Em qualquer roda de conversa, encontramos pelo menos uma pessoa a qual se intitula perfeccionista e acredita que esse termo seja algo benéfico, sinônimo de algo positivo. Para quem assim o faz, será que há motivos reais para se orgulhar dessa característica?
Há uma confusão quando o assunto é perfeccionismo, porque, na verdade, existem três formas de ele se manifestar: o autodirigido, quando a cobrança parte de alguém para si mesmo; o prescrito pela sociedade, cuja expectativa parte de alguém para outra pessoa; e o de si dirigido aos outros, no qual há um julgamento nosso para com os outros, baseado em nossas expectativas.
Além disso, podemos dividi-lo em duas categorias: no autoadaptativo, a exigência de alcançar objetivos é realista, e o nível de autocrítica é equilibrado, caso não se alcance o resultado almejado. O indivíduo tem facilidade de aceitar as adversidades e procura reavaliar o motivo pelo qual não conseguiu êxito, utilizando como sua motivação o foco no resultado.
Já o contrário trata-se do mal-adaptativo. Nele, o indivíduo se frustra com frequência e, mesmo que alcance a vitória, não se sente satisfeito. Nessa situação, a pessoa é motivada pelo medo do erro, tem dificuldades para se adaptar às novas situações e para readequar suas expectativas – ou seja, cria-se um padrão de exigência irreal, uma expectativa aquém do que se pode entregar, gerando-se uma frustração absurda em quem convive com esse sentimento. Assim, percebemos a importância em identificar que tipo de característica nos acompanha (a que nos auxilia ou a que nos destrói).
A exemplo disso, cito a história de Maria: advogada, mãe de duas filhas, já tem os três anos de prática jurídica e sonha em ser Juíza. É, em sua essência, perfeccionista. Sua rotina é milimetricamente calculada e, ainda que tenha babá para cuidar das crianças e estagiária para auxiliá-la no escritório, tem dificuldade de confiar em outras pessoas. Confia mesmo é em si: sua competência, sua agenda e suas anotações. Casada com João, divide-se entre o escritório, a casa e os estudos, e tem dificuldade de se desvincular desses títulos, de delegar suas funções.
Como a vida não tem roteiro, ocorre uma série de imprevistos todos os dias, e Maria tem extrema dificuldade de lidar com isso. Sofre com crises seríssimas de ansiedade e, inconscientemente, com sua mania de se apegar ao detalhe, quando algo sai do previsto, sente-se paralisada com relação às demais atividades que precisa fazer, transformando sua proatividade em procrastinação. Em sua cabeça, se algo não deu certo, todo o restante não faz mais sentindo, ocasionado um ciclo vicioso de frustração e afastamento de seu objetivo.
Essa história claramente retrata a vida de quem sofre com o perfeccionismo mal-adaptativo. Sabendo do perigo e da dificuldade de lidar com essa tendência de obstinação por ser tudo perfeito, trago cinco características dessa categoria de perfeccionismo, com a intenção de te alertar sobre o perigo desse comportamento. Além disso, pretendo te auxiliar a identificar as características dessa forma de conduta e abordar sugestões para lidar com isso. Vejamos:
1) “8 ou 80”
Para as pessoas perfeccionistas, não existe morno: ou é frio, ou é quente, ou é preto, ou é branco, ou se ama, ou se odeia, ou é tudo, ou é nada. É muito difícil encontrar adjetivos nos intervalos entre esses extremos. Por isso, a dica é: observe-se e, caso você tenha essa prática de intensidades, sugiro que explore os intervalos e cultive o equilíbrio.
É fundamental identificar e criar o hábito de aumentar o vocabulário na hora de se expressar, já afirmava Aristóteles na ética do meio-termo, quando enfatizava, em sua doutrina, a defesa da simetria, da proporção e da harmonia para se atingir a beleza e o equilíbrio da vida.
2) Dificuldade de delegar atividades
Outra característica perceptível em pessoas perfeccionistas é a dificuldade em pedir ajuda, e pior, acham que são melhores na execução de qualquer atividade. Para elas, o erro é inadmissível. Quando têm de treinar alguém, pensam que correm o risco de que errem por elas e julgam ser perda de tempo o período gasto com o treinamento, já que poderiam ter realizado as atividades sozinhas. Pensar em delegar tarrefas aumenta a ansiedade e a tensão do perfeccionista, gerando, na maioria dos casos, acúmulo de demandas e uma sobrecarga absurda.
O principal ponto é reconhecer essas características e se policiar para evitar a frase: DEIXA QUE EU FAÇO. Além disso, deve-se adquirir o hábito de ensinar atividades e desenvolver pessoas. Com os erros delas, elas aprenderão e, com a ajuda delas, você poderá ter uma performance melhor e se dedicar ao realmente essencial em sua vida.
3) Esperar dos outros o que se espera de si mesmo
Na busca incessante pela perfeição, o perfeccionista mal-adaptativo busca se dedicar de forma fora da média, atento aos detalhes; ele exige muito de si e espera dos outros o mesmo comportamento. Nem preciso afirmar que essa expectativa é, sem dúvidas, uma fonte de frustração. Na cabeça dele, as coisas são óbvias, não precisam ser explicadas – daí surge o desgaste, a impaciência e a dificuldade de passar o que esperar para o outro.
A dica é se policiar e entender que precisamos do outro; temos de adquirir empatia e ter paciência para explicar o que precisa ser feito; temos de diminuir nossas expectativas e entender que o erro faz parte do processo.
4) Hábito de Procrastinar
Esse aqui é o hábito mais comum entre as pessoas: deixar para depois o que precisa ser feito agora – e aqui não falamos só das perfeccionistas, são todas. Porém, para os perfeccionistas mal-adaptativos, a dificuldade está em começar e finalizar projetos pela mania de acreditar que está faltando algo. Além disso, caso algo saia do roteiro no decorrer do dia, essas pessoas acreditam que isso já é motivo para adiar o que poderia ser resolvido hoje.
Some-se a esses comportamentos a mania de não se sentir preparado para realizar determinada atividade por falta de segurança ou preparo, ou por não se sentirem bons o suficiente – estas também são características peculiares. Ou faz tudo, ou não faz nada, ou se está apto a fazer, ou não se está, e segue o ciclo.
A dica é clara: avalie o que tem provocado essa mania de procrastinar e entenda que feito é melhor perfeito, a constância em fazer a mesma coisa é que te trará resultado. É por meio dos erros diários que se aprende; ajuste suas práticas e torne-se alguém melhor. Permita-se. Só erra quem faz.
5) Autoconfiança mitigada
Essa talvez seja uma das principais necessidades do perfeccionista, ser validado, mas de forma positiva. O elogio alimenta o seu ego e, para quem quer ser o melhor, ouvir algo que valide seu empenho e todo o seu esforço traz a sensação de dever cumprido. O lado ruim é que a crítica, ainda quando parte de apenas uma pessoa, é a fórmula mágica para desestabilizar o indivíduo. O foco será obsessivo nisso.
Ou seja, a autoconfiança de ser o melhor está ligada diretamente à opinião externa do que pensam a respeito sobre ele e sobre o que ele faz. Volto a sinalizar: não existe felicidade sem progresso, é exatamente com os desafios e consertos que a vida tem sentido. Afinal, de que valeria vir pronto para viver o presente da vida, não é mesmo? Confiar em si e ter noção de que haverá sempre pessoas as quais não concordarão com você e não terão opiniões iguais às suas faz parte.
Como dito, é importante se avaliar e identificar o comportamento. Caso não consiga mudar sozinho, é importante buscar ajuda de um profissional para te auxiliar no processo. O perfeccionismo trata-se de um comportamento autodestrutivo, e isso merece atenção! Caso tenha identificado essas características em si, cuide-se! Fará bem a você e aos que convivem contigo.
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Grande abraço e fica em casa!!
Nelson Marangon
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