A correção monetária, como se sabe, desempenha papel essencial para combater a inflação. De fato, o poder de compra apenas permanece o mesmo com a incidência da correção monetária. Por exemplo, R$ 100,00 neste ano não compram o mesmo que R$ 100,00 no ano passado (hoje vale menos por causa da inflação).
Nas condenações trabalhistas, a lei previa a aplicação da TR como índice de correção monetária, na forma do art. 39, caput, da Lei 8.177/91:
“Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva, sentença normativa ou cláusula contratual sofrerão juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento.”
O Tribunal Superior do Trabalho, contudo, reconheceu a inadequação da TR como índice de correção monetária, seguindo a mesma diretriz já traçada pelo Supremo Tribunal Federal quando tratou da matéria de precatórios e do art. 1º-F da Lei 9.494/97.
De fato, o STF já havia fixado entendimento de que, nas ações contra a Fazenda Pública, o índice correto é o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), reconhecendo que a Taxa Referencial (TR) não combate a inflação. Veja um trecho da Tese da Tema 810 da Lista de Repercussão Geral:
“(…) 2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.”
Por outro lado, a reforma trabalhista inseriu, no art. 879, § 7º, da CLT, a correção pela TR dos créditos trabalhistas reconhecidos pela Justiça do Trabalho:
“Art. 879 (…)
§ 7º A atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial será feita pela Taxa Referencial (TR), divulgada pelo Banco Central do Brasil, conforme a Lei no 8.177, de 1º de março de 1991.”
Foi nesse contexto que o debate chegou ao Supremo Tribunal Federal por meio das ADC nº 58 e nº 59 e nas ADI 5867 e 6021. Toda a comunidade jurídica trabalhista esperava uma decisão do STF sobre qual deveria ser o índice de correção monetária aplicável aos créditos trabalhistas. Seria a TR prevista no art. 879, § 7º, da CLT? Seria o IPCA-E? Seria outro?
A decisão desta semana surpreendeu uma grande quantidade de pessoas. O STF decidiu que, dada a insuficiência da TR, até que haja lei tratando sobre o tema, deve-se utilizar o IPCA-E na fase pré-judicial e, a partir da citação do réu, a Taxa Selic.
No entanto, diversos questionamentos surgiram. Em primeiro lugar, a Taxa Selic encontra-se atualmente abaixo da inflação, ou seja, se ela for aplicada, o crédito trabalhista terá uma correção menor do que a defasagem do dinheiro. Assim, o trabalhador, quando recebe seu crédito, terá menos poder de compra do que teria se recebesse na época própria. Se o empregador tivesse pago, na época correta, as verbas trabalhistas, o trabalhador poderia comprar mais do que poderá ao receber após anos de tramitação da demanda na Justiça.
Além disso, lembre-se de que a taxa Selic abrange juros e correção monetária, não se tratando apenas de correção. Veja esse julgado do Superior Tribunal de Justiça:
“(…) TAXA SELIC – INCIDÊNCIA A PARTIR DE 1º.1.96 – IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM OUTROS ÍNDICES DE CORREÇÃO MONETÁRIA E COM JUROS MORATÓRIOS (…) 1. Nos casos de repetição de indébito tributário, a orientação prevalente no âmbito da 1ª Seção quanto aos juros é de que após a edição da Lei 9.250/95, aplica-se a taxa SELIC desde o recolhimento indevido, ou, se for o caso, a partir de 1º.01.1996, não podendo ser cumulada, porém, com qualquer outro índice, seja de atualização monetária, seja de juros, porque a SELIC inclui, a um só tempo, o índice de inflação do período e a taxa de juros real. (…) (REsp 875.093/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/06/2008, DJe 08/08/2008)”
Partindo dessa premissa, como ficam os juros de 1% ao mês que são previstos no art. 39, § 1º, da Lei 8.177/91?
“Art. 39 (…)
§ 1° Aos débitos trabalhistas constantes de condenação pela Justiça do Trabalho ou decorrentes dos acordos feitos em reclamatória trabalhista, quando não cumpridos nas condições homologadas ou constantes do termo de conciliação, serão acrescidos, nos juros de mora previstos no caput, juros de um por cento ao mês, contados do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die, ainda que não explicitados na sentença ou no termo de conciliação.”
O preceito não foi revogado e tampouco declarado inconstitucional. Se ele for aplicado, não haverá bis in idem no que tange aos juros?
Ademais, o que fazer com as decisões condenatórias transitadas em julgado que mandaram aplicar os juros de 1%, mas deixaram a correção monetária para ser definida na liquidação? Vai aplicar taxa Selic (que já possui juros)? Não haveria bis in idem?
Todas essas questões geram diversos debates e ainda estamos somente no início.