Santa Sé e o Estado da Cidade do Vaticano

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Para tratar da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano algumas premissas devem ser fixadas, quais sejam:

  • a) Santa Sé não é sinônimo de Estado da Cidade do Vaticano;
  • b) a Santa Sé, mesmo não sendo tecnicamente um Estado, foi há muito tempo reconhecida como sujeito de direito internacional e já firmava tratados e participava das relações internacionais;
  • c) o Estado da Cidade do Vaticano é posterior à existência da Santa Sé, sendo criado apenas em 1929, pelo Tratado de Latrão, que reconheceu a soberania do Estado do Vaticano no campo internacional;
  • d) o Papa é o chefe de uma como de outra;
  • e) Tanto a Santa Sé, como o Estado da Cidade do Vaticano, possuem personalidades jurídicas internacional;
  • f) a Santa Sé tem o direito à plena propriedade, o poder exclusivo e absoluto e a jurisdição soberana sobre o Estado do Vaticano, que pode ser considerado um Estado instrumental, a serviço da Santa Sé;
  • g) a soberania do Estado da Cidade do Vaticano é originária, porque decorre da própria existência do Estado, mas com sua representação e seu poder de governo submetido à autoridade da Santa Sé;
  • h) o Estado da Cidade do Vaticano tem como forma de governo a monarquia absoluta, cujo chefe de Estado é o Sumo Pontífice, que detém a plenitude dos três poderes;
  • i) O Estado da Cidade do Vaticano possui território, reconhecido pelos Tratados de Latrão, em 1929.

A Santa Sé é a cúpula do governo da Igreja Católica, chefiada pelo Papa e composta pela Cúria Romana, entendida como o conjunto de órgãos que assessora o Sumo Pontífice em sua missão.

Por sua vez, o Estado da Cidade do Vaticano é o local onde está abrigada a Santa Sé. O Vaticano, tal como os demais Estados, possui um território, uma população e um governo. Mas, quanto aos seus fins, ou seja, quanto ao elemento teleológico, não se assemelha aos moldes objetivos de todo Estado, pois seus fins se orientam para o plano espiritual e governo da Igreja. Ainda, não possui uma dimensão pessoal, pois não possui nacionais.

Portanto, dos elementos que geralmente compõem os Estados comuns, faltam ao Estado do Vaticano o elemento teleológico (pois, como dito, sua finalidade é religiosa), bem como a figura dos nacionais. Não obstante, “apesar de não corresponder exatamente com os Estados comuns, a Santa Sé possui, por legado histórico, personalidade jurídica de direito internacional”. Tem-se, em verdade, “um caso único de personalidade internacional anômala” (cf. REZEK, José Francisco, p. 232-233).

A personalidade internacional da Santa Sé foi reforçada com os Tratados de Latrão, firmado entre a Itália e a Santa Sé em 1929, por meio do qual foi criado o “Estado da Cidade do Vaticano”, dentro do qual a Santa Sé se encontra instalada (cf. MAZZUOLI, Valério de Oliveira, 2021, p. 462).

Advirta-se, com isso, que a Santa Sé não é um Estado. Em verdade, o governo da Santa Sé é abrigado e sediado no Estado da Cidade do Vaticano. No entanto, ela não se limita a território algum, expandindo seus tentáculos por todo o mundo. Outorgou-se à Santa Sé soberania interna e autonomia externa, não obstante ter deixado às autoridades italianas a competência para persecução em matéria penal.

Observe-se que tanto a Santa Sé, como o Estado da Cidade do Vaticano são sujeitos de direito internacional, ambos chefiados pelo Papa. Ambos podem celebrar tratados, participar de organizações internacionais e exercer o direito de legação, ou seja, estabelecer relações diplomáticas. Mas, o poder de legação do Vaticano é exercido pela Santa Sé, que age em nome do Estado da Cidade do Vaticano.

O Papa goza de status e prerrogativas de um Chefe de Estado e a missão diplomática da Santa Sé é chamada de nunciatura apostólica, chefiadas, portanto, por Núncios Apostólicos.

Por fim, os tratados internacionais celebrados pela Santa Sé, quando objetivem regular assuntos de interesse da Igreja Católica Apostólica Romana ou de seus fiéis, chamam-se “concordatas”, que reconhecem aos católicos situações ligadas à sua vida e atividade. Mas, a Santa Sé pode celebrar outros tratados internacionais, para além das concordatas, quando não tratar de questões propriamente religiosas.

Até o final do século XX, o Brasil e a Santa Sé não haviam firmado nenhuma concordata, embora mantivessem troca regular de embaixadores. Atualmente, as relações entre Brasil e Santa Sé são reguladas pelo Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, firmado em 2008 e em vigor desde dezembro de 2009 (Decreto nº 7.107, de 11/02/2010).

Ainda, apesar de sua finalidade religiosa, a Santa Sé é parte em diversas convenções multilaterais no âmbito das Nações Unidas, como convenções sobre direitos humanos. A situação atual perante a ONU é de observador permanente.

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