalismo e consagram a fórmula de divisão de centros de poder em um Estado de Direito. 2. A Lei 12.258/2005, do Estado do Rio Grande do Sul, ao definir o que seria uma revista íntima por empregador em desfavor do empregado, proibindo-a, fixa norma de caráter geral de Direito do Trabalho, matéria de competência exclusiva da União (CF, art. 22, I). 3. A vedação à revista íntima por empregador foi tratada em Lei federal (art. 373-A, CLT) e, embora dirigida exclusivamente às trabalhadoras, teve sua eficácia estendida aos trabalhadores por interpretação jurisprudencial da Justiça do Trabalho. A existência de norma federal a dispor sobre a tutela dos direitos à intimidade, à honra e à dignidade da pessoa na relação de trabalho, afasta a competência concorrente pelos Estados na forma do art. 24, CF, impedida norma estadual que altere os limites do texto da Lei federal e de sua interpretação. 4. Importância material da tutela da honra, da intimidade e da dignidade da pessoa humana, como valores fundamentais decorrentes da Constituição Federal, não prevalece sobre a inconstitucionalidade formal por usurpação de competência exclusiva da União, especialmente quando a tutela àqueles valores constitucionais se dê de forma indireta. Precedentes: ADI 5.307, ADI 2.487. 5. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente. (ADI 3559, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, PUBLIC 05-11-2020)

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