A dispensa de um empregado implica a necessidade de pagamento de verbas rescisórias pelo empregador, consoante prevê o art. 477, § 6º, da CLT:
“Art. 477 (…)
§ 6º A entrega ao empregado de documentos que comprovem a comunicação da extinção contratual aos órgãos competentes bem como o pagamento dos valores constantes do instrumento de rescisão ou recibo de quitação deverão ser efetuados até dez dias contados a partir do término do contrato.”
Claro que essa quitação somente atinge as verbas rescisórias que se encontram no termo de rescisão, na forma do art. 477, § 2º, da CLT:
“Art. 477 (…)
§ 2º – O instrumento de rescisão ou recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas.”
QUITAÇÃO. VALIDADE (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003
Na mesma direção segue a Súmula 330 do Tribunal Superior do Trabalho:
“A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas.
I – A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, conseqüentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo.
II – Quanto a direitos que deveriam ter sido satisfeitos durante a vigência do contrato de trabalho, a quitação é válida em relação ao período expressamente consignado no recibo de quitação.”
Como os efeitos da quitação são limitados, é comum ver empregadores buscarem meios de ampliar esses efeitos. É exatamente nesse ponto que começa o debate. No entanto, para entender o problema, precisamos lembrar de que existe a figura da homologação de acordo extrajudicial.
Na Justiça do Trabalho, surgiu a possibilidade de homologação de acordo extrajudicial, conforme se constata no art. 652, “f”, da CLT:
“Art. 652. Compete às Varas do Trabalho:
f) decidir quanto à homologação de acordo extrajudicial em matéria de competência da Justiça do Trabalho.”
Sabe-se que se trata de um procedimento de jurisdição voluntária, em que as partes apresentam uma petição conjunta, conforme se nota no art. 855-B, caput, da CLT:
“Art. 855-B. O processo de homologação de acordo extrajudicial terá início por petição conjunta, sendo obrigatória a representação das partes por advogado.”
Apresentada a petição, o juiz deve analisar os termos do acordo e sua validade, verificar a intenção das partes e os efeitos da avença. Claro que, havendo alguma ilicitude ou nulidade insanável, cabe ao magistrado indeferir a homologação, voltando a correr o prazo prescricional que foi suspenso pelo ajuizamento da ação:
“Art. 855-E. A petição de homologação de acordo extrajudicial suspende o prazo prescricional da ação quanto aos direitos nela especificados.
Parágrafo único. O prazo prescricional voltará a fluir no dia útil seguinte ao do trânsito em julgado da decisão que negar a homologação do acordo.”
Diante desse quadro, alguns empregadores começaram a buscar acordos extrajudiciais com empregados para o simples pagamento de verbas rescisórias que já eram devidas, mas atribuindo a esse ajuste uma eficácia liberatória geral.
Atenta a essa circunstância, a Corte Superior Trabalhista não admite essa possibilidade. Não se aceita qualquer tentativa de eliminar, de forma ampla e irrestrita, a discussão sobre outras verbas trabalhistas mediante o uso de verbas que já seriam devidas e pagas invariavelmente. Veja esse julgado da Subseção I de Dissídios Individuais:
“PROCESSO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA. ACORDO EXTRAJUDICIAL. HOMOLOGAÇÃO. ARTS. 855-B A 855-E DA CLT. A Lei nº 13.467/2017 instituiu, no âmbito da Justiça do Trabalho, o Processo de Jurisdição Voluntária com vistas à homologação de acordos celebrados extrajudicialmente, conforme artigos 855-B a 855-E da CLT. Da interpretação do art. 855-D, extrai-se que o juízo não está obrigado a homologar todo e qualquer acordo extrajudicial, cabendo-lhe analisar não apenas os requisitos gerais de validade dos negócios jurídicos (agente capaz, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa por lei) e os requisitos extrínsecos (petição conjunta e representação das partes por advogados distintos), mas também o seu conteúdo, a fim de verificar se a proposta apresentada não está sendo utilizada para fraudar direitos trabalhistas e lesar o trabalhador. Toda transação pressupõe concessões recíprocas por parte daqueles que pretendem prevenir ou terminar conflitos. Nesse sentido, não é razoável admitir que o acordo extrajudicial seja utilizado apenas como forma de pagamento do acerto rescisório, pois não é esse o objetivo da norma. Na hipótese, consoante quadro fático traçado no acórdão recorrido, não há transação a ser homologada, pois a conciliação visa tão somente ao pagamento das parcelas decorrentes da resilição do contrato, inclusive a multa do artigo 477, § 8º, da CLT. Não há qualquer direito transigido, na medida em que a empresa se limita a pagar as parcelas rescisórias valendo-se da cláusula de quitação geral e irrestrita do contrato de trabalho que, frise-se, perdurou mais de dez anos. Destarte, evidenciado que a petição de acordo extrajudicial circunscreve-se a direitos indisponíveis (verbas rescisórias), correto o indeferimento do pedido de homologação. Recurso de revista não conhecido ” (RR-20287-08.2020.5.04.0305, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 09/04/2021).
Logo, o juiz deve indeferir a homologação de ajustes que concedem eficácia liberatória geral quando somente quitam as verbas rescisórias.