Prescrição

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É a perda da pretensão punitiva ou da pretensão executória. Esta perda ocorre em razão de o titular ter perdido o direito de punir ou de executar a pena.

A prescrição deve ser conhecida de ofício pelo magistrado.

I – Diferença entre decadência e prescrição. A diferença entre decadência e prescrição reside no fato de que a decadência atinge o direito de ação, enquanto a prescrição atinge não o direito de ação, mas o direito de punir, ou o direito de executar uma punição.

A decadência ocorre em ação penal privada ou em ação penal pública condicionada à representação.

Enquanto a prescrição poderá ocorrer por meio de qualquer ação, seja pública ou privada, condicionada ou incondicionada

II – Hipóteses de imprescritibilidade. A CF consagra alguns crimes imprescritíveis:

• Racismo (Lei 7.716);

• Grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional ou contra o estado democrático de direito

Não poderia o legislador ordinário ou constituinte derivado reformador criar hipóteses de

imprescritibilidades. Até porque seria um direito fundamental do indivíduo de que os crimes fossem prescritíveis, isto é, o Estado deve agir dentro do tempo razoável. Isso é o que garante segurança jurídica.

III – Espécies de prescrição. A prescrição poderá ser:

• Prescrição da pretensão punitiva: antes do trânsito em julgado. Extingue o direito de punir;

• Prescrição da pretensão executória: após o trânsito em julgado. Extingue o direito de executar. Os efeitos penais secundários continuam vigentes. Ex.: reincidência.

A prescrição da pretensão punitiva poderá se dividir em:

• Prescrição propriamente dita em abstrato;

• Prescrição superveniente;

• Prescrição retroativa;

• Prescrição virtual ou antecipada.

No entanto, os Tribunais Superiores não admitem a prescrição virtual ou antecipada.

Prescrição da pretensão punitiva em abstrato. Lapso temporal da prescrição.

Para descobrir o lapso temporal, é necessário pegar a pena máxima cominada ao delito e verifica o art. 109 do CP, que estabelece que a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, verifica-se:

• em 3 anos, se o máximo da pena é inferior a 1 ano.

• em 4 anos, se o máximo da pena é igual a 1 ano ou, sendo superior, não excede a 2 anos;

• em 8 anos, se o máximo da pena é superior a 2 anos e não excede a 4 anos;

• em 12 anos, se o máximo da pena é superior a 4 anos e não excede a 8 anos;

• em 16 anos, se o máximo da pena é superior a 4 anos e não excede a 12 anos;

• em 20 anos, se o máximo da pena é superior a 12 anos.

Causas de aumento, diminuição, qualificadoras, agravantes e atenuantes para fins de prescrição. Para verificar a pena máxima, é necessário analisar as penas máximas das qualificadoras e das causas de diminuição e aumento de pena. Para o caso de diminuição, deverá

levar em conta a menor diminuição, e para o caso de aumento, deverá levar em conta o maior

aumento. Trata-se de aplicação da teoria da pior das hipóteses.

Não se leva em conta as atenuantes e agravantes, bem como as circunstâncias judiciais, pois não se tem condição de aumentar ou diminuir o máximo da pena.

É importante frisar que as atenuantes da menoridade e da senilidade são relevantes para a prescrição da pretensão punitiva quando o agente for menor de 21 anos, na data do fato, ou maior de 70 anos, na data da sentença, eis que, neste caso, segundo o art. 115 do CP, os prazos de prescrição serão reduzidos pela metade.

Atente-se que também há relevância de atenuantes e agravantes, caso o sujeito seja reincidente, para a prescrição da pretensão executória.

Começo do prazo prescricional. Para entender o começo do prazo prescricional bastar contá-lo a partir do momento em que acabou a atividade criminosa, situação em que poderá ser compreendido o art. 111 do CP.

Ou seja, a prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:

• Do dia em que o crime se consumou;

• No caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa;

• Nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência;

• Nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido: isso porque, nesses crimes, se for do dia que consumou, não teria punição. Nesses casos, será pela data que o fato se tornou conhecido.

• Nos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.

Nos casos de crime habitual, o prazo prescricional começará a ser contado a partir da prática do último ato delitivo.

Causas suspensivas da prescrição. No caso de causas suspensivas, a prescrição, durante a ocorrência daquela causa, ficará suspenso. Após, a prescrição retomará o seu curso, considerando o período que já decorreu.

São causas de suspensão da prescrição, em que, antes de passar em julgado a sentença final, não correrá:

• Enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime: trata-se da questão prejudicial da qual dependa para existência do crime no processo penal. Ex.: no crime de bigamia, resta suspenso o delito de bigamia enquanto não for julgado o processo de anulação do casamento no cível;

• enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro.

Existem outras causas de suspensão da prescrição não previstas no CP, como é o caso da suspensão de processo contra parlamentar. Os congressistas, quando processados, têm a prescrição suspensa caso o STF receba a denúncia e comunique a Casa respectiva. Nesse caso, o congressista poderá ter o seu processo suspenso, caso haja requerimento de suspensão formulado por partido político com representação no congresso nacional e haja a aprovação da maioria absoluta da Casa. Esta suspensão do processo implica suspensão do prazo prescricional.

Causas interruptivas da prescrição. No caso da interrupção da prescrição, como dito, o prazo voltará a correr do início. As causas interruptivas estão previstas no art. 117 do CP:

• Pelo recebimento da denúncia ou da queixa;

• Pela pronúncia;

• Pela decisão confirmatória da pronúncia;

• Pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis;

• Pelo início ou continuação do cumprimento da pena;

• Pela reincidência.

Exemplo disso é o recebimento da denúncia ou da queixa-crime, que interromperá o prazo prescricional. Caso haja o despacho inicial rejeitando a inicial, não houve a interrupção do prazo, pois não houve o recebimento da denúncia. Caso o MP recorra, e o Tribunal reforme o despacho de rejeição da inicial, a interrupção do prazo prescricional será o da data dessa decisão do Tribunal, que implica o recebimento da denúncia.

Segundo o STJ, quando o recebimento da denúncia se der por autoridade absolutamente incompetente em razão da prerrogativa de foro do acusado, esse ato não é apto a interromper a prescrição.

No concurso de crimes, a extinção de punibilidade incidirá sobre cada um isoladamente.

No caso da decisão de pronúncia, que é aquela decisão que remete o réu ao Tribunal do Júri, por haver indícios de autoria a materialidade do crime. Esta decisão também interrompe a prescrição, e não apenas do crime doloso contra a vida, mas também do crime conexo. Ex.: sujeito matou com um menor em coautoria. O sujeito cometeu o crime de homicídio e corrupção de menores.

A decisão confirmatória da pronúncia também é causa de interrupção da prescrição. Ela se dá quando o sujeito confirma a decisão de pronúncia pelo Tribunal.

A sentença condenatória interrompe a prescrição, mas a discussão reside no acórdão condenatório recorrível. Isto é, prevalece o entendimento de que este acórdão condenatório que

interrompe a prescrição é aquele acórdão em que reforma uma sentença absolutória. Por essa razão, o STJ decidiu que o acórdão confirmatório da condenação, ainda que modifique a pena fixada, não interrompe o curso do prazo prescricional.

No entanto, o próprio Código Penal afirma que essa interrupção depende da publicação da sentença ou do acórdão condenatório. Segundo o CPP, considera-se publicada a sentença quando o escrivão procede à juntada da sentença aos autos, ou no caso de acórdão ou sentença proferida em audiência, e acórdão proferido em sessão, a publicação se dá neste ato de audiência ou na sessão de julgamento.

Atente-se que a sentença confirmatória da condenação pelo Tribunal também tem o condão de interromper a prescrição.

A interrupção da prescrição não é interrompida em relação a apenas um autor, e sim em relação a todos os autores do crime. Isto é, se houver 3 réus, cada vez que for recebida a denúncia contra cada um deles haverá a interrupção do prazo prescricional em relação a todos os demais.

Em relação aos crimes conexos, que sejam objetos do mesmo processo, também haverá a extensão da interrupção da prescrição em relação a todos eles, independentemente da causa interruptiva que tenha sido ocasionada. Ex.: crime doloso contra a vida e corrupção de menores.

A decisão de pronúncia interrompe a prescrição de ambos.

Prescrição da pretensão punitiva superveniente (ou intercorrente). Por exemplo, um juiz fixa uma pena em 4 anos, sendo que a sanção para o crime poderia ser de até 10 anos. Quando esta decisão transita em julgado para a acusação, esta pena não pode mais ser majorada. A partir de então, percebe-se a pena máxima que o sujeito poderá receber. Neste momento, há um diferente paradigma para o prazo prescricional.

Segundo o art. 110, §1º, a prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, é regulada pela pena aplicada.

Portanto, são requisitos para esta prescrição:

• Sentença ou acórdão condenatório;

• Havido trânsito em julgado para a acusação;

• A partir deste momento, essa pena passa a ser o paradigma.

O termo inicial da contagem do prazo prescricional é a publicação da sentença ou acórdão condenatório até a data do trânsito em julgado final.

A análise prescricional se dá a partir da sentença ou acórdão condenatório para frente, por isso prescrição da pretensão punitiva superveniente.

Prescrição da pretensão punitiva retroativa. Apesar de falarmos da prescrição da pretensão punitiva, os olhares são voltados para trás. E por isso o nome é prescrição da pretensão punitiva retroativa.

Como a superveniente, também deverá se levar em conta a pena em concreto. A pena máxima será a partir do trânsito em julgado para a acusação, devendo, neste caso, olhar para trás, ou seja, a prescrição retroativa deverá se voltar a partir da data da publicação da sentença ou acórdão condenatório até a data do recebimento da denúncia ou queixa.

Se entre a data do recebimento da denúncia e a data da publicação da sentença ou acórdão condenatório tiver passado o lapso temporal superior ao prazo prescricional previsto na pena fixada, então houve a prescrição da pretensão punitiva retroativa.

Prescrição da pretensão punitiva virtual (antecipada ou em perspectiva ou prognose). 

Não há previsão legal.

A prescrição virtual leva em conta o conhecimento do fato, bem como das circunstâncias que seriam levadas em conta quando o juiz fosse graduar a pena e chegando-se a uma provável condenação, tomar-se-ia por base essa pena virtualmente considerada e far-se-ia a averiguação de possível prescrição, quando então não haveria interesse em dar-se andamento em ação penal que de antemão pudesse encerrar com a extinção da punibilidade.

Trata-se, em verdade, de uma perda de interesse de agir do Estado.

Os Tribunais Superiores não admitem a prescrição virtual.

O STJ editou a súmula 438, estabelecendo que é inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal.

Prescrição da pretensão executória. A prescrição da pretensão executória é a prescrição da pena em concreto.

Houve uma pena fixada e o trânsito em julgado. Neste caso, deverá analisar os prazos do art. 109 do CP e descobrir quanto tempo há para o sujeito começar a ter sua pena executada.

Caso o condenado seja reincidente, os prazos do art. 109 deverão sofrer um aumento de 1/3.

Se houver o reconhecimento da prescrição da pretensão executória, a pena estará extinta, mas os efeitos penais secundários continuam vigentes. Na verdade, ficarão mantidos os efeitos de reincidência, por exemplo, e os efeitos extrapenais, como é o caso da reparação do dano.

Essa prescrição somente encerra os efeitos penais principais, ou seja, a execução da pena.

Termo inicial da prescrição da pretensão executória. Apesar de ser esta redação bastante criticada pela doutrina e jurisprudência, o termo inicial da prescrição da pretensão executória está disposto no art. 112 do CP.

Segundo o dispositivo, no caso da prescrição da pretensão executória, a prescrição começa a correr:

• do dia em que houver o trânsito em julgado da sentença penal condenatória para a acusação;

• do dia em que houver a revogação da suspensão condicional da pena (sursis) ou o livramento

condicional;

• do dia em que houver a interrupção da execução, salvo quando o tempo da interrupção deva computar-se na pena.

Do dia em que foi revogado o sursis ou do dia em que foi revogado o livramento condicional começa a correr o prazo da prescricional da pretensão executória. Vale lembrar que, durante o sursis ou o livramento condicional, não corre os prazos prescricionais.

Nos casos em que o sujeito se evade do cárcere, haverá o início da contagem do prazo prescricional da pretensão executiva. Caso não haja a recaptura do condenado, e ultrapasse o prazo prescricional, haverá a suspensão da pretensão executória.

Atente-se que, neste caso, o prazo para cumprimento que regule a prescrição da pretensão executória deverá ter por base o quantum de pena que ainda resta cumprir, e não a pena da condenação. Isto também serve para o livramento condicional, nos casos em que o sujeito se evade tendo cumprido boa parte da pena em cárcere.

Preste atenção, no caso da suspensão condicional da pena não haverá esta aplicação, visto que o condenado não começou a cumprir a pena. Diante disso, deve-se levar em conta o quantum fixado na sentença.

O Supremo Tribunal Federal fixou entendimento em plenário que o início da contagem do prazo prescricional ocorrerá quando houver trânsito em julgado de ambas as partes, apesar da lei estipular que é a partir do trânsito em julgado da acusação. 

Causas de suspensão da prescrição da pretensão executória. O art. 116, parágrafo único, do CP diz que depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado estiver preso por outro motivo.

Ou seja, o sujeito que está cumprindo pena por um crime, e durante este prazo foi condenado por outro crime, enquanto estiver cumprindo pena pelo primeiro crime não correrá a prescrição executória em relação a este segundo crime que acabou de ser condenado.

Trata-se de uma causa de suspensão.

Causas de interrupção da prescrição da pretensão executória. Segundo o art. 117, o curso da prescrição é interrompido:

• pelo início ou continuação do cumprimento da pena;

• pela reincidência.

Prescrição para Atos Infracionais

Em regra, falamos em prescrição para crimes.

No entanto, segundo a jurisprudência, a prescrição para atos infracionais terá os mesmos prazos prescricionais.

A súmula 338 do STJ estabelece que a prescrição penal é aplicada às medidas socioeducativas.

Todavia, vale lembrar a regra de que as penas serão reduzidas pela metade caso o seja

menor de 21 anos, na data do fato. Neste caso, os prazos previstos no art. 109 deverão ser reduzidos pela metade.

Prescrição da Pena de Multa

A prescrição da pena de multa encontra previsão no art. 144 do CP, havendo, basicamente, duas regras:

• se pena de multa tiver sido fixada isoladamente ou tiver previsão de isoladamente ser cominada, a prescrição ocorrerá em 2 anos;

• se a pena de multa tiver cominada alternativamente ou cumulativamente com a pena privativa de liberdade ou tiver sido fixada cumulativamente à pena privativa de liberdade, o prazo prescricional ocorrerá no prazo da pena privativa de liberdade.

Em relação ao prazo prescricional, a maioria da doutrina entende que mesmo com a Lei

9.268, estes são os prazos prescricionais da pena de multa, a despeito da aplicação da Lei de Execução Fiscal quanto às causas interruptivas e suspensivas da prescrição em relação à pena de multa.

Vale lembrar que a pena de multa passa a ser uma dívida de valor, a qual deverá ser executada pela Procuradoria.

Redução dos Prazos Prescricionais

Já foi falado que se o sujeito for menor de 21 anos, na data do fato, ou maior de 70 anos,

na data da sentença, os prazos de prescrição serão reduzidos pela metade, salvo se o crime envolver violência sexual contra a mulher, a partir da Lei nº 15.160/2025.

Prescrição e Medida de Segurança

Para o STJ a prescrição da medida de segurança imposta em sentença absolutória imprópria é regulada pela pena máxima abstratamente prevista para o delito.

Este é inclusive o entendimento da Súmula 527, que diz que o tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.

Autora: Carolina Carvalhal Leite. Mestranda em Direito Penal. Especialista em Direito Penal e Processo Penal; e, Especialista em Ordem Jurídica e Ministério Público. Graduada em Direito pelo UniCeub – Centro Universitário de Brasília em 2005. Docente nas disciplinas de Direito Penal, Processo Penal e Legislação Extravagante em cursos de pós-graduação, preparatórios para concursos e OAB (1ª e 2ª fases). Ex-servidora pública do Ministério Público Federal (Assessora-Chefe do Subprocurador-Geral da República na Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão – PFDC). Advogada inscrita na OAB/DF e OAB/SC.

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