Existem muitas entidades de previdência complementar que são patrocinadas pelo empregador. Tais entidades pagam, no caso de eventual aposentadoria, benefício complementar aos trabalhadores aposentados que também contribuíram para o benefício extra.
Nesse contexto, forma-se uma reserva matemática que custeia a futura complementação de proventos, atendendo ao disposto no art. 202, caput, da Constituição Federal:
“Art. 202. O regime de previdência privada, de caráter complementar e organizado de forma autônoma em relação ao regime geral de previdência social, será facultativo, baseado na constituição de reservas que garantam o benefício contratado, e regulado por lei complementar.”
Ocorre ser muito comum, na Justiça do Trabalho, haver ações de ex-empregados reclamando verbas remuneratórias (como horas extras, por exemplo), as quais integrariam a base de cálculo da complementação de aposentadoria. Dessa forma, depois de vencer a demanda trabalhista, esses trabalhadores, que já recebem o benefício complementar, ajuízam ação contra a entidade de previdência complementar para que haja a revisão de seu benefício.
A competência para essa demanda, como se sabe, é da Justiça Comum. Partindo dessa premissa e considerando a grande quantidade de processos com o mesmo objeto, o Superior Tribunal de Justiça, utilizando a sistemática dos recursos repetitivos, decidiu a matéria no Tema 955.
A Corte Superior entendeu que a formação da prévia reserva matemática é fundamental para impedir o desequilíbrio atuarial dos planos, de maneira que, se o benefício já havia sido concedido ao ex-empregado, a revisão dos cálculos não seria possível. Veja o item I da Tese firmada:
“I – A concessão do benefício de previdência complementar tem como pressuposto a prévia formação de reserva matemática, de forma a evitar o desequilíbrio atuarial dos planos. Em tais condições, quando já concedido o benefício de complementação de aposentadoria por entidade fechada de previdência privada, é inviável a inclusão dos reflexos das verbas remuneratórias (horas extras) reconhecidas pela Justiça do Trabalho nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria;”
Essa lógica privilegia as previsões contidas no art. 18, §§ 1º a 3º, da LC 109/01:
“Art. 18. (…)
§ 1º O regime financeiro de capitalização é obrigatório para os benefícios de pagamento em prestações que sejam programadas e continuadas.
§ 2º Observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, o cálculo das reservas técnicas atenderá às peculiaridades de cada plano de benefícios e deverá estar expresso em nota técnica atuarial, de apresentação obrigatória, incluindo as hipóteses utilizadas, que deverão guardar relação com as características da massa e da atividade desenvolvida pelo patrocinador ou instituidor.
§ 3º As reservas técnicas, provisões e fundos de cada plano de benefícios e os exigíveis a qualquer título deverão atender permanentemente à cobertura integral dos compromissos assumidos pelo plano de benefícios, ressalvadas excepcionalidades definidas pelo órgão regulador e fiscalizador.”
Diante dessa premissa, surge uma questão: e como fica o prejuízo sofrido pelo trabalhador que não teve a verba devidamente paga e integrada ao cálculo do benefício antes da aposentadoria?
O STJ deixou bastante clara a possibilidade de ação contra a empresa ex-empregadora no âmbito da Justiça do Trabalho. Veja o item II da Tese firmada:
“II – Os eventuais prejuízos causados ao participante ou ao assistido que não puderam contribuir ao fundo na época apropriada ante o ato ilícito do empregador poderão ser reparados por meio de ação judicial a ser proposta contra a empresa ex-empregadora na Justiça do Trabalho;”
No entanto, ainda pendia um ponto de relevo. Há diversas condenações do ex-empregador, na Justiça do Trabalho e em virtude do reconhecimento de verbas remuneratórias, para que pague as contribuições respectivas diretamente à entidade de previdência complementar. Ora, se não é possível rever o benefício, o que fazer com esses valores? Poderia a entidade de previdência receber os mesmos sem qualquer contrapartida?
A resposta é negativa. O STJ, no item IV da Tese, entende os valores devem ser repassados a participante ou assistido a título de reparação, impedindo o enriquecimento sem causa da entidade:
“IV – Nas reclamações trabalhistas em que o ex-empregador tiver sido condenado a recompor a reserva matemática, e sendo inviável a revisão da renda mensal inicial da aposentadoria complementar, os valores correspondentes a tal recomposição devem ser entregues ao participante ou assistido a título de reparação, evitando-se, igualmente, o enriquecimento sem causa do ente fechado de previdência complementar.”