Neste texto, analisaremos outras questões cobradas na prova de 2019 no concurso para Procurador do Município de Campo Grande. Na prova objetiva aplicada pelo CESPE/CEBRASPE, constava a seguinte afirmação sobre dispensa discriminatória:
“A demissão sem justa causa de empregado portador de doença grave presume-se discriminatória e gera o direito à reintegração.”
O item está correto, mas poderia haver uma melhor formulação. O Tribunal Superior do Trabalho reconhece que a dispensa de empregado que possui doença grave que gere estigma ou preconceito se presume discriminatória, na forma da Súmula 443:
“DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.”
Claro que essa presunção é relativa, cabendo ao empregador provar que a dispensa ocorreu por outros motivos não discriminatórios, ainda que não sejam disciplinares, como questões técnicas, econômicas etc. Observe esse julgado do TST:
“DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. NEOPLASIA MALIGNA. CÂNCER DE MAMA. Discute-se a aplicação da Súmula 443 do TST nas hipóteses de dispensa de empregado portador de neoplasia maligna. Da leitura do acórdão embargado, verifica-se que a Turma julgadora concluiu que o câncer, por si só, não possui natureza contagiosa nem estigmatizante, cabendo à empregada o ônus de provar que, no caso concreto, havia estigma ou motivação discriminatória em sua dispensa. Nesse contexto, constata-se a dissonância do julgamento com o entendimento recentemente firmado pela SbDI-1 que, ao interpretar a Súmula 443 do TST, fixou tese no sentido de que se presume discriminatória a dispensa do empregado portador de neoplasia maligna, presunção esta que só pode ser elidida mediante prova robusta em sentido contrário, a cargo da empresa . Recurso de embargos conhecido e provido” (E-ED-RR-2493-66.2014.5.02.0037, Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, Relator Ministro Alexandre Luiz Ramos, DEJT 04/09/2020).
Muito embora a assertiva da prova seja verdadeira, ela poderia te sido melhor elaborada para esclarecer “doença greve que suscite estigma ou preconceito”, e não somente “doença grave”. No entanto, como o examinador não mencionou “qualquer doença grave”, então segue-se a regra prevista na Súmula.
Registre-se, ainda, que o direito à reintegração decorre da lei, tendo o legislador facultado ao trabalhador dispensado de forma discriminatória a escolha pela reintegração, conforme se constata no art. 4º da Lei 9.029/95:
“Art. 4º O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta Lei, além do direito à reparação pelo dano moral, faculta ao empregado optar entre:
I – a reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais;
II – a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.”
Outra assertiva tratava sobre liberdade sindical:
“É válida cláusula de convenção coletiva de trabalho que faça previsão expressa de preferência à contratação de empregados sindicalizados.”
O item está errado. A liberdade sindical também envolve o direito de o empregado não se filiar ou, caso esteja associado, o direito de se desfiliar do sindicato. Trata-se de direito reconhecido constitucionalmente no art. 8º, V:
“Art. 8º É livre a associação profissional ou sindical, observado o seguinte:
V – ninguém será obrigado a filiar-se ou a manter-se filiado a sindicato;”
Nesse panorama, revela-se descabido imaginar que uma norma coletiva preveja que a preferência para a contratação de empregados seja feita com base na filiação a um sindicato. Prestigiar quem é filiado significa afetar a liberdade sindical daquele que não possui interesse na filiação.
Dessa forma, o TST entende que eventual cláusula normativa prevendo essa preferência na admissão cuida de conduta contrária à liberdade individual e sindical, reputando nula a referida cláusula, conforme se infere da OJ 20 da SDC:
“EMPREGADOS SINDICALIZADOS. ADMISSÃO PREFERENCIAL. CONDIÇÃO VIOLADORA DO ART. 8º, V, DA CF/88 (inserido dispositivo) – DEJT divulgado em 16, 17 e 18.11.2010
Viola o art. 8º, V, da CF/1988 cláusula de instrumento normativo que estabelece a preferência, na contratação de mão de obra, do trabalhador sindicalizado sobre os demais.”
Uma terceira assertiva tratava da estabilidade do dirigente sindical:
“Delegado sindical não é beneficiário da estabilidade provisória, porque a estabilidade apenas é aplicada aos que exercem cargo de direção nos sindicatos e que tenham sido submetidos a processo eletivo.”
Esse item é verdadeiro e expressa o entendimento do TST presente na OJ 369 da SDI-I:
“ESTABILIDADE PROVISÓRIA. DELEGADO SINDICAL. INAPLICÁVEL.
O delegado sindical não é beneficiário da estabilidade provisória prevista no art. 8º, VIII, da CF/1988, a qual é dirigida, exclusivamente, àqueles que exerçam ou ocupem cargos de direção nos sindicatos, submetidos a processo eletivo.”