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A disposição que permite que a Constituição seja emendada está prevista na Seção VIII – “Do Processo Legislativo”, que, por sua vez, está no CAPÍTULO I – DO PODER LEGISLATIVO (TÍTULO IV – DA ORGANIZAÇÃO DOS PODERES). Porém, o termo “processo legislativo” não é o mais adequado para se tratar da Constituição Federal. É fato que a alteração constitucional não é verdadeiramente um processo legislativo. Não é, propriamente, por dois motivos:
Primeiro, a Constituição não é propriamente “lei”. Ela está acima das leis e, por isso, tem um processo especial de alteração. O processo de reforma constitucional é especial e mais dificultoso do que o processo de produção da lei ordinária ou mesmo da lei complementar. A especificidade vai da iniciativa, passa pelos dois turnos de discussão e votação, pelo quorum de três quintos e termina com uma promulgação pelas mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
Segundo, quem reforma a Constituição não é tecnicamente o Poder Legislativo, e sim o poder constituinte. Tudo bem que o agente do poder constituinte reformador é o Congresso Nacional, que também representa o Poder Legislativo (Federal), mas isso não retira a necessidade de diferenciarmos as duas situações. O Poder Legislativo, em sua atividade legislativa – produção de uma lei ordinária – por exemplo –, não pode alterar a Constituição. Já o poder constituinte, em sua atividade reformadora – produção de uma emenda constitucional –, pode alterar a Constituição, respeitados os limites estabelecidos.
Expresso está no texto constitucional que o poder constituinte reformador está sujeito a limites distintos daqueles fixados para o Poder Legislativo. Um dos limites distintivos das duas atividades (reforma x processo legislativo ordinário) está no artigo 60, § 1º, da Constituição Federal, que traz as limitações circunstanciais. Apenas o poder de reforma da Constituição se sujeita a tais limitações.
Vejamos o texto:
Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:
…
§ 1º A Constituição não poderá ser emendada na vigência de intervenção federal, de estado de defesa ou de estado de sítio.
Podemos dizer que as limitações circunstanciais[1] são as verdadeiras síncopes constitucionais, ou seja, estados de anormalidade, conturbação, instabilidade ou gravidade interna que impedem a alteração da Constituição pelo modo formal, ou seja, por via de aprovação de emendas constitucionais. Para nos mantermos fiéis à dicção constitucional, usaremos o termo “processo legislativo”, porém sempre destacado entre aspas.
As limitações circunstanciais impedem o “processo legislativo” de emendamento constitucional, mas não impedem o processo legislativo ordinário – elaboração das leis ordinárias. Essa diferença é marcante. Durante uma intervenção federal, não é correto dizer que o Congresso Nacional ficará paralisado, apenas as propostas de emenda à Constituição (PECs) deixarão de tramitar.
O constituinte originário entendeu que essas situações que desestabilizam a ordem constitucional também podem trazer instabilidade ao Parlamento (Congresso Nacional) e, por isso, essas circunstâncias impedem a modificação do texto constitucional[2]. Há uma presunção absoluta de que as vontades não estarão livres para se manifestar.
As alterações à Constituição que ficam proibidas são de qualquer tipo, ou seja, não se pode alterá-la para mais ou para menos. Nisso, as limitações circunstanciais se diferenciam das famosas cláusulas pétreas. As cláusulas pétreas são limitações materiais e impedem a abolição de certos temas escolhidos como essenciais pelo constituinte originário, previstos no artigo 60, § 4º, da CF. As limitações circunstanciais impedem qualquer tipo de alteração do texto constitucional.
A Constituição requer consenso. Exige pacificação social e pacificação política para sua alteração. Nas situações de crise, presume-se a falta de consenso ou presume-se a coação ou a violenta emoção[3].
Manoel Jorge e Silva Neto (2006, p. 19) entendem que:
São exigíveis a serenidade, a ponderação e o equilíbrio à atuação parlamentar quando voltada à mudança da Constituição, atributos dificilmente encontrados durante tais ocorrências.
Gabriel Dezen Jr.[4] entende que as situações de crise não impedem a apresentação de PEC ou o debate (discussão) sobre as proposições que já estão tramitando. O que ele argumenta é que são vedadas apenas a votação e a promulgação, porque esses últimos atos constituiriam verdadeiros atos de vontade.
Destoamos desse entendimento. Em nossa opinião, ao se restringir a vedação à votação e à promulgação e permitir, por exemplo, a iniciativa ou discussão, poderiam ser produzidas normas constitucionais viciadas, ainda que em períodos de normalidade. Nossa opinião é a de que a iniciativa também denota manifestação de vontade pelo autor da proposta e pela Mesa da Casa, já que esta analisa a constitucionalidade da proposta apresentada. Estas vontades podem estar viciadas pela situação de crise, e o vício contamina a proposta, ainda que sua eventual votação e/ou promulgação se dê fora dos momentos de crise.
Em nosso entendimento, as discussões também passam por manifestações de vontade, porque, no âmbito da discussão, os parlamentares exteriorizam seu pensamento sobre a proposta. É exatamente no momento da discussão que se tenta dissuadir a parte contrária com argumentos e manifestações. A discussão é o momento de convencimento e, portanto, também não deve ser praticada durante situações de instabilidade.
Por fim, entendemos que, durante qualquer um dos estados de crise previstos no artigo 60, § 1º, da Constituição Federal, incluindo a intervenção federal decretada sobre a Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, nenhum ato do “processo legislativo” de emendas constitucionais deve ser praticado.
[1] Embora a doutrina seja esmagadoramente a favor da tese de que tais situações são limitações circunstanciais, Nagib (2006, p. 37) entende que são limitações temporais. Também Sampaio entende que é limitação temporal, porém limitação temporal permanente: SAMPAIO, Nelson de Sousa. O Processo Legislativo. 2ª Ed. Revista e Atualizada pelo Prof. Uadi Lamêgo Bulos. Ed. Del Rey. Belo Horizonte, 1996. p. 109.
[2] O STF reconhece que são “restrições de ordem circunstancial, inibitórias do poder reformador” – MS 23.087-MC/SP, 1998.
[3] Manoel Jorge e Silva Neto (Curso de Direito Constitucional, 2006, p. 19) entende que “são exigíveis a serenidade, a ponderação e o equilíbrio à atuação parlamentar quando voltada à mudança da Constituição, atributos dificilmente encontrados durante tais ocorrências”.
[4] Gabriel Dezen Júnior (2007, p. 97).
André Alencar – Bacharel em Direito, especialista em direito público, professor de Direito Constitucional em preparatórios para concursos desde 2000, ex-servidor do STF, advogado atuante pela OAB-DF, Analista Legislativo da Câmara dos Deputados (assessor de plenário), autor de livros e artigos jurídicos.
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