Vamos examinar duas questões cobradas na prova de 2019 no concurso para Procurador do Município de Rondonópolis (MT). Na prova objetiva, constava um questionamento sobre depósito recursal:
“A legislação processual do trabalho em vigor estabelece que o valor do depósito recursal será reduzido pela metade para
a) entidades fiscalizadoras do exercício profissional.
b) entidades filantrópicas.
c) empresas em recuperação judicial.
d) entidades sem fins lucrativos.”
Existem casos em que o legislador optou por dispensar o depósito recursal, não sendo ele exigido para interpor recurso trabalhista contra uma condenação em dinheiro. O preceito mais relevante é o art. 899, § 10, da CLT:
“Art. 899 (…)
§ 10. São isentos do depósito recursal os beneficiários da justiça gratuita, as entidades filantrópicas e as empresas em recuperação judicial.”
Além disso, as pessoas jurídicas de direito público são isentas de realizar o referido depósito, conforme art. 1º, IV, do Decreto-lei 779/69:
“Art. 1º Nos processos perante a Justiça do Trabalho, constituem privilégio da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das autarquias ou fundações de direito público federais, estaduais ou municipais que não explorem atividade econômica:
IV – a dispensa de depósito para interposição de recurso;”
Considerando a natureza autárquica dos Conselhos de Fiscalização Profissional, essas entidades estão dispensadas desse pressuposto recursal. Veja o julgado do Tribunal Superior do Trabalho:
“DESERÇÃO DO RECURSO ORDINÁRIO. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. NATUREZA JURÍDICA. APLICABILIDADE DOS PRIVILÉGIOS DO DECRETO-LEI 779/69. De acordo com a jurisprudência consolidada nesta Corte, as entidades de fiscalização de exercício profissional, consideradas autarquias especiais, estão abrangidas pelo Decreto-Lei 779/69, para fim de concessão das prerrogativas nele previstas, inclusive as regras de dispensa do depósito recursal e de pagamento ao final de custas processuais. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido” (RR-20222-60.2013.5.04.0013, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaide Miranda Arantes, DEJT 26/06/2020).
Por outro lado, há hipóteses em que o valor do depósito recursal deve ser reduzido à metade, conforme art. 899, § 9º, da CLT:
“Art. 899 (…)
§ 9o O valor do depósito recursal será reduzido pela metade para entidades sem fins lucrativos, empregadores domésticos, microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte.”
Portanto, a letra “d” está correta.
Outra questão do concurso tratava do ônus da prova no Processo do Trabalho:
“A respeito da distribuição dinâmica do ônus da prova no processo do trabalho, analise as assertivas.
I- A distribuição diversa do ônus da prova, conforme previsto na legislação processual do trabalho em vigor, decorre de determinação legal, judicial ou por convenção das partes.
II- Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa no que tange à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo ou a maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juízo atribuir o ônus de forma diversa.
III- A decisão judicial, que redistribuir dinamicamente o ônus da prova, deverá ser proferida antes da abertura da instrução e, a requerimento da parte, implicará o adiamento da audiência e possibilitará provar os fatos por qualquer meio em direito admitido.
IV- O empregador reclamado, a quem o juízo atribuir o encargo de produzir prova excessivamente difícil, poderá interpor recurso de imediato, a fim de restabelecer o equilíbrio da relação processual.
Estão corretas as assertivas
a) I, II e III, apenas.
b) II e III, apenas.
c) I, II e IV, apenas.
d) I e IV, apenas.”
O item I está errado. A distribuição do ônus da prova observa as regras previstas em lei. Eventual inversão decorre de previsão legal ou por determinação judicial, mas jamais por convenção entre as partes no Processo do Trabalho.
Muito embora o ajuste processual seja possível no processo civil (art. 373, § 3º, do CPC), o Tribunal Superior do Trabalho entende que não existe compatibilidade com o processo trabalhista. Leia o art. 2º, VII, da Instrução Normativa 39/2016 do TST:
“Art. 2° Sem prejuízo de outros, não se aplicam ao Processo do Trabalho, em razão de inexistência de omissão ou por incompatibilidade, os seguintes preceitos do Código de Processo Civil:
VII – art. 373, §§ 3º e 4º (distribuição diversa do ônus da prova por convenção das partes);”
O item II está certo. É o que dispõe o art. 818, § 1º, da CLT:
“Art. 818. (…)
§ 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos deste artigo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juízo atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.”
O item III está certo. É o que dispõe o art. 818, § 2º, da CLT:
“Art. 818. (…)
§ 2º A decisão referida no § 1o deste artigo deverá ser proferida antes da abertura da instrução e, a requerimento da parte, implicará o adiamento da audiência e possibilitará provar os fatos por qualquer meio em direito admitido.”
O item IV está equivocado. É verdade que o juiz não pode atribuir encargo de impossível cumprimento ou excessivamente difícil. No entanto, não existe recurso imediato cabível de tal decisão, por força do princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias.
Assim, cabe à parte registrar seus protestos e, por ocasião da preliminar do recurso ordinário contra a futura sentença, alegar a nulidade processual, atendendo ao art. 893, § 1º, da CLT:
“Art. 893 (…)
§ 1º – Os incidentes do processo são resolvidos pelo próprio Juízo ou Tribunal, admitindo-se a apreciação do merecimento das decisões interlocutórias somente em recursos da decisão definitiva.”
Logo, a letra “b” está correta.