Elementos Constitutivos do Ato de Improbidade Administrativa – Parte III: Conduta Ímproba

Nobres estudantes, que prazer em revê-los! Desejo a todos, desde logo, um dia alegre e de muita produtividade.

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18 de maio4 min. de leitura

Pois bem, vencidos os elementos subjetivos – tanto o passivo quanto o ativo – que compõem o ato de improbidade administrativa, hoje analisaremos os são os bens jurídicos tutelados pela nossa Lei 8.429/92 (Lei de Improbidade Administrativa – LIA), assim como as ações ou omissões relevantes para a incidência do referido diploma legal.

A conduta ímproba, segundo previsto na Lei 8.429/92, dá origem a quatro espécies distintas de atos de improbidade:

1) atos de improbidade que importam enriquecimento ilícito;

2) atos de improbidade que causam prejuízo ao erário;

3) atos de improbidade decorrentes da concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário (relacionado ao imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS);

4) atos de improbidade que atentam contra os princípios da Administração Pública.

Nesse contexto, podemos identificar como bens jurídicos resguardados pela LIA o patrimônio público (erário), a moralidade da administrativa, a impessoalidade, a transparência, dentre outros.

Dito isso, passando à análise de cada uma das quatro espécies de atos de improbidade mencionadas, cumpre registrar que são atos ímprobos que importam em enriquecimento ilícito aqueles em que os agentes públicos envolvidos auferem qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de seu cargo, mandato, função, emprego ou atividade (art. 9º).

A título de exemplo, podemos destacar as condutas de “receber, para si ou para outrem, dinheiro, bem móvel ou imóvel, ou qualquer outra vantagem econômica, direta ou indireta, a título de comissão, percentagem, gratificação ou presente de quem tenha interesse, direto ou indireto, que possa ser atingido ou amparado por ação ou omissão decorrente das atribuições do agente público”, de “adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público” e de “usar, em proveito próprio, bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º (…)”. Tais condutas encontram previsão, respectivamente, nas alíneas “a”, “g” e “l” do art. 9º da Lei 8.429/92.

Sob outro aspecto, são enquadrados como atos de improbidade que causam lesão ao erário, qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens e haveres das entidades que podem ser sujeito passivo de atos de improbidade (art. 10).

Entre os atos de improbidade inseridos nessa categoria, impende mencionarmos as hipóteses decorrentes das condutas de “facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º (…)”, de “frustrar a licitude de processo licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou dispensá-los indevidamente”, de “agir negligentemente na arrecadação de tributo ou renda, bem como no que diz respeito à conservação do patrimônio público” e de “permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente” (vide alíneas “a”, “h”, “j” e “l” do art. 10 da LIA).

Já os atos de improbidade administrativa decorrentes da concessão ou aplicação indevida de benefício financeiro ou tributário (relacionados ao imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS) passaram a existir como categoria própria somente a partir da LC 157/2016, que inseriu o art. 10-A, no bojo da Lei 8.429/92. Tal hipótese abarca o ato de improbidade administrativa, comissivo ou omissivo, que conceda, aplique ou mantenha benefício financeiro ou tributário, do qual resulte a cobrança de alíquota do ISS inferior ao percentual de 2%, que é o mínimo legalmente exigido. Também se enquadram nessa categoria os atos de concessão de isenções, incentivos ou benefícios tributários ou financeiros, inclusive de redução de base de cálculo ou de crédito presumido ou outorgado, ou sob qualquer outra forma que resulte, direta ou indiretamente, em carga tributária menor que a decorrente da aplicação da alíquota mínima de 2% (art. 8º-A, § 1º, da LC 116/2003).

Nesse ponto, não se pode deixar de observar que a Lei 8.429/1992 é uma lei ordinária, ao passo que a matéria foi incluída no art. 10-A mediante a edição de uma lei complementar. Com efeito, não há qualquer impropriedade no ocorrido, na medida em que o legislador apenas aproveitou a legislação que estava alterando a LC 116/2003 – que dispõe sobre o ISSQN –, para também modificar a LIA. No entanto, a norma insculpida no art. 10-A é apenas formalmente lei complementar, mas materialmente é lei ordinária. Assim, se futuramente o art. 10-A for alterado ou revogado, isso poderá ocorrer mediante lei ordinária.

Lado outro, são atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública qualquer ação ou omissão que violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições (art. 11 da Lei 8.429/92). Nesta última categoria, a tipificação do ato estará presente mesmo que não haja enriquecimento sem causa do agente ou mesmo que não exista prejuízo aos cofres públicos, sendo suficiente apenas a violação aos princípios aplicáveis à Administração Pública para configurar a improbidade administrativa.

Mais uma vez, são exemplos de condutas da espécie supra: “praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência”; “negar publicidade aos atos oficiais”; “frustrar a licitude de concurso público”; “deixar de cumprir a exigência de requisitos de acessibilidade previstos na legislação”. (Art. 11, alíneas “a”, “d”, “e” e “i” do art. 11 da LIA).

Ponto interessante (e com grande índice de cobrança em provas) consiste em notarmos que, enquanto a frustração da licitude de procedimento licitatório ou de processo seletivo para celebração de parcerias com entidades sem fins lucrativos, ou a sua dispensa indevidamente são enquadradas como atos que causam lesão ao erário, a frustração da licitude de concursos públicos é um ato que atenta contra os princípios da Administração Pública.

Por fim, há de se atentar ao fato de que, apesar de ser usualmente denominada “Lei de Improbidade Administrativa”, a Lei 8.429/92 não contém uma lista taxativa de todas as condutas enquadráveis como atos de improbidade administrativa. Em primeiro lugar, deve-se salientar, como vimos, o caráter exemplificativo dos atos listados nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei, sendo que apenas o novo art. 10-A é que tipifica hipótese isolada e específica. Em segundo lugar, é possível à lei ordinária definir outras condutas enquadráveis no conceito; foi o que aconteceu com a Lei 13.089/2015, que, no seu art. 21, estatuiu que incorre em improbidade administrativa:

 

a) o governador ou agente público que atue na estrutura de governança interfederativa que deixar de tomar as providências necessárias para: i) garantir o cumprimento do dispositivo legal que obriga que regiões metropolitanas e aglomerações urbanas possuam plano de desenvolvimento urbano integrado aprovado por lei estadual, no prazo de 3 (três) anos da instituição da região metropolitana ou da aglomeração urbana; ou ii) elaborar e aprovar, no prazo de 3 (três) anos, o plano de desenvolvimento urbano integrado das regiões metropolitanas ou das aglomerações urbanas instituídas até a data de entrada em vigor desta Lei;

b) o prefeito que deixar de tomar as providências necessárias para garantir a compatibilidade do plano diretor do Município com o plano de desenvolvimento urbano integrado da unidade territorial urbana, no prazo de 3 (três) anos da aprovação do plano de desenvolvimento integrado.

 

Por todo o exposto, e considerando o entendimento do nosso Superior Tribunal de Justiça segundo o qual nem todo ato ilegal é, necessariamente, improbo, na medida em que “a improbidade é uma ilegalidade qualificada pelo intuito malsão (nocivo) do agente, atuando com desonestidade, malícia, dolo ou culpa grave” (cf. STJ, REsp 1.193.248/MG, Primeira Turma, da relatoria do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 24/04/2014 – Info 540), encerramos aqui o nosso estudo no que se refere ao elemento comportamental constitutivo do ato de improbidade administrativa.

Não perca o último artigo dessa nossa série de breves apontamentos sobre a Lei 8.429/92, oportunidade em que iremos nos debruçar sobre o elemento subjetivo que também compõe o ato ímprobo (isto, o dolo ou a culpa), bem assim sobre todos os entendimento doutrinários e jurisprudenciais assentados sobre a matéria. Até logo!

 

https://www.youtube.com/watch?v=zm_owDWjYEY

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