O Estado nasce a partir do momento em que ele reúne esses elementos essenciais à sua constituição. Trata-se de questão de fato, de uma realidade física e não de uma ficção jurídica, razão pela qual sua existência não depende de nenhum reconhecimento jurídico. Com efeito, “a existência política do Estado é independente do seu reconhecimento pelos demais Estados” (art. 3º da Convenção Interamericana sobre Direitos e Deveres dos Estados de Montevidéu).
Sobre o tema, importante dizer que um Estado não se pode constituir a partir de grave violação do direito das gentes, por força do princípio ex injuria ius non oritur, ou seja, uma violação do direito não pode criar outro direito.
Quando se fala em reconhecimento de Estado e reconhecimento de Governo já foi dito que “a existência política do Estado é independente do seu reconhecimento pelos demais Estados” (art. 3º da Convenção Interamericana sobre Direitos e Deveres dos Estados de Montevidéu). Mas, mesmo existindo politicamente um Estado, isso não significa que outros Estados sejam obrigados a reconhecê-lo, de modo que o reconhecimento de um Estado por outro é ato discricionário.
No que tange ao reconhecimento do Governo (e não do Estado, é bom frisar) a chamada Doutrina Tobar ou Tovar, de 1907. Carlos Tobar (1853 – 1920) foi Ministro das Relações Exteriores do Equador no início do século XX. Em 1907, proferiu uma declaração defendendo que a única forma para evitar golpes de Estado na região americana seria a comunidade internacional se recusar a reconhecer os governos golpistas como legítimos, rompendo relações diplomáticas e formulando contra eles uma declaração de não-reconhecimento, até que aquele governo fosse confirmado nas urnas.
Em outras palavras, segundo essa doutrina o reconhecimento de governos só deveria ser concedido após a constatação de que estes contam com apoio popular. Em razão de seu conteúdo, é também conhecida como doutrina da legitimidade, pois, segundo essa doutrina, o reconhecimento do governo só deve se dar caso conte com o apoio popular.
Por sua vez, a Doutrina Estrada, que leva esse nome em razão de seu defensor Genaro Estrada, Ministro das Relações Exteriores do México na década de 30, afirma que o reconhecimento ou não reconhecimento expresso de um novo governo configura intervenção indevida em assuntos internos de outros entes estatais e, portanto, ofende a soberania, razão pela qual se o Estado está insatisfeito com a mudança de governo de outro, deve simplesmente com ele romper as relações diplomáticas. É conhecida como doutrina da efetividade. A crítica que se faz a esse pensamento é que a manutenção de agentes diplomáticos é uma forma de reconhecimento tácito de Governo, mas o rompimento das relações diplomáticas não significa a retirada desse mesmo reconhecimento.
A doutrina Drago foi criada em 1902 pelo chanceler argentino Luis María Drago e busca trazer resposta para a seguinte indagação: “um Estado soberano pode usar a força contra outro com a finalidade de cobrar uma dívida?” Em outros termos, a intervenção de um Estado em outro com o intuito de forçá-lo a pagar dívidas viola o princípio da não intervenção?
Segundo a doutrina Drago é ilícito o emprego da força por um Estado para obrigar outro Estado a pagar suas dívidas, porque isso é contrário ao princípio da não intervenção e viola a soberania alheia.
Paulo Henrique Gonçalves Portela lembra que, posteriormente a doutrina Drago foi mitigada pela chamada Convenção Porter, que defendeu a possibilidade do emprego da força armada contra um Estado para cobrança de dívidas em duas hipóteses: (i) quando o ente estatal devedor não aceitar a arbitragem para solucionar a questão referente ao débito; ou, (ii) quando tendo aceito a arbitragem, se recuse a cumprir o laudo arbitral.[1]
Mas, segundo o mesmo autor, a Convenção Porter não mais encontra amparo atualmente e encontra-se derrogada no ponto referente às hipóteses de emprego da força para cobrança de dívidas de Estados, por chocar-se contra o Pacto Briand-Kellog e contra princípios posteriormente consagrados na Carta das ONU, que vedam totalmente o emprego da força nas relações internacionais, salvo em caso de legítima defesa individual ou coletiva contra agressão externa ou de ação militar determinada pela própria ONU.[2]
[1] PORTELA, Paulo Henrique Gonçalves. Direito internacional público e privado. 9. ed. Salvador: JusPodivm, 2017. p. 178.
[2] Idem. p. 179.