Penhora de valores depositados em conta poupança quando esta é utilizada como conta corrente

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O inciso X, do artigo 833, do CPC estabelece que são impenhoráveis, dentre outros bens, a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos:  “Artigo 833, X, do CPC – a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos“.

A ratio da norma consiste em resguardar quantia mínima necessária para sobrevivência do devedor. De fato, dentre os bens considerados essenciais à vida digna, que não podem ser constritos em execução, está a reserva que se faz por segurança para momentos não programados, como, por exemplo, desemprego, crise ou contingências imprevistas.[1]

Como se nota, a norma estabelece uma presunção de que os valores depositados em caderneta de poupança até aquele limite assumem função de segurança alimentícia pessoal e familiar. Trata-se, pois, de benefício que visa à proteção do pequeno investimento, da poupança modesta, voltada à garantia do titular e de sua família contra imprevistos, como desemprego ou doença, conforme já anotou o STJ – Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1.330.567-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 16/5/2013.

Segundo a jurisprudência do STJ, “reveste-se de impenhorabilidade a quantia de até quarenta salários mínimos poupada, seja ela mantida em papel moeda, conta-corrente ou aplicada em caderneta de poupança propriamente dita, CDB, RDB ou em fundo de investimentos, desde que a única reserva monetária em nome do recorrente, e ressalvado eventual abuso, má-fé ou fraude, a ser verificado caso a caso, de acordo com as circunstâncias do caso concreto (inciso X)” (REsp n. 1.230.060/PR, Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Segunda Seção, julgado em 13/8/2014, DJe
29/8/2014).

É preciso destacar que a poupança constitui investimento de baixo risco e retorno, contando com proteção do Fundo Garantidor de Crédito e isenção do imposto de renda, tendo sido concebida justamente para pequenos investimentos destinados a atender o titular e sua unidade familiar em situações emergenciais, por um período determinado e não muito extenso.

Ainda sobre o tema, vale registrar que a impenhorabilidade prevista no art. 649, X, do CPC refere-se ao montante de 40 salários mínimos, considerando a totalidade do valor depositado em caderneta de poupança, independentemente do número de cadernetas titularizadas pelo devedor (REsp 1.231.123-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 2/8/2012).

Assim, por exemplo, se um determinado devedor-executado possuir seis cadernetas de poupança e a totalidade dos valores ultrapassar os 40 salários mínimos, nada impede a penhora de uma das poupanças, ainda que nela haja quantia inferior ao limite máximo. Logo, é indiferente o número de cadernetas de poupança titularizadas pelo devedor, pois o critério fixado por lei diz respeito ao total do montante depositado. Portando, para a realização da penhora de poupança, deve-se apurar o valor de todas as aplicações em caderneta de poupança titularizadas pelo devedor e realizar a constrição apenas sobre o valor que exceder o limite legal de 40 salários mínimos (REsp 1.231.123-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 2/8/2012).

Em que pese a impenhorabilidade dos valores depositados em caderneta de poupança, pacificou-se na jurisprudência que a impenhorabilidade de que trata o art. 649, X, do CPC não alcança valores depositados em conta poupança quando esta é utilizada como conta corrente, sem o cunho de economia futura e segurança pessoal.

Com esse entendimento, evitam-se manobras de blindagem patrimonial. Com efeito, o simples fato de que valores estejam depositados em poupança não pode conduzir à impenhorabilidade absoluta. Desse modo, demonstrado que a conta poupança não possui cunho de economia, para segurança pessoal e futura, mas, ao contrário é usada para transações corriqueiras, resta justificada a penhora dos valores nela em depósito para saldar a dívida.

Foi exatamente o que ocorreu em caso concreto já julgado pelo TST, no qual os extratos bancários acostados aos autos demonstraram várias transações financeiras que não são típicas de conta poupança. Com isso, entendeu o TST demonstrada que a conta poupança era utilizada como verdadeira conta corrente pela impetrante, ou ainda, como suporte a transações financeiras efetuadas na conta corrente, desvirtuando, assim, a característica primordial da aplicação em poupança. A decisão ficou assim ementada:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA – BLOQUEIO DE NUMERÁRIO EM CONTA POUPANÇA – INAPLICABILIDADE DA PROTEÇÃO INSCRITA NO INCISO X DO ART. 649 DO CPC – DESLOCAMENTO DA REDOMA PROTETIVA PELO DESVIRTUAMENTO DA FUNÇÃO SOCIAL DA APLICAÇÃO FINANCEIRA DE CUNHO POPULAR E MODESTO – LEGALIDADE DO ATO COATOR CONSTRITIVO. Afasta-se a redoma protetiva da impenhorabilidade, prevista no inciso X do art. 649 do CPC, se a constrição recai sobre valores depositados em conta poupança, quando o seu titular a utiliza como conta corrente, realizando transações inerentes a esta categoria de conta, desvirtuando das características de economia futura. Isso porque a conta poupança possui cunho de economia, de segurança pessoal e futura, ao contrário da conta corrente, cujo uso está vinculado a transações corriqueiras. Por derradeiro, a indicação de que a conta bancária era utilizada para depósitos de comissões oriundas da atividade de representante comercial autônoma, exercida pela impetrante, não foi em nenhum momento demonstrada nos autos, permanecendo inalterada a conclusão externada pelo Juízo regional de que não se tratava de conta salário, sequer protegida pela norma do art. 649, IV, do CPC. Recurso ordinário conhecido e desprovido. (TST-RO-20598-85.2013.5.04.0000, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 16/02/2016, Subseção II Especializada em Dissídios Individuais, Data de Publicação: DEJT 19/02/2016).

Referências

[1] MAZZEI, Rodrigo. Art. 833 do CPC. In CRAMER, Ronaldo;  CABRAL, Antônio do Passo. Comentários ao novo código de processo civil. 2. ed. São Paulo: Forense, 2016, pág. 1196.

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