Escolher entre emprego, carreira solo ou sociedade é desafio para advogados

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Por João Ozorio de Melo

Todo cidadão é criado nos EUA sob a influência do “sonho americano”, que tem mais de uma interpretação. Politicamente, é um conjunto de ideais (democracia, direitos, liberdade, oportunidades e igualdade). Popularmente, significa oportunidade igual para todos para alcançar sucesso e prosperidade, por meio do trabalho árduo, determinação e iniciativa — embora já se tenha escrito que o sonho americano é ficar rico, comprar uma casa, casar, ter dois filhos, “pets” e plantar uma árvore. Mas há um sonho americano que é mais notável no dia a dia dos cidadãos e que se impõe a todos os outros: ser o próprio chefe.
Com os advogados, não é diferente. A maioria sonha com o “negócio próprio” e o que vem com ele: ser o próprio patrão para fazer o que quiser fazer, em vez de ter um patrão ordenando que faça ou que preferiria não fazer (como passar horas pesquisando jurisprudência, decisões judiciais e legislação, em vez de atuar no tribunal); ter horários flexíveis, em vez de horários rígidos; colher todo o fruto financeiro da atividade, não apenas uma pequena porção dele.
A dúvida que corrói a imaginação dos futuros chefes de si mesmos se refere às opções do sonho: perseguir uma carreira solo (sociedade pessoal) ou formar uma sociedade de advogados, com um, dois, três ou mais colegas de profissão. As duas opções têm prós e contras. E estão tão presentes nas vidas dos advogados que são temas de artigos em praticamente todas as publicações para advogados, como Lawyerist, Above the Law, FindLaw, Jornal da ABA e também na revista Forbes.
Mas, antes de optar por uma ou outra coisa, há o emprego. De uma maneira geral, nos EUA, um bacharel em Direito só faz uma troca direta do banco da faculdade pela poltrona do escritório se não conseguir emprego — ou, em alguns casos, se já estavam dispostos a abrir um “negócio próprio” e nunca procurar emprego. A maioria, porém, prefere arrumar um emprego, depois da formatura, para adquirir experiência, observar os detalhes da administração do escritório, o trabalho dos chefes e dos advogados mais experientes e aprender como se conquista e se retém clientes.
Chegada a hora de decidir pela atuação solo ou em sociedade, com experiência de emprego ou não, a primeira decisão é se o advogado realmente quer (ou não) abrir o “negócio próprio” sozinho ou com sócio. Um escritório tem custos/despesas administrativas, uma estrutura operacional a ser montada e, no início, poderá não ter clientes. É uma decisão ao mesmo tempo estimulante e intimidante.
Advogado autônomo
Se o advogado optar pela carreira solo, logo descobrirá que a vida de lobo solitário não prevê horas flexíveis mais amenas do que a que tinha no emprego, nem fuga de trabalhos que gostaria de evitar. Ao contrário, deverá trabalhar mais horas e terá de fazer todos os trabalhos de um escritório de advocacia (até que contrate pessoal), que incluem administrar uma “empresa” e fazer marketing para conquistar clientes.
É comum se ensinar nos cursos de negócios, nos EUA, que todo profissional que decide abrir o próprio negócio deve se tornar um “três emum”. Isto é: um profissional, um empresário/administrador e um marqueteiro. Do contrário, vai fechar as portas por falta de receitas para cobrir as despesas.
No entanto, ser advogado autônomo garante o máximo de autonomia, é claro — ou quase: você ainda terá de trabalhar para o cliente, para o tribunal (ouvir ordens de juízes). E terá de viver sob a autoditadura, porque, se não tem mais um chefe, você terá de ser seu próprio chefe, se autodisciplinando, se obrigando a cumprir prazos, a acordar cedo, a ir em reuniões sociais e eventos para conquistar clientes, em vez de ir para casa descansar.
Como advogado autônomo, você terá de se motivar para fazer tudo o que tem de ser feito — ou dar as ordens e cumpri-las. Tem de conviver com a solidão, se ocupar com o pagamento de contas e com todo o trabalho normal do advogado — sem, no entanto, ter de dar satisfações a a quem quer que seja, a não ser a você mesmo.
Há vantagens nisso. Uma delas é a de que você pode ter uma visão de curto, médio e longo prazo, sabendo qual caminho quer percorrer, onde quer chegar, sem ter de negociar um acordo com sócios a cada passo – e nunca ter uma visão de longo prazo, porque os objetivos de cada um podem ser muito diferentes. Você tem carta branca para decidir e agir. Também há um ganho em produtividade, pelo mesmo motivo de que não é preciso fazer uma reunião para se decidir cada passo que o escritório vai dar.
Um advogado solo também não tem de se preocupar com divisão de lucros. Nem com divisão das glórias do sucesso ou da culpa pelos fracassos. Se acontecer algo muito errado e a banca “explodir”, ele “explode” junto, porque responde pessoalmente por qualquer desastre. Ao contrário, em uma sociedade de advogados, se a banca “explodir”, os advogados ainda podem se salvar.
Sociedade de advogados
De uma maneira geral, advogados tendem a formar sociedades com o melhor amigo da faculdade ou com o melhor colega do escritório em que são empregados. Porém, se os dois ou três advogados forem muito competentes profissionalmente, mas não tiverem qualquer qualificação para empreender e administrar o “negócio”, muito menos para fazer marketing e conquistar clientes, o plano não se consuma.
Uma ideia é associar o conhecimento profissional à qualificação empresarial e de marketing. Empresas como Apple, eBay e Twitter foram construídas com base nesse fundamento: um sócio com expertise técnica e um sócio com tino para negócios e marketing.
Entre advogados, essa é uma fórmula que pode funcionar bem, se cada sócio souber valorizar o trabalho do outro. Do contrário, haverá ressentimentos, formados por pensamentos negativos. O sócio encarregado de liderar o trabalho jurídico pensa que pega no pesado até altas horas, enquanto seu sócio sai mais certo para se divertir em uma recepção ou ir a um jantar. O sócio encarregado de conquistar clientes, pensa que poderia muito bem operar o escritório sozinho e contratar advogados assalariados para fazer o trabalho jurídico.
Se o plano for associar um administrador e um profissional qualificado, é melhor que ambos também possam atuar, de alguma forma, na área do outro. O “profissional”, principalmente, deve ter um certo conhecimento dos “negócios”. Se um dos sócios não puder participar das decisões de negócios, ele será relegado à posição de sócio-operário (sem salário). E a sociedade não vai funcionar.
A sociedade de advogados também tem a vantagem de somar capitais e dividir custos para montar e operar o escritório. Podem compartilhar o imóvel, mobiliário, impressora, fax, linha telefônica, secretária e tudo o mais. Mas há problemas quando, por exemplo, um sócio pensa que valeria a pena investir em alguns softwares para facilitar e agilizar os trabalhos e outro sócio acha que essa é uma despesa dispensável. O advogado, que já passa o dia tentando convencer clientes, juízes e jurados, ainda tem de convencer seu próprio sócio o tempo todo.
Um ponto forte da sociedade é ter alguém para discutir, de forma produtiva, os processos judiciais e a administração do escritório, quando as coisas ficam mais complexas. Sabe-se que duas, três ou mais “cabeças pensantes” funcionam bem melhor que uma sozinha, especialmente quando o sucesso de todos depende de uma boa decisão.
No caso de dois advogados que preferem dedicar todo ou quase todo seu tempo à advocacia, deixando a administração e o marketing para um terceiro – ou para os dois, quando tiverem tempo – uma ideia é encarregar um dos sócios do serviço arroz com feijão (casos que geram algum dinheiro constantemente, para pagar as contas e os próprios advogados) e encarregar o outro sócio de buscar minas de ouro (isso é mais fácil nos EUA, porque casos de indenização por danos, por exemplo, podem gerar de centenas de milhares a milhões de dólares).
Outra fórmula é cada sócio (sejam dois, três ou quatro) trabalhar em uma área diferente, de forma que cada um possa recomendar o outro a seus próprios clientes (e a outros), quando surgir um problema jurídico que não é de sua área de atuação.
Sociedades ou parcerias não funcionam bem todo o tempo. Nos EUA, 62% de todas as sociedades empresariais – não só de advogados – falham devido a conflitos entre os sócios. A visão dos sócios é frequentemente um ponto de conflito, quando um sócio vê a sociedade como um projeto de vida e o outro como uma solução temporária, já que não há nada melhor em vista, no momento. Outro é desvalorizar o trabalho do sócio.
Fonte: www.conjur.com.br
 

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