Em julgamento apertado que teve diversos pedidos de vista, a 3ª turma do STJ garantiu a uma promotora de Justiça que seu nome seja desvinculado do tema “fraude em concurso para juiz” nos resultados de pesquisas na internet.
A promotora foi inocentada pelo CNJ da acusação de fraudar um concurso para magistratura, no qual foi reprovada, fato ocorrido em 2007. Contudo, a busca por notícias relacionadas ao tema retornava com resultados que citavam a servidora.
O acórdão impugnado nos recursos do Google, do Yahoo e da Microsoft assentou que há “prevalência do direito à imagem, à personalidade e ao esquecimento, com vista a evitar o exercício da livre circulação de fatos noticiosos por tempo imoderado”.
A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, reconheceu que o acórdão recorrido teria aplicado o direito ao esquecimento de forma indiscriminada e em contrariedade à finalidade precípua do instituto, porquanto não se pretendia a exclusão do conteúdo disponibilizado por terceiros no ambiente virtual, mas a instalação de filtros para que o conteúdo não fosse apontado.
A ministra concluiu que o acórdão adotou solução parecida com a do precedente da União Europeia, mas que “não teríamos uma lei geral de proteção de dados”, diferentemente da Comunidade Europeia.
Para a ministra, a responsabilidade civil do provedor estaria disciplinada no Marco Civil da Internet, de modo que, ao indexar o conteúdo disponibilizado, não poderia ser chamado a responder tampouco a exercer a função de censor privado, impedindo o acesso do público em geral a conjunto de dados mantidos no meio virtual. O voto da relatora foi seguido pelo ministro Cueva.
Proteção de dados pessoais
A tese que prevaleceu no julgamento foi a do ministro Marco Aurélio Bellizze. Divergindo da relatora, Bellizze considerou que as regras positivadas no território nacional não são tão distintas daquelas em que se apoiou a Corte europeia para normatizar a incidência da Diretiva de proteção de dados aos aplicativos de busca, reconhecendo se referir a tratamento de dados a organização dos resultados exibidos.
O ministro apresentou à turma voto no qual explica o funcionamento dos sites de busca, que formam uma espécie de índice do conteúdo disponível na internet, qualquer que seja esse conteúdo.
“Essa sistemática de busca, na essência, é a mesma para qualquer buscador, variando de acordo com os algoritmos próprios para a atribuição de importância a fim de ordenar as respostas apresentadas. Assim, no intuito de agregar velocidade ao sistema de pesquisas e reduzir o tempo de resposta, alcançando resultados mais relevantes e úteis aos usuários, a base de dados trabalha num crescente, sempre adicionando novos resultados e novos conteúdos.”
Assim, apontou o ministro, não se pode afirmar que os resultados um dia existentes serão necessariamente excluídos.
Via conciliadora
Para o ministro, a análise contextualizada e individualizada do caso – “o fato referido já conta com mais de uma década, e ainda hoje os resultados de busca apontam como mais relevantes as notícias a ele relacionadas, como se, ao longo desta década, não houvesse nenhum desdobramento da notícia, nem fatos novos relacionados ao nome da recorrida” – leva ao entendimento de que a insurgência é restrita ao apontamento de seu nome como critério exclusivo, desvinculado de qualquer outro termo, e a exibição de fato desabonador divulgado há mais de dez anos entre as notícias mais relevantes.
“A manutenção desses resultados acaba por se retroalimentar, uma vez que, ao realizar a busca pelo nome da recorrida e se deparar com a notícia, o cliente acessará o conteúdo – até movido por curiosidade despertada em razão da exibição do link – reforçando, no sistema automatizado, a confirmação da relevância da página catalogada.”
Considerando imprescindível a atuação do Judiciário, Bellizze afirmou:
“Essa é a essência do direito ao esquecimento: não se trata de efetivamente apagar o passado, mas de permitir que a pessoa envolvida siga sua vida com razoável anonimato, não sendo o fato desabonador corriqueiramente rememorado e perenizado por sistemas automatizados de busca.
Por outro vértice, aqueles que quiserem ter acesso a informações relativas a fraudes em concurso público, não terão seu direito de acesso impedido, porquanto as fontes que mencionam inclusive o nome da recorrida permanecerão acessíveis. Contudo, sua busca deverá conter critérios relativos a esse conteúdo, seja em conjunto com o nome da recorrida, seja de forma autônoma.”
Segundo Bellizze, a manutenção do acórdão recorrido caracteriza uma via conciliadora do livre acesso à informação e do legítimo interesse individual, porque não serão excluídos da busca referências ao nome da recorrida, nem serão ocultados definitivamente os resultados advindos de uma busca que faça referência a seu nome em conjunto com termos que remetam ao resultado hoje exibido.
“O que se evitará é, tão somente, que uma busca direcionada a informações sobre a sua pessoa, por meio da inclusão de seu nome como critério exclusivo de busca, tenha por resultado a indicação do fato desabonador noticiado há uma década, impedindo a superação daquele momento.”
Por fim, assentou S. Exa. que a providência judicialmente deferida é materialmente possível, tanto que realizada pelos provedores de busca no território europeu. O ministro deu parcial provimento aos recursos apenas para reduzir as astreintes. Acompanharam o entendimento do presidente da turma os ministros Moura Ribeiro e Paulo de Tarso Sanseverino.
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Processo: REsp 1.660.168
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