Habeas Corpus – Previsão constitucional e interpretação jurisprudencial

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habeas-corpusO habeas corpus, popularmente conhecido pela sua abreviação, HC, é remédio judicial que tem por finalidade evitar ou fazer cessar a violência ou a coação à liberdade de locomoção decorrente de ilegalidade ou abuso de poder. Encontra sua fundamentação constitucional no art. 5º da Carta Magna:

(…) LXVIII – conceder-se-á “habeas-corpus” sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder.

Ao contrário do que popularmente se acredita, o HC não é recurso que busque a reforma ou anulação de decisão judicial; mas verdadeira ação penal popular voltada à tutela da liberdade de locomoção, do direito de ir e vir. Cuida-se, portanto, de ação penal impugnativa, autônoma.
Ordinariamente, tem por finalidade assegurar a liberdade de locomoção das pessoas; no entanto, em situações excepcionais, é eficaz, como remédio constitucional que é, para combater ilegalidades flagrantes, como nos casos de trancamento do inquérito policial e da ação penal, quando desacompanhados da justa causa para sua instauração e ajuizamento, respectivamente.
O HC não se presta, única e exclusivamente, a declarar uma ilegalidade; possuindo verdadeiro caráter mandamental, consistente em determinar que a autoridade coatora cesse imediatamente a constrição ilegal da liberdade do paciente. Aliás, pra quem ainda se estranha com o termo, paciente é a pessoa em favor de quem se ajuíza o remédio heroico, o habeas corpus.
Quando o habeas corpus tem por finalidade afastar o constrangimento ilegal à liberdade de locomoção já efetivado, é denominado liberatório; por outro lado, quando se destina a afastar uma ameaça à liberdade de locomoção, denomina-se preventivo. É liberatório, por exemplo, o HC ajuizado buscando o relaxamento da prisão de preso provisório, por excesso de prazo não atribuível à defesa; e é preventivo, v.g., aquele que garante o direito de não responder às perguntas formuladas por parlamentares, em Comissão Parlamentar de Inquérito.
Qualquer pessoa, independentemente de representação de advogado, pode ajuizar o HC em benefício de quem tenha o seu direito de ir e vir arbitrariamente violado. Para o que se deve atentar, no entanto, é que pode figurar como coator (autor da arbitrariedade) não só a autoridade pública, mas também o particular, uma vez que a Constituição Federal fala não só em coação por abuso de poder, mas também por ilegalidade. Cabe, portanto, contra o Delegado de Polícia, o Promotor de Justiça, o Juiz de Direito, mas também contra a senhora de bem que restringe, injustamente, a saída de sua empregada doméstica do interior da residência, não lhe concedendo folgas semanais, feriados ou férias.
Há, no entanto, restrições constitucionais à utilização do remédio heroico. A Carta Magna dispõe que não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares (Art. 142, § 2º); nem se lhe aplicam as garantias durante a vigência de estado de sítio e/ou estado de defesa. (CF, Arts. 136 e 137).
Segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o HC também não poderá ser utilizado para:
a) impugnar decisões do Plenário ou de qualquer das Turmas do STF, visto que esses órgãos, quando decidem, representam o próprio Tribunal;
b) impugnar determinação de suspensão dos direitos políticos;
c) impugnar pena advinda de decisão administrativa de caráter disciplinar (advertência, suspensão, demissão, etc.), pois estas não implicam restrição ao direito de locomoção;
d) impugnar decisão condenatória à pena de multa, ou relativa a processo em curso por infração penal a que a pena pecuniária seja a única cominada (súmula 693 do STF);
e) impugnar a determinação de quebra de sigilo telefônico, bancário ou fiscal, se desta medida não puder resultar em condenação à pena privativa de liberdade;
f) discutir o mérito das punições disciplinares militares, salvo para apreciação dos pressupostos da legalidade de sua aplicação;
g) Nas punições em que extinta a punibilidade (Súmula 695 do STF);
h) Nas hipóteses em que o ato atacado não afeta o direito de locomoção; vedada a aplicação do princípio da fungibilidade;
i) Nos afastamentos dos cargos públicos por questões penais ou administrativos;
j) Na preservação de direitos fundamentais que não a liberdade da locomoção de ir e vir, salvo manifesta teratologia e influência na liberdade de locomoção;
k) Contra decisão de relator de Tribunal Superior ou juiz em HC originário, que não concede o provimento liminar, porquanto erige prejudicialidade no julgamento do próprio meritum causae;
l) Contra decisão de não conhecimento de HC nos Tribunais Superiores uma vez que a cognição meritória do habeas corpus pelo STF importa em supressão de instância; salvo manifesta teratologia ou decisão contrária à jurisprudência dominante ou pela Corte Suprema.
Por fim, e não menos importante, é preciso chamar a atenção para a competência do Supremo Tribunal Federal para o julgamento de HC ajuizado em face de decisão de turma recursal dos Juizados Especiais Criminais (E-690/STF).
Muito embora a jurisprudência dos tribunais superiores venha, paulatinamente, restringindo a utilização do Habeas Corpus, a fim de evitar que este perca sua finalidade constitucional, e deixe de ser utilizado como forma de recurso substitutivo; não se nega que, desde seu surgimento na Inglaterra medieval, com a edição da Magna Charta Libertatum do Rei João sem Terra, no final do Séc. XIII, tem tal instrumento o caráter heroico de remédio contra a arbitrariedade e o abuso de poder que violem o direito fundamental de liberdade. Longa vida ao Act of Habeas Corpus!

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Flávio Milhomem – Mestre em Ciências Jurídico-Penais, Doutorando em Direito e Políticas Públicas, Docente nas disciplinas de Direito Penal e Processo Penal desde 1997, Docente titular do curso de Direito (bacharelado) e da pós-graduação do Instituto Brasiliense de Direito Público – IDP, Brasília/DF, professor de cursos preparatórios para concursos, Promotor de Justiça Criminal do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios desde 1.997.

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