Comentários à lei 12.850/2015 (Lei do Crime Organizado)

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Por Fabio Rodrigues de Carvalho

Fonte: SQI no Direito

EI 12.850/2013 (LEI DO CRIME ORGANIZADO)**

INTRODUÇÃO

A Lei 12.850/2013 dispõe sobre o crime organizado. O tema era tratado pela Lei 9.034/95, que foi inteiramente revogada pelo novo diploma.

De maneira específica, a Lei 12.850/20123 versa sobre:

1- Define o que seja organização criminosa;

2- Dispõe sobre a investigação criminal, os meios de prova e o procedimento criminal no caso de delitos
praticados por organização criminosa;

3- Altera os arts. 288 e 342 do Código Penal;

4- Revoga a Lei 9.034/95.

ÂMBITO DE APLICAÇÃO DA LEI

A Lei 12.850/2013 traz regras sobre investigação criminal, prova e procedimento aplicáveis às:

1- Infrações penais praticadas por organização criminosa (art. 1º, § 1º);

2- Infrações penais previstas em tratado ou convenção internacional quando, iniciada a execução no País,
o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente;

3- Organizações terroristas internacionais, reconhecidas segundo as normas de direito internacional, por foro do qual o Brasil faça parte, cujos atos de suporte ao terrorismo, bem como os atos preparatórios ou de execução de atos terroristas, ocorram ou possam ocorrer em território nacional.

ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA

Conceito

A Lei 12.850/2013 traz, em seu art. 1º, § 1º, uma definição de organização criminosa:

§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

A Lei 9.034/95 previa meios de prova e procedimentos investigatórios para ilícitos praticados por quadrilhas, organizações criminosas e associações criminosas.

Ocorre que a Lei 9.034/95 não conceituava o que seria organização criminosa. A Lei 12.850/2013 corrige esta lacuna.

O conceito fornecido pela Lei 12.850/2013 é muito parecido com a definição de organização criminosa trazida na Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional – Convenção de Palermo, ratificada pelo Brasil por meio do Decreto 5.015/2004, com a diferença de que, neste documento internacional, exige-se o número mínimo de 3 pessoas.

Artigo 2. Para efeitos da presente Convenção, entende-se por:

a) ‘Grupo criminoso organizado’ – grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material.

Características

Opinião: Juiz Federal José Paulo Baltazar Júnior– afirma que existem características essenciais (sempre presentes) e outras que seriam acidentais, ou seja, que poderiam ou não estar identificadas, a depender do modelo de organização criminosa.

CARACTERÍSTICAS REFERÊNCIAS PRESENTES NA REDAÇÃO DA LEI 12.850/2013

a) Pluralidade de agentes “4 (quatro) ou mais pessoas”

b) Estabilidade ou permanência “associação” / “mediante a prática de infrações penais”

c) Organização “estruturalmente ordenada”

d) Divisão de tarefas “caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente”

e) Finalidade de lucro ou de outras vantagens não econômicas “com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais”

f) Restrito a infrações penais abstratamente mais graves ou de caráter transnacional “infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.”

Tradicionalmente, afirma-se que a organização criminosa possui como uma de suas características a finalidade lucrativa.

Obs: A Lei n. 12.850/2013 foi além e afirmou que a organização criminosa pode ser caracterizada mesmo que a prática dos crimes não tenha por finalidade o lucro.

Outras finalidades que não apenas econômicas:

1-sexuais;
2-segregacionistas;
3- religiosas;
4- políticas, entre outras.

Transnacionalidade

A transnacionalidade NÃO É uma característica essencial do crime organizado no Brasil.

Nem toda organização criminosa se dedica a crimes transnacionais, sendo esta uma característica acidental.

Colegiado

Conceito de organização criminosa previsto na Lei 12.694/2012 Foi editada, em 2012, a Lei 12.694/2012, que previu a possibilidade de ser instaurado um colegiado de três juízes para a prática de atos nos processos envolvendo organizações criminosas.

Em seu art. 2º, a Lei 12.694/2012 trouxe uma definição de organização criminosa, nos seguintes termos:

Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais
pessoas
, estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional.

Obs: Diante disso, o art. 2º da lei 12.694/2012 foi revogado pela Lei nº 12.850/2013.

INVESTIGAÇÃO E MEIOS DE OBTENÇÃO DA PROVA

A Lei 12.850/2013 traz, em seu art. 3º, um rol de meios de obtenção de prova que podem ser utilizados para a investigação de infrações penais relacionadas com organizações criminosas.

Meios de obtenção é diferente de meios de prova

Meios de obtenção da prova, também chamados de meios de investigação da prova, são procedimentos de investigação, regulados por lei, e que tem a finalidade de conseguir reunir provas materiais para elucidar um crime (LIMA, Renato Brasileiro de. Curso de Processo Penal. Niterói: Impetus, 2013, p. 562).

Momento em que podem ser produzidos

Os meios de obtenção da prova previstos na Lei 12.850/2013 podem ser produzidos em qualquer fase da
persecução penal, ou seja, na fase de investigação pré-processual (inquérito policial ou investigação realizada pelo MP) ou, então, quando o processo penal já estiver em curso (após a ação penal ter sido proposta).

Rol exemplificativo

O rol de meios de obtenção da prova previstos no art. 3º da Lei 12.850/2013 é exemplificativo, o que significa que poderão ser utilizadas outras medidas aí não elencadas, mas previstas no CPP ou em leis esparsas.

Exemplo: É o caso, por exemplo, da busca e apreensão (art. 240 do CPP).

Técnicas especiais de investigação

Por que a Lei prevê meios de investigação diferenciados para as infrações penais relacionadas com organizações criminosas?

O combate ao crime organizado é um grande desafio não apenas para as autoridades brasileiras como também para a dos demais países do mundo, considerando que as grandes organizações criminosas possuem muitos recursos financeiros e apresentam como característicasestrutura empresarial, aparato tecnológico, mobilidade de seus agentes, uso de violência, relações de rede com outras organizações, além de, não raras vezes, conseguirem a cooptação de servidores públicos.

Tais características demonstram o poderio econômico, político e funcional dessas organizações, o que faz
com que os métodos tradicionais de investigação sejam ineficazes.

Relação dos meios de obtenção de prova

Os meios de obtenção de prova previstos no art. 3º da Lei 12.850/2013 são os seguintes:

I – colaboração premiada;
II – captação ambiental de sinais eletromagnéticos, ópticos ou acústicos;
III – ação controlada;
IV – acesso a registros telefônicos e telemáticos, a dados cadastrais e a informações eleitorais ou
comerciais;
V – interceptação telefônica e telemática;
VI – afastamento dos sigilos financeiro, bancário e fiscal;
VII – infiltração policial, por policiais;
VIII – cooperação entre instituições e órgãos públicos.

COLABORAÇÃO PREMIADA (arts. 4º a 7º)=

Normalmente, encontramos na doutrina e jurisprudência, a terminologia “delação premiada”. A Lei 12.850/2013, no entanto, utilizou a expressão “colaboração premiada”.

Existe alguma diferença?

SIM. Para parcela da doutrina, a nomenclatura colaboração premiada é mais ampla, devendo ser considerada como um gênero, do qual uma das suas espécies é a delação premiada.

A delação premiada ocorre quando o investigado ou acusado colabora com as autoridades delatando os comparsas, ou seja, apontando as outras pessoas que também praticaram as infrações penais.

COLABORAÇÃO PREMIADA

É um mecanismo previsto na legislação por meio do qual o investigado ou acusado de uma infração penal colabora, efetiva e voluntariamente, com a investigação e com o processo, recebendo, em contrapartida, benefícios penais.

DELAÇÃO PREMIADA

Ocorre quando o investigado ou acusado decide colaborar com as autoridades delatando os comparsas, ou seja, apontando as outras pessoas que também praticaram as infrações penais.

Posição majoritária– contudo, e a meu ver, mais razoável, é aquela que defende que, em uma ponderação de interesses, a delação premiada é medida indispensável ao combate da criminalidade organizada, sendo, portanto, legítima já que não viola nenhum direito ou garantia fundamental.

Veja a opinião de Nucci:

“(…) parece-nos que a delação premiada é um mal necessário, pois o bem maior a ser tutelado é o Estado Democrático de Direito. Não é preciso ressaltar que o crime organizado tem ampla penetração nas entranhas estatais e possui condições de desestabilizar qualquer democracia, sem que se possa combate-lo, com eficiência, desprezando-se a colaboração daqueles que conhecem o esquema e dispõem-se a denunciar co-autores e partícipes. (NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e execução penal. São Paulo: RT, 2008, p. 418).

Ademais, se o Estado não pudesse contar (e incentivar) a delação por parte dos comparsas, dificilmente seria possível desmantelar organizações criminosas poderosas, com estrutura hierarquizada de poder, nas quais o chefe da ORCRIM raramente pratica os atos criminosos pessoalmente, valendo-se sempre de interpostas pessoas e ordens reservadas.

Se um integrante da organização for preso e o Poder Público não tiver autorização para incentivar a delação dos demais membros, o grupo criminoso estará sempre se
renovando, além do que somente serão punidos os componentes de baixo escalão do crime organizado.

A história revela que o instituto da delação premiada foi imprescindível para que a Itália conseguisse punir alguns integrantes do grupo mafioso siciliano conhecido como “Cosa Nostra” na chamada “Operação Mãos Limpas”. Um dos mafiosos, Tommaso Buscetta, após ser preso, celebrou acordo com o Procuratore Della Repubblica Giovanni Falcone, aceitando delatar seus comparsas e revelar toda a estrutura e os planos da organização criminosa.

Previsões em outras leis

A colaboração premiada é prevista em diversos outros dispositivos legais. Confira:

1-Código Penal (arts. 15, 16, 65, III, 159, § 4º);
2- Crimes contra o Sistema Financeiro – Lei 7.492/86 (art. 25, § 2º);
3- Crimes contra a Ordem Tributária – Lei 8.137/90 (art. 16, parágrafo único);
4- Lei dos Crimes Hediondos – Lei 8.072/90 (art. 8º, parágrafo único);
5- Convenção de Palermo – Decreto 5.015/2004 (art. 26);
6- Lei de Lavagem de Dinheiro – Lei 9.613/98 (art. 1º, § 5º);
7- Lei de Proteção às Testemunhas – Lei 9.807/99 (arts. 13 a 15);
8- Lei de Drogas – Lei 11.343/2006 (art. 41);
9- Lei Antitruste – Lei 12.529/2011 (art. 87, parágrafo único).

Conceito e natureza jurídica

  • Colaboração premiada é um instituto previsto na legislação por meio do qual…
  • um investigado ou acusado da prática de infração penal
  • decide confessar a prática do delito
  • e, além disso, aceita colaborar com a investigação ou com o processo
  • fornecendo informações que irão ajudar,
  • de forma efetiva,
  • na obtenção de provas contra os demais autores dos delitos e contra a organização criminosa,
  • na prevenção de novos crimes,
  • na recuperação do produto ou proveito dos crimes ou
  • na localização da vítima com integridade física preservada,
  • recebendo o colaborador, em contrapartida, determinados benefícios penais (ex: redução de sua pena).

A colaboração premiada possui natureza jurídica de “meio de obtenção de prova” (art. 3º, I, da Lei nº 12.850/2013). Chamo atenção para esse fato: a colaboração premiada não é um meio de prova propriamente dito. A colaboração premiada não prova nada (ela não é uma prova). A colaboração premiada é um meio, uma técnica, um instrumento para se obter as provas.

“Enquanto os meios de prova são aptos a servir, diretamente, ao convencimento do juiz sobre a veracidade ou não de uma afirmação fática (p. ex., o depoimento de uma testemunha, ou o teor de uma escritura pública), os meios de obtenção de provas (p. ex.: uma busca e apreensão) são instrumentos para a colheita de elementos ou fontes de provas, estes sim, aptos a convencer o julgador (p. ex.: um extrato bancário [documento] encontrado em uma busca e apreensão domiciliar). Ou seja, enquanto o meio de prova se presta ao convencimento direto do julgador, os meios de obtenção de provas somente indiretamente, e dependendo do resultado de sua realização, poderão servir à reconstrução da história dos fatos” (BADARÓ, Gustavo. Processo Penal. Rio de Janeiro. Campus: Elsevier. 2012, p. 270).

Colaboração premiada na Lei nº 12.850/2013

O instituto, no entanto, foi tratado com maior riqueza de detalhes pela Lei nº 12.850/2013 (Lei do Crime Organizado), em seus arts. 4º a 7º. Este é, atualmente, o diploma que rege, de forma geral, a colaboração premiada em nosso país, razão pela qual a explicação abaixo será feita com base nesta Lei.

Normalmente, encontramos na doutrina e jurisprudência, a terminologia “delação premiada”.

Exemplo de colaboração premiada que não é delação premiada

Exemplo: o autor confessa a prática do crime e não delata nenhum comparsa. No entanto, ele fornece todas as informações necessárias para que as autoridades recuperem o dinheiro desviado com o esquema criminoso e que se encontrava em contas bancárias no exterior.

Obs: toda delação premiada é uma forma de colaboração premiada, mas nem sempre a colaboração premiada será feita por meio de uma delação premiada.

Formas de colaboração premiada (resultados que devem ser alcançados)

A Lei 12.850/2013 prevê, em seu art. 4º, cinco formas por meio das quais o investigado/réu poderá colaborar com a investigação e com o processo.

Assim, para ter direito aos benefícios decorrentes da colaboração, o indivíduo deverá fornecer informações efetivas com as quais as autoridades consigam pelo menos um dos seguintes resultados:

1) Identificar os demais coautores e partícipes da organização criminosa e as infrações penais por eles praticadas.

2) Revelar a estrutura hierárquica e a divisão de tarefas da organização criminosa.

3) Prevenir as infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa.

4) Recuperar total ou parcialmente o produto ou o proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa.

5) Localizar o paradeiro da vítima com a sua integridade física preservada.

Obs: basta que um desses cinco objetivos seja atingido para que o colaborador tenha direito ao benefício.

Colaboração voluntária e efetiva

A colaboração deve ser voluntária, ou seja, o colaborador não pode ter sido coagido.

Vale ressaltar que a colaboração é considerada voluntária mesmo que a proposta não tenha partido do investigado/acusado (espontaneidade).

Isso porque não se exige que a colaboração seja espontânea, ou seja, que tenha partido do colaborador a ideia, a iniciativa. Basta que seja voluntária (que ele aceite livremente). Assim, se a polícia ou o MP propõem o acordo e este é aceito livremente pelo colaborador, esta colaboração é tida como voluntária.

A colaboração deve ser efetiva, isto é, somente será concedido o benefício se, com as informações fornecidas pelo colaborador, for obtido um dos resultados previstos nos incisos do art. 4º da Lei.

Não se exige que o colaborador demonstre arrependimento. Sendo uma colaboração voluntária e efetiva, a concessão do benefício é devida ainda que o investigado/acusado não tenha sentimentos altruístas.

Momento

A colaboração premiada e a concessão dos benefícios dela decorrentes podem ocorrer em três momentos:
1) Na fase de investigação criminal (inquérito policial ou investigação conduzida pelo MP);
2) Durante o curso do processo penal (ainda que já em instância recursal);
3) Após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Benefícios

Poderão ser concedidos ao colaborador os seguintes benefícios (prêmios):

1) Não oferecimento da denúncia

Se o acordo de colaboração for firmado ainda na fase de investigação, sendo ele homologado pelo juiz, o Ministério Público poderá deixar de oferecer a denúncia contra o colaborador.

Trata-se de uma exceção ao princípio da obrigatoriedade, segundo o qual, havendo justa causa, o MP é obrigado a oferecer a denúncia.

Para que o MP deixe de oferecer a denúncia contra o colaborador é necessário o preenchimento dos seguintes requisitos:

a) A colaboração deve ser efetiva e voluntária;
b) O colaborador não pode ser o líder da organização criminosac) O colaborador deve ter sido o primeiro a prestar efetiva colaboração.

Perdão judicial

Se a colaboração prestada for muito relevante, o Ministério Público ou o Delegado de Polícia poderão se manifestar pedindo que o juiz conceda perdão judicial ao colaborador, o que acarreta a extinção da punibilidade (art. 107, IX, do CP).

Veja a redação do art. 4º, § 2º da Lei nº 12.850/2013:

§ 2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).

Redução da pena

Outro benefício previsto ao colaborador é a redução da pena que lhe for imposta.

• Se a colaboração ocorrer antes da sentença, ou seja, se a pessoa decidir colaborar antes de ser julgada: sua pena poderá ser reduzida em até 2/3.

• Se a colaboração ocorrer após a sentença, ou seja, se a pessoa decidir colaborar apenas depois de ser condenada: sua pena poderá ser reduzida em até metade (1/2).

Substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos

O juiz poderá substituir a pena privativa de liberdade do colaborador por pena restritiva de direitos mesmo que não estejam presentes os requisitos do art. 44 do CP.

Progressão de regime

Para que ocorra a progressão de regime, o réu deverá ter cumprido determinado tempo de pena. A isso chamamos de requisito objetivo da progressão.
Para crimes comuns: o requisito objetivo consiste no cumprimento de 1/6 da pena aplicada.

Para crimes hediondos ou equiparados, o requisito objetivo representa o cumprimento de:
• 2/5 da pena se for primário. • 3/5 da pena se for reincidente.

Obs: Se o réu já estiver condenado e cumprindo pena e decidir colaborar, ele poderá receber como “prêmio” a progressão de regime ainda que não tenha atingido o requisito objetivo (§ 5º do art. 4º).

Direito Subjetivo

O STF entende que, caso a colaboração seja efetiva e produza os resultados almejados, o colaborador tem direito subjetivo à aplicação das sanções premiais estabelecidas no acordo, inclusive de natureza patrimonial (HC 127483/PR).

Critérios utilizados para a escolha do benefício

A Lei aponta os seguintes critérios para que o juiz escolha quais benefícios serão aplicados ao colaborador (§ 1º do art. 4º):

a) Personalidade do colaborador; b) Natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso;
c) Eficácia da colaboração.

Direitos do colaborador

O art. 5º da Lei 12.850/2013 prevê os seguintes direitos ao colaborador:

I – usufruir das medidas de proteção previstas na legislação específica (Lei nº 9.807/99);

II – ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados;

III – ser conduzido, em juízo, separadamente dos demais coautores e partícipes;

IV – participar das audiências sem contato visual com os outros acusados;

V – não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito;

VI – cumprir pena em estabelecimento penal diverso dos demais corréus ou condenados.

Procedimento até a assinatura do acordo de colaboração

1- Negociação do acordo

O investigado (ou acusado), assistido por advogado, negocia o acordo de colaboração premiada com o Delegado de Polícia ou com o Ministério Público.

O juiz não participará, em hipótese alguma, das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração (§ 6º do art. 4º).

Caso o magistrado interagisse nas negociações, haveria uma grave violação do sistema acusatório e um seríssimo risco de contaminação da sua imparcialidade, considerando que as informações enunciadas pelo eventual colaborador iriam incutir no julgador preconcepções sobre o próprio delator e seus comparsas. Se as negociações não culminassem com um acordo, a opinião do julgador a respeito do investigado/denunciado já estaria construída em seu psicológico considerando que teria ouvido confissões sobre os fatos criminosos.
Ademais, a simples presença do juiz da causa na tentativa de acordo poderia exercer uma indevida coerção velada para que o investigado/acusado aceitasse eventual proposta, o que contraria a natureza do instituto já que a colaboração deve ser voluntária.

2- Formalização do acordo e envio à Justiça

Caso as negociações tenham êxito, as declarações do colaborador serão registradas (em meio escrito ou audiovisual) e será elaborado um termo de acordo de colaboração premiada, a ser assinado por todas as partes e, então, remetido ao juiz para homologação.

O Delegado de Polícia pode negociar e assinar acordo de colaboração premiada com o colaborador (assistido por seu defensor), enviando depois esse termo para ser homologado pelo juiz? A autoridade policial tem legitimidade para celebrar o acordo de colaboração premiada?

Redação literal da Lei 12.850/2013: SIM

A redação da Lei nº 12.850/2013 dá a entender que, se fosse feito durante o inquérito policial, o acordo de colaboração premiada poderia ser celebrado entre o Delegado de Polícia e o investigado, ou seja, a autoridade policial teria legitimidade para celebrar acordo de colaboração premiada, bastando que houvesse uma manifestação (parecer) do MP. Veja:

Art. 4º (…)
§ 2º Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal). (…) § 6º O juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor.

Posição da doutrina majoritária: NÃO

A doutrina majoritária sustenta que a legitimidade para celebrar o acordo de colaboração premiada é exclusiva do Ministério Público. O Delegado de Polícia até poderia sugerir o acordo, mas quem decide sobre a sua celebração e condições seria o membro do MP. Os argumentos, em síntese, para essa conclusão são os seguintes:

a) O acordo precisará ser homologado pelo magistrado e o Delegado de Polícia não teria capacidade postulatória para peticionar em juízo pedindo a homologação;

b) A CF/88, em seu art. 129, I, conferiu ao MP, a titularidade da ação penal pública e, com isso, também garantiu a esse órgão a decisão sobre a viabilidade ou não da persecução penal. Alguns benefícios (prêmios) previstos ao colaborador implicam o não-exercício da ação penal (como o não-oferecimento de denúncia), decisão essa que só poderia ser tomada pelo MP, já que ele é o titular da ação penal.

“(…) por mais que a autoridade policial possa sugerir ao investigado a possibilidade de celebração do acordo de colaboração premiada, daí não se pode concluir que o Delegado de Polícia tenha legitimação ativa para firmar tais acordos com uma simples manifestação do Ministério Público. (…) Por consequência, se a autoridade policial é desprovida de capacidade postulatória e legitimação ativa, não se pode admitir que um acordo por ela celebrado com o acusado venha a impedir o regular exercício da ação penal pública pelo Ministério Público, sob pena de se admitir que um dispositivo inserido na legislação ordinária possa se sobrepor ao disposto no art. 129, I, da Constituição Federal.” (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 554-555).

Requisitos formais do acordo

Segundo o art. 6º, o termo de acordo da colaboração premiada deverá ser feito por escrito e conter os seguintes requisitos formais:

I – o relato da colaboração e seus possíveis resultados;
II – as condições da proposta do Ministério Público ou do delegado de polícia;
III – a declaração de aceitação do colaborador e de seu defensor;
IV – as assinaturas do representante do Ministério Público ou do delegado de polícia, do colaborador e de seu defensor;
V – a especificação das medidas de proteção ao colaborador e à sua família, quando necessário.

Na proposta encaminhada ao Judiciário já deverá ser especificado o benefício que deverá ser concedido ao colaborador (ex: redução de 2/3 da pena).

Deve-se esclarecer, contudo, que o magistrado não está vinculado aos termos da proposta, podendo adequá-la ao caso concreto (§ 8º do art. 4º).

O pedido de homologação do acordo é autuado como processo sigiloso

O pedido de homologação do acordo será sigilosamente distribuído, contendo apenas informações que não possam identificar o colaborador e o seu objeto.

As informações pormenorizadas da colaboração serão dirigidas diretamente ao juiz a que recair a distribuição, que decidirá no prazo de 48 horas.

Obs: se já houver um juízo que estiver funcionando no caso (ex: tiver deferido interceptação telefônica, recebido a ação penal etc.), este será o competente para apreciar o acordo, sendo distribuído a ele por prevenção.

O acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao Delegado de Polícia, como forma de garantir o êxito das investigações, assegurando-se ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento.

O acordo de colaboração premiada deixa de ser sigiloso assim que recebida a denúncia (§ 3º do art. 7º).

Análise da homologação pelo juiz

As negociações do acordo de colaboração premiada ocorrem em âmbito extrajudicial, sendo vedada, como vimos, a participação do magistrado.

Ocorre que, após celebrado, o pacto somente terá eficácia processual se for homologado pelo juiz.

Na análise da homologação do acordo, o juiz deverá examinar os seguintes aspectos:

a) Regularidade: se os aspectos formais e procedimentais foram atendidos;
b) Legalidade: se a pactuação celebrada ofende algum dispositivo legal;
c) Voluntariedade: se o investigado/acusado não foi coagido a assinar o acordo.

Art. 4º (…) § 8º O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto.

Ausência de juízo de valor

“A homologação não representa juízo de valor sobre as declarações eventualmente já prestadas pelo colaborador à autoridade judicial ou ao Ministério Público.” (Min. Dias Toffoli, no HC 127483/PR). Isso significa que, quando o juiz homologa o acordo de colaboração premiada, não significa que esteja concordando ou afirmando que as declarações prestadas pelo colaborador são verdadeiras.

Tais declarações ainda serão objeto de apuração.

Audiência sigilosa para confirmar a voluntariedade do acordo

Se houver dúvida do juiz acerca da voluntariedade do acordo, ou seja, se houver suspeita de que tenha havido coação para que a pessoa colaborasse, o juiz poderá designar uma audiência sigilosa para ouvir o colaborador, que deverá estar acompanhado de seu defensor.
O Ministério Público não será intimado e não participará desta audiência.

Recusa à homologação

O juiz poderá recusar homologação à proposta que não atender aos requisitos legais, ou adequá-la ao caso concreto.

Na análise da homologação, o juiz deverá se ater ao exame da regularidade, legalidade e voluntariedade do acordo. Assim, não pode o magistrado imiscuir-se em questões de discricionariedade investigatória ou fazer incursões sobre a conveniência e oportunidade da colaboração premiada.

Esta não é sua competência.

Recurso contra a decisão do juiz que recusa a homologação do acordo: a lei não prevê.

Diante desse silêncio, a doutrina afirma que cabe, por analogia, recurso em sentido estrito (art. 581, I, do CPP). Nesse sentido: Pacelli.

O que acontece após ser homologado o acordo

• Se as declarações do investigado/acusado já forem suficientes para se obter um dos resultados previstos nos incisos do art. 4º: aplica-se a ele o benefício penal. • Se, além das declarações do investigado/acusado, for necessária a realização de medidas de colaboração: o prazo para oferecimento da denúncia ou o processo (caso já exista ação penal) ficarão suspensos por até 6 meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam cumpridas as medidas, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional.

Veja o que diz a Lei:

Art. 4º (…)
§ 3º O prazo para oferecimento de denúncia ou o processo, relativos ao colaborador, poderá ser suspenso por até 6 (seis) meses, prorrogáveis por igual período, até que sejam cumpridas as medidas de colaboração, suspendendo-se o respectivo prazo prescricional.

O acordo de colaboração premiada é um “negócio jurídico processual personalíssimo, que não pode ser impugnado por terceiros, ainda que venham a ser mencionados.” O que poderá atingir eventual corréu delatado são as imputações posteriores, constantes do depoimento do colaborador. (Min. Dias Toffoli, no HC 127483/PR).

Oitiva do colaborador

Depois de homologado o acordo, o colaborador poderá, sempre acompanhado pelo seu defensor, ser ouvido pelo membro do Ministério Público ou pelo Delegado de Polícia responsável pelas investigações.

Ainda que beneficiado por perdão judicial ou não denunciado, o colaborador poderá ser ouvido em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial.

Sempre que possível, o registro dos atos de colaboração será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações.

Se após as diligências for constatada a relevância da colaboração prestada

Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o Delegado de Polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador.
Caso o juiz discorde, ele poderá invocar o procedimento previsto no art. 28 do CPP remetendo a manifestação do Promotor de Justiça ao Procurador Geral de Justiça (ou no caso de Procurador da República, encaminhando a circunstância à Câmara de Coordenação e Revisão do MPF).

Retratação da proposta

Mesmo após a proposta ter sido aceita, alguma das partes pode voltar atrás e se retratar?
SIM. Segundo o § 10 do art. 4º, as partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor.

Renúncia ao direito ao silêncio e compromisso de dizer a verdade

Nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso legal de dizer a verdade (§ 14 do art. 4º).

Colaborador deverá ser sempre assistido por advogado

Em todos os atos de negociação, confirmação e execução da colaboração, o colaborador deverá estar assistido por defensor (§ 15 do art. 4º).

Valor probatório da colaboração: declarações do colaborador devem ser corroboradas com outras provas

Segundo o § 16 do art. 4º da Lei, nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador.

Assim, as declarações do colaborador deverão ser corroboradas por outros elementos de prova.
Em verdade, mesmo que não houvesse tal previsão, é certo que, para a jurisprudência, a simples delação do corréu não é suficiente para uma condenação.

“Daí a importância daquilo que a doutrina chama de regra da corroboração, ou seja, que o colaborador traga elementos de informação e de prova capazes de confirmar suas declarações (v.g., indicação do produto do crime, de contas bancárias, localização do produto direto ou indireto da infração penal, auxílio para identificação de números de telefone a serem grampeados ou na realização de interceptação ambiental etc.).” (LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 545).

STF

Natureza da colaboração premiada

O acordo de colaboração premiada é um negócio jurídico processual personalíssimo que tem como objeto a contribuição do imputado para a conclusão dos trabalhos do juízo ou do tribunal. Apenas se a colaboração for exitosa e possibilitar a coleta de provas idôneas é que se produzirá efeitos jurídicos em favor do delator.
A colaboração premiada é apenas meio de obtenção de prova, ou seja, é um instrumento para colheita de documentos que, segundo o resultado de sua obtenção, poderão formar meio de prova.

obs:A colaboração premiada não se constitui em meio de prova propriamente dito.

Acordo de colaboração não se confunde com o depoimento do colaborador

O acordo de colaboração não se confunde com os depoimentos prestados pelo colaborador com o objetivo de fundamentar as imputações a terceiros. Uma coisa é o acordo, outra é o depoimento prestado pelo colaborador e que será ainda valorado a partir da análise das provas produzidas no processo.

O acordo não é meio de prova. O depoimento do colaborador é meio de prova que, no entanto, somente se mostra hábil à formação do convencimento judicial se vier a ser corroborado por outros meios idôneos de prova. Por essa razão, o art. 4º, § 16 da Lei nº 12.850/2013 dispõe que nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento exclusivo nas declarações do agente colaborador.

Natureza da decisão que homologa o acordo

O ato homologatório de delação premiada é simples fator de eficácia do acordo, limitando-se à pronúncia sobre sua regularidade, legalidade e voluntariedade.

A homologação não representa juízo de valor sobre as declarações eventualmente já prestadas pelo colaborador à autoridade judicial ou ao Ministério Público.
Homologar o acordo não significa dizer que o juiz admitiu como verídicas ou idôneas as informações prestadas pelo colaborador.

Impossibilidade de o acordo ser impugnado por terceiros

O STF entendeu que o acordo não pode ser impugnado por terceiro, mesmo que seja uma pessoa citada na delação. Assim, eventual coautor ou partícipe dos crimes praticados pelo colaborador não pode impugnar o acordo de colaboração.

Isso porque o acordo é personalíssimo e, por si só, não vincula o delatado nem afeta diretamente sua situação jurídica. O que poderá atingir eventual corréu delatado são as imputações posteriores, constantes do depoimento do colaborador.

Negar ao delatado a possibilidade de impugnar acordo de colaboração premiada assinado por outro acusado não significa negar-lhe direito ao contraditório, pois a lei estabelece que nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador.

O que deve ser assegurado ao delatado é o direito de defesa e de contraditar as informações do acordo, inclusive com a possibilidade de efetuar perguntas ao colaborador.

Personalidade do colaborador

A personalidade do colaborador ou o fato de ele já ter descumprido um acordo anterior de colaboração premiada não têm o condão de invalidar o acordo atual.
Não importa a idoneidade do colaborador, mas sim a idoneidade das informações que ele fornecer e isso ainda será apurado no decorrer do processo. Os delatores são pessoas envolvidas em delitos, tanto que também estão sendo acusados. Assim, em regra, são indivíduos que não têm bons antecedentes criminais e apresentam personalidade desajustada ao convívio social. Dessa forma, se a colaboração processual estivesse subordinada à boa personalidade do colaborador, o instituto teria poucos efeitos práticos e quase nenhum acordo seria aceito.

Segundo a Lei nº 12.850/2013, a personalidade do colaborador irá influenciar apenas na escolha do benefício que será concedido a ele (art. 4º, § 1º), mas não interfere na validade do acordo de colaboração.
O que importa não é a “confiança” do poder público no agente colaborador. O que interessa é a análise da idoneidade e utilidade das informações prestadas por ele, o que será aferido apenas posteriormente, no curso do processo.

Atuação retardada da autoridade responsável

Se a autoridade (seja ela policial ou administrativa) constatar que existe uma infração penal em curso, ela deverá tomar as providências necessárias para que esta prática cesse imediatamente, devendo até mesmo realizar a prisão da pessoa que se encontre em flagrante delito.
A experiência demonstrou, contudo, que, em algumas oportunidades, é mais interessante, sob o ponto de vista da investigação, que a autoridade aguarde um pouco antes de intervir imediatamente e prender o agente que está praticando o ilícito. Isso ocorre porque em determinados casos se a autoridade esperar um pouco mais, retardando o flagrante, poderá descobrir outras pessoas envolvidas na prática da infração penal, reunir provas mais robustas, conseguir recuperar o produto ou proveito do crime, enfim obter maiores vantagens para a persecução penal.

Ação controlada

  • uma técnica especial de investigação
  • por meio da qual a autoridade policial ou administrativa (ex: Receita Federal, corregedorias),
  • mesmo percebendo que existem indícios da prática de um ato ilícito em curso,
  • retarda (atrasa, adia, posterga) a intervenção neste crime para um momento posterior,
  • com o objetivo de conseguir coletar mais provas,
  • descobrir coautores e partícipes da empreitada criminosa,
  • recuperar o produto ou proveito da infração ou
  • resgatar, com segurança, eventuais vítimas.

Obs:A ação controlada é também denominada de “flagrante prorrogado, retardado ou diferido”.

“entrega vigiada”

Trata-se de uma forma de “ação controlada”, prevista na Convenção de Palermo (Decreto 5.015/2004), por meio da qual as autoridades policiais ou administrativas permitem que “remessas ilícitas ou suspeitas saiam do território de um ou mais Estados, os atravessem ou neles entrem, com o conhecimento e sob o controle das suas autoridades competentes, com a finalidade de investigar infrações e identificar as pessoas envolvidas na sua prática” (art. 2º, “i”).

Previsão legislativa

A ação controlada é prevista nos seguintes dispositivos legais:

Convenção de Palermo (Decreto 5.015/2004):

Artigo 20
Técnicas especiais de investigação
1. Se os princípios fundamentais do seu ordenamento jurídico nacional o permitirem, cada Estado Parte, tendo em conta as suas possibilidades e em conformidade com as condições prescritas no seu direito interno, adotará as medidas necessárias para permitir o recurso apropriado a entregas vigiadas e, quando o considere adequado, o recurso a outras técnicas especiais de investigação, como a vigilância eletrônica ou outras formas de vigilância e as operações de infiltração, por parte das autoridades competentes no seu território, a fim de combater eficazmente a criminalidade organizada.
(…) 4. As entregas vigiadas a que se tenha decidido recorrer a nível internacional poderão incluir, com o consentimento dos Estados Partes envolvidos, métodos como a intercepção de mercadorias e a autorização de prosseguir o seu encaminhamento, sem alteração ou após subtração ou substituição da totalidade ou de parte dessas mercadorias.

Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas):

Art. 53. Em qualquer fase da persecução criminal relativa aos crimes previstos nesta Lei, são permitidos, além dos previstos em lei, mediante autorização judicial e ouvido o Ministério Público, os seguintes procedimentos investigatórios:
(…) II – a não-atuação policial sobre os portadores de drogas, seus precursores químicos ou outros produtos utilizados em sua produção, que se encontrem no território brasileiro, com a finalidade de identificar e responsabilizar maior número de integrantes de operações de tráfico e distribuição, sem prejuízo da ação penal cabível.
Parágrafo único. Na hipótese do inciso II deste artigo, a autorização será concedida desde que sejam conhecidos o itinerário provável e a identificação dos agentes do delito ou de colaboradores.

Lei nº 9.613/98 (Lei de Lavagem de Capitais):

Art. 4º-B. A ordem de prisão de pessoas ou as medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores poderão ser suspensas pelo juiz, ouvido o Ministério Público, quando a sua execução imediata puder comprometer as investigações. (Incluído pela Lei nº 12.683/2012)

Lei nº 12.850 (Lei do Crime Organizado):

Art. 8º Consiste a ação controlada em retardar a intervenção policial ou administrativa relativa à ação praticada por organização criminosa ou a ela vinculada, desde que mantida sob observação e acompanhamento para que a medida legal se concretize no momento mais eficaz à formação de provas e obtenção de informações.

Para que ocorra a ação controlada é necessária prévia autorização judicial?

A resposta irá depender do tipo de crime que está sendo investigado.

Se a ação controlada envolver crimes:

• da Lei de Drogas ou de Lavagem de Dinheiro: SIM. Será necessária prévia autorização judicial porque o art. 52, II, da Lei nº 11.343/2006 e o art. 4ºB da Lei nº 9.613/98 assim o exigem.

• praticados por organização criminosa: NÃO. Neste caso será necessário apenas que a autoridade (policial ou administrativa) avise o juiz que irá realização ação controlada. Veja o que diz o § 1º do art. 8º da Lei nº 12.850/2013:

Art. 8º (…) § 1º O retardamento da intervenção policial ou administrativa será previamente comunicado ao juiz competente que, se for o caso, estabelecerá os seus limites e comunicará ao Ministério Público.

A previsão acima é muito importante considerando que, na antiga Lei do Crime Organizado (Lei n.° 9.034/95), não se impunha uma fiscalização prévia da ação controlada por parte do Poder Judiciário, o que gerava um perigo grande de que houvesse abusos ou, pior, que existissem atos de corrupção ou leniência praticados pelas autoridades policiais e que fossem acobertados sob o argumento de que se estava diante de uma “ação controlada”.

Em outras palavras, poderia acontecer de a autoridade identificar a prática de um crime em curso e não reprimi-lo por conta de corrupção. Caso fosse descoberta e questionada sobre este fato, a autoridade alegava que estava praticando uma “ação controlada” e que iria atuar no momento certo. Isso agora não mais será possível tendo em vista que a Lei exige a comunicação prévia da ação controlada ao juiz.

A Lei nº 12.850/2013 fez bem ao dispensar a prévia autorização, exigindo tão-somente a comunicação.

Isso porque algumas vezes os fatos se desenrolam de forma muito rápida e não daria tempo para se aguardar uma decisão judicial. Logo, a comunicação prévia supre a preocupação externada no parágrafo anterior (evitar que a autoridade policial “simule” uma ação controlada) e, ao mesmo tempo, não prejudica a dinâmica das investigações. Assim, protocolizada a comunicação, a ação controlada poderá ser levada a efeito pela autoridade até que venha, se vier, uma limitação imposta pelo juiz.

Em muitas situações, não haveria sequer tempo hábil para que se aguardasse uma autorização judicial para a ação controlada eis que os fatos da vida acontecem de forma célere e a execução do delito, não raras vezes, é mais célere que o tempo necessário para o magistrado autorizar o diferimento da atuação policial.

Vale ressaltar que, se o crime de tráfico de drogas ou de lavagem de capitais estiverem sendo praticados por organização criminosa que se enquadre no conceito da Lei nº 12.850/2013, será possível que a autoridade policial invoque o art. 8º, § 1º deste diploma e faça a ação controlada valendo-se da mera comunicação prévia considerando que neste caso estará sendo investigada uma organização criminosa.

Limites à ação controlada

O § 1º do art. 8º da Lei nº 12.850/2013 afirma que, depois de o juiz ser comunicado sobre a realização da ação controlada ele poderá estabelecer limites a essa prática.

Limite de tempo – o juiz poderá estabelecer limite de tempo para a ação controlada, de forma que depois disso, a , por exemplo, a autoridade deverá obrigatoriamente intervir (24h, 2 dias, uma semana etc.).

Limitação de condutas – o magistrado poderá determinar a autoridade policial que não permita determinadas condutas que violem de forma muito intensa ou irreversível o bem jurídico. Seria o caso de o juiz alertar o Delegado: em caso de ofensa à integridade física de vítimas, a força policial deverá intervir imediatamente, evitando lesões corporais ou morte.

Apesar de o § 1º falar apenas em limites, o juiz poderá indeferir a ação controlada, determinando a imediata intervenção policial sempre que não estiverem previstos os requisitos legais ou quando a postergação não for recomendada. Ex1: se não envolver organização criminosa considerando que não estaria previsto o requisito legal. Ex2: se a polícia descobriu o cativeiro de uma vítima e há interceptação telefônica afirmando que irão matá-la a qualquer momento.

Procedimento no caso da comunicação da ação controlada (art. 8º da Lei nº 12.850/2013)

1) A autoridade policial ou administrativa comunica o juiz sobre a realização da ação controlada, demonstrando a conveniência da medida e o planejamento de atuação;

2) No setor de protocolo da Justiça, a comunicação deverá ser sigilosamente distribuída, de forma a não conter informações que possam indicar a operação a ser efetuada;

3) O juiz comunicará o Ministério Público acerca do procedimento e poderá estabelecer limites à ação controlada;

4) Até o encerramento da diligência, o acesso aos autos será restrito ao juiz, ao Ministério Público e ao delegado de polícia, como forma de garantir o êxito das investigações;

5) Ao término da diligência, a autoridade policial ou administrativa deverá elaborar um auto circunstanciado acerca da ação controlada.

Ação controlada envolvendo transposição de fronteiras

Se a ação controlada envolver transposição de fronteiras, o retardamento da intervenção policial ou administrativa somente poderá ocorrer com a cooperação das autoridades dos países que figurem como provável itinerário ou destino do investigado, de modo a reduzir os riscos de fuga e extravio do produto, objeto, instrumento ou proveito do crime (art. 9º da Lei nº 12.850/2013).



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