O atraso reiterado e deliberado de salários sempre gera um impacto negativo na vida do trabalhador. Além de prejudicar as obrigações que assumiu perante terceiros, passa a ter mais dificuldades para assegurar a sua própria subsistência e de sua família.
Esse atraso causa angústia, dor, sofrimento e exposição a situações constrangedoras. Diante desse quadro, o Tribunal Superior do Trabalho já reconhecia o direito à indenização por danos morais individuais:
“INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DE SALÁRIOS. O Tribunal Regional registrou que a Reclamada deixou de efetuar o pagamento de quatro meses de salários. A jurisprudência desta Corte firmou o entendimento no sentido de que o atraso reiterado no pagamento dos salários causa ao empregado situações constrangedoras, sofrimento e angústia e ainda prejudica o seu sustento e o de sua família. O ato ilícito praticado pela reclamada acarreta dano moral in re ipsa, dispensando a comprovação, sendo presumível o fato danoso. Precedentes. Recurso de Revista de que se conhece em parte e a que se dá provimento ” (RR-101464-93.2016.5.01.0021, 8ª Turma, Relator Ministro Joao Batista Brito Pereira, DEJT 22/01/2021).
No entanto, surgiu uma questão: poderia haver danos morais coletivos? Valores importantes para a sociedade são violados por esse atraso reiterado e deliberado?
O TST entendeu recentemente que existem danos morais coletivos, por ofender a ordem jurídica, afetar a dignidade da relação de trabalho e prejudicar a competitividade de outras empresas que cumprem suas obrigações trabalhistas.
De fato, do ponto de vista social, o ordenamento exige que aquelas pessoas que decidem desempenhar uma atividade para a qual necessitem de mão-de-obra devem suportar os encargos financeiros decorrentes, porquanto o caráter alimentar do salário está diretamente atrelado ao valor social do trabalho e à dignidade do obreiro.
Ademais, do ponto de vista econômico, o empregador que decide atrasar de maneira deliberada o salário dos empregados também concorre de maneira desleal com outras empresas que cumprem suas tarefas adequadamente. O infrator procura manter sua atividade mais atraente em detrimento de direitos alheios, merecendo a justa reprimenda.
Observe o recente julgado do TST sobre o tema:
“INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO. ATRASO REITERADO NO PAGAMENTO DE SALÁRIOS E FGTS. (…) 2. Não obstante, o sistemático e reiterado desrespeito às normas trabalhistas – ausência de recolhimento de FGTS e atraso reiterado no pagamento de salários, por empresa terceirizada pelo Estado, contratada para atividades de limpeza – demonstra que a lesão perpetrada foi significativa e que, efetivamente, ofendeu (‘ in re ipsa’ ) a ordem jurídica, ultrapassando a esfera individual. 3. As empresas que se lançam no mercado, assumindo o ônus financeiro de cumprir a legislação trabalhista, perdem competitividade em relação àquelas que reduzem seus custos de produção à custa dos direitos mínimos assegurados aos empregados. Não consta do acórdão regional, transcrito pela Turma, que a inadimplência tenha se dado por crise econômica da empresa contratada. 4. Diante desse quadro, tem-se que a deliberada e reiterada desobediência do empregador à legislação trabalhista ofende a população e a Carta Magna, que tem por objetivo fundamental construir sociedade livre, justa e solidária (art. 3°, I, da CF). 5. Tratando-se de lesão que viola bens jurídicos elementares do contrato de trabalho, indiscutivelmente caros a toda a sociedade, surge o dever de indenizar, sendo cabível a reparação por dano moral coletivo (arts. 186 e 927 do CC e 3° e 13 da LACP).” (E-ARR-597-30.2013.5.04.0663, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira, DEJT 04/12/2020).