Modificações no Código Penal pelo “Pacote Anticrime”, através da Lei 13.964/2019: Análise das Inovações Relativas ao art. 83, CP.

Entenda quais foram as as modificações promovidas pelo “Pacote Anticrime” no 83, CP!

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I – Introdução

 

O presente artigo tem por escopo enfrentar as modificações promovidas pelo “Pacote Anticrime” no 83, CP. A posteriori, enfrentaremos em outros artigos científicos os demais dispositivos reformados e introduzidos no CP. Assim, neste artigo vamos analisar, da Parte Geral do CP, o arts. 83. Depois os arts. 116 e o novel art. 91-A, e na Parte Especial do CP as mudanças promovidas nos art.157, art. 171 e art. 316.

O art. 83, CP versa, sobre o Livramento Condicional que implica na liberdade antecipada do condenado a uma pena privativa de liberdade e depende do cumprimento de exigências legais previamente estabelecidas, notadamente no âmbito do Codex criminal pátrio. Conforme o escólio do Prof. GRECO (2017), literis:

O livramento condicional é a fase mais benéfica da execução da pena, tendo em vista que, nesse regime, o apenado está de certo modo protegido dos efeitos nefastos provocados pelo confinamento. Consiste na liberdade antecipada do apenado e depende do cumprimento de determinadas exigências previamente estabelecidas.

 

Trata-se, pois, de um direito subjetivo do condenado que, uma vez satisfeitos os requisitos legais, deve ser concedido pela autoridade judicial competente. Não é, portanto, uma prerrogativa da Autoridade Penitenciária Administrativa, vale dizer, do Diretor do Estabelecimento Penal, e também não constitui uma faculdade do órgão julgador.

O pleito do Livramento Condicional é feito pelo Advogado do condenado, contratado ou Defensor Público, em sede de Petição direcionada ao Juiz da Execução Penal e é concedido à luz da observância dos requisitos legais contidos no Código Penal. Caso o Juiz promova o indeferimento do pedido de Livramento Condicional, esta decisão pode ser arrostada por Agravo dirigida ao Tribunal Competente, nos termos do art. 197, LEP. Foram os requisitos legais que ensejam a concessão do Livramento Condicional que o objeto de reforma pelo Pacote Anticrime à luz do que dispõe o art. 83, CP.

Antes de prosseguir, faço menção a uma questão relevante que por vezes faz com que alunos em preparação para concursos venham a incidir em erro: Não há de se confundir Liberdade Provisória com Livramento Condicional. A primeira vem à tona no curso da persecução criminal, seja em sede do devido Inquérito Policial (IPL), seja em sede de Ação Penal, e permite que o indiciado ou réu responda a persecutio criminis em liberdade, considerando a não incidência de requisitos legais autorizadores do encerramento cautelar (provisório), notadamente a prisão preventiva, ex vi art. 312, CPP. O segundo é instituo da Execução Penal que permite que o condenado à pena de privação de liberdade antecipe, por assim dizer, a sua liberdade na última porção do cumprimento de sua pena como forma de lhe proporcionar melhores condições à sua ressocialização.

 

II – O Livramento Condicional no CP à Luz da Redação dada pela Reforma da Parte Geral do CP de 1984

 

O livramento condicional veio esculpido no Código Penal de 1942 nos seus art. 60 usque art. 66. Isso, com as reformas promovidas em 1951 e em 1977 através das leis 1.431/51 e 19516416/77.  No art. 60 encontravam-se os requisitos legais do livramento condicional nos seguintes termos:

Art. 60. O juiz pode conceder livramento condicional ao condenado a pena de reclusão ou de detenção superior a três anos, desde que:

I – cumprida mais de metade da pena, se o criminoso é primário, e mais de três quartos, se reincidente;

I – cumprida mais da metade da pena ou, tratando-se de reincidente, mais de três quartos; (Redação dada pela Lei 6.416/1977)

II – verificada a ausência ou a cessação da periculosidade, e provados bom comportamento durante a vida carcerária e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto;

III – satisfeitas as obrigações civis resultantes do crime, salvo quando provada a insolvência do condenado.

III – tenha reparado, salvo impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração. (Redação dada pela Lei 6.416/1977)

Parágrafo único. As penas que correspondem a crimes autônomos podem somar-se, para o efeito do livramento, quando qualquer delas é superior a três anos.

 

Com a reforma da parte geral do CP de 1984 foi engendrada uma nova redação dos dispositivos legais que tratam do Livramento Condicional. E foi no art. 83, CP onde passaram a se localizar os requisitos legais que quando observados ensejam pelo Juiz da Execução Penal a concessão do Livramento Condicional.

Os requisitos em prol do livramento condicional são de matiz objetiva e subjetiva. Há de se observar, dessa forma, para a concessão do Livramento Condicional: a) um quantum de pena a ser cumprido, b) comportamento carcerário satisfatório, c) reparação do dano havido com a prática delituosa e d) um perfil psicossocial hábil a inferir que o condenado  não incidirá em nova prática delituosa.

O art. 83 do CP, com a redação dada pela reforma de 1984 e com inovação trazida pela lei 13344/2016, tinha o seguinte texto:

Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de condicional liberdade igual ou superior a dois anos, desde que:

I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;

III – comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena, bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído e aptidão para prover à própria subsistência mediante trabalho honesto;

IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-Io, o dano causado pela infração.

V – cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Parágrafo único – Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir. 

 

III – Entendimentos Jurisprudenciais sobre o Livramento Condicional

 

Considerando a redação dada pela reforma de 1984, os Pretórios pátrios engendraram entendimentos sobre o Livramento Condicional:

 

Súmula 441 STJ – A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional.

(Súmula 441, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/04/2010, DJe 13/05/2010)

 

Consoante o art. 131 da LEP, o livramento condicional pode ser concedido pelo juiz da execução, desde que presentes os requisitos do art. 83 do CPB, ouvidos o Ministério Público e o Conselho Penitenciário. A presença dos requisitos objetivos não é suficiente à concessão do livramento condicional se, analisados os requisitos subjetivos, restar constatada prática de faltas graves pelo reiterado descumprimento das condições impostas no regime aberto

TJMG, Processo 1.0000.05.425346-3/001[1], Rel. Des. Armando Freire, DJ 29/11/2005.

 

Negar o livramento condicional ao condenado estrangeiro em situação irregular no país, pelo simples fato de estar impedido de exercer atividade remunerada no mercado formal, impõe condição discriminatória que veda a concessão do benefício apenas por sua própria condição pessoal. A lei penal não exige que o condenado estrangeiro tenha uma promessa efetiva de emprego, com carteira registrada, mas, sim, que tenha condição de exercer qualquer trabalho honesto e lícito para prover sua subsistência e de sua família, ainda que na informalidade da qual sobrevive expressiva parte da população brasileira.

STJ, REsp. 662567/PA, Rel.ª Min.ª Laurita Vaz, 5ª T., DJ 26/9/2005.

 

O acórdão recorrido não dissentiu da orientação desta Corte de que, apesar de a falta grave não interromper o prazo para a obtenção de livramento condicional, o histórico carcerário conturbado do reeducando pode ser utilizado para evidenciar o não preenchimento do requisito subjetivo para a obtenção do benefício. Incidência da Súmula nº 83/STJ.

STJ, EDcl no AgRg no AREsp 787.778/DF, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, 5ª T., DJe 26/09/2016.

 

A teor do art. 112, § 2º, da Lei de Execução Penal, para fazer jus à concessão do livramento condicional deve o apenado satisfazer requisitos de índole objetiva e subjetiva. Entre os últimos, consoante o disposto no art. 83 do Código Penal, está o relativo ao comprovado comportamento satisfatório durante a execução da pena. A prática de faltas graves durante a execução da pena, embora não interrompa o prazo para a obtenção do benefício do livramento condicional (requisito objetivo), afasta o preenchimento do requisito subjetivo, obstando a concessão da benesse, tal qual o acertadamente decidido, in casu, pela Corte de origem.

STJ, HC 266868/SP, Rel.ª Min.ª Alderita Ramos de Oliveira, Desembargadora convocada do TJ/PE, 6ª T., DJe 12/6/2013.

 

IV – O art. 83 à Luz da Redação dada pelo Pacote Anticrime

 

O Pacote Anticrime de 2019 que entrou em vigência no início de 2020 promoveu mudança na redação do art. 83 na porção do inciso III incrementando assim os requisitos legais em prol do Livramento Condicional de natureza subjetiva.

Neste sentido, em relação ao condenado doravante há de ser devidamente comprovado para que haja a concessão do Livramento Condicional: a) comportamento carcerário bom devidamente atestado pela Autoridade penitenciária Administrativa que é o Diretor do estabelecimento penal e que detém o Poder de Disciplina no curso da execução da pena, b) o condenado não pode ter incidido na prática de falta grave nos termo da Lei de Execução Penal (LEP), ex vi art. 50, LEP, c) cumprir as obrigações laborais (trabalho) que lhe são atribuídas pela Administração Penitenciária no curso da execução penal, ex vi art. 28 usque art. 30, LEP, d) capacidade laboral extramuros, vale dizer demonstração que o condenado é apto ao trabalho honesto fora do cárcere.

O art. 83, CP com a reforma do Pacote Anticrime, passou a ter a seguinte redação, in verbis:

Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que:

I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes;

II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;  

III – comprovado:

a) bom comportamento durante a execução da pena;

b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses;

c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e

d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto;

IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;  

V – cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza.

Parágrafo único – Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir.

 

IV – Quadro Comparativo Relativo ao art. 83, CP Antes e Depois da Reforma do Pacote Anticrime

 

Abaixo trago um quadro comparativo onde se pode ter uma visão panorâmica do art. 83, CP antes e depois da redação dada pelo Pacto Anticrime:

Pacote Anticrime

Pacote Anticrime: Art. 83, CP.

V – Questões de Concurso

O tema do livramento condicional tem sido cobrado em provas de concurso da seguinte forma:

 

01 – 2016 – TRF/3ª REGIÃO – TRF/3ª REGIÃO – Juiz Federal Substituto

Se o defensor de um condenado preso entender que ele faz jus ao livramento condicional, deverá:

A) Solicitar ao Tribunal, mediante a impetração de habeas corpus;

B) Solicitar ao Tribunal, mediante a propositura de Revisão Criminal;

C) Solicitar ao Juiz da Execução, mediante Agravo em Execução;

D) Solicitar ao Juiz da Execução, mediante petição.

 

02 – 2018 – CESPE – Polícia Federal – Delegado de Polícia Federal

Acerca de execução penal, de crimes de abuso de autoridade, de crimes contra a criança e o adolescente e de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, julgue o item que se segue. Caberá recurso de apelação contra decisão do juízo da execução penal que indeferir pedido de livramento condicional ao apenado.

(   ) Certo   (   ) Errado

 

03 – 2011 – CESPE – TJ/ES – Analista Judiciário

Acerca do livramento condicional, de incidentes da execução e de recursos, julgue os itens a seguir. No livramento condicional, são condições obrigatoriamente impostas ao condenado: não mudar de residência sem comunicação ao juiz e à autoridade incumbida da observação cautelar e de proteção; recolher-se à habitação em hora fixada; e não frequentar determinados lugares.

(   ) Certo   (   ) Errado

 

04 – 2013 – CESPE – DPE/DF – Defensor Público

De acordo com a Lei de Execução Penal, julgue os itens subsequentes. É pacificado, na jurisprudência do STJ, o entendimento de que o cometimento de falta disciplinar de natureza grave pelo condenado que cumpre pena privativa de liberdade interrompe o prazo para a obtenção do livramento condicional.

(   ) Certo   (   ) Errado

 

05 – 2010 – CESPE – DPU – Defensor Público Federal

No que se refere ao livramento condicional e à suspensão condicional da pena, julgue os itens a seguir. Não se admite a concessão de livramento condicional ao condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.

(   ) Certo   (   ) Errado

 

VI – Gabarito Comentado das Questões

 

Questão 01 – Letra D – O pleito de livramento condicional é feito através de petição feita pelo Advogado do condenado e dirigida ao Juiz da execução penal competente.

 

Questão 02 – Errado – Considerando o que determina o art. 197, LEP: Das decisões proferidas pelo Juiz caberá recurso de agravo, sem efeito suspensivo.

 

Questão 03 – Errado – Levando em conta o que ordena o art. 83, CP: Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes; II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;  III – comprovado: a) bom comportamento durante a execução da pena; b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses; c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto; IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;  V – cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza. Parágrafo único – Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir.

 

Questão 04 – Errado – Tendo em vista o entendimento do STJ esposado na Súmula 441: A falta grave não interrompe o prazo para obtenção de livramento condicional.

 

Questão 05 – Errado – Levando em conta o que ordena o art. 83, CP: Art. 83 – O juiz poderá conceder livramento condicional ao condenado a pena privativa de liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde que: I – cumprida mais de um terço da pena se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons antecedentes; II – cumprida mais da metade se o condenado for reincidente em crime doloso;  III – comprovado: a) bom comportamento durante a execução da pena; b) não cometimento de falta grave nos últimos 12 (doze) meses; c) bom desempenho no trabalho que lhe foi atribuído; e d) aptidão para prover a própria subsistência mediante trabalho honesto; IV – tenha reparado, salvo efetiva impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela infração;  V – cumpridos mais de dois terços da pena, nos casos de condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e terrorismo, se o apenado não for reincidente específico em crimes dessa natureza. Parágrafo único – Para o condenado por crime doloso, cometido com violência ou grave ameaça à pessoa, a concessão do livramento ficará também subordinada à constatação de condições pessoais que façam presumir que o liberado não voltará a delinqüir.

 

VII – Referências Bibliográficas

 

  1. BITENCOURT, Cezar Roberto, Tratado de direito penal: parte geral, 1, São Paulo: Saraiva, 2015.

 

  1. GRECO, Rogério. Código Penal Comentado, Niterói: Editora Impetus, 2017.

 

  1. NUCCI, Guilherme Souza. Código Penal Comentado, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

 

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