Neste momento triste para os brasileiros e insuportavelmente doloroso para as famílias das vítimas da tragédia aérea que ceifou dezenas de vidas com a queda do avião que transportava a equipe da Associação Chapecoense de Futebol, não podemos esquecer que estamos frente a um típico acidente de trabalho, matéria do dia-a-dia dos advogados trabalhistas representados pela ABRAT.
Acidente de trabalho sim, porque estes atletas, muitos ainda meninos, estavam exercendo a sua profissão, cumprindo um contrato de trabalho. Da mesma forma, os profissionais da imprensa, os tripulantes e muitos outros, lá estavam por conta de um trabalho, no exercício de uma profissão.
A semente maligna deste acidente foi ganância, a cobiça, o jeitinho mais barato, a forma mais econômica de prestação de um serviço de transporte, quando deveria prevalecer o mais seguro, o mais confortável, o mais garantido, mais digno.
Por que optar por um transporte terceirizado da Bolívia quando isto poderia ser executado por empresas brasileiras com mais segurança, com métodos de trabalho mais responsáveis, com mais profissionalismo e sujeitas a rigorosa fiscalização? A resposta é que o custo com o transporte alternativo de terceiros era certamente menor. E assim era porque desprovido de item de segurança elementar para realizar a tarefa. Essa afirmação é pelo que dizem as vozes especializadas.
Certamente temos no Brasil empresas aptas a realizar semelhantes tarefas com mais segurança e responsabilidade e, o que impediu que se optasse por meios mais seguros foi, provavelmente, o preço mais alto.
Em se tratando de um acidente de trabalho típico como este, o episódio deve servir para profundas e sérias reflexões sobre o que ocorre diuturnamente e, porque não, “noturnamente”, com milhares de trabalhadores brasileiros, anônimos, pobres, sem especialização, sem carteira assinada e sem contrato, a grande maioria terceirizados, que prestam serviços a empresas sem estrutura, que relegam regras básicas de segurança, que substituem os cuidados com a vida, com a saúde e com o bem estar pelo lucro total ou fácil.
Trabalhadores transportados em ônibus em péssimas condições no meio rural são flagrados com frequência pelas autoridades e muitos deles são vítimas de acidentes fatais e essas notícias não nos chegam. São anônimos, sem nome, sem time, sem garantias, sem direitos, mas todos com família, com filhos, pais, irmãos e amigos, que também choram. Mas a notícia não nos chega e, por isto, não nos abalamos.
O que temos de diferente entre a tragédia aérea recente e outros diversos acidentes de trabalho, que matam centenas de profissionais diariamente em seus postos, é o fato de que os trabalhadores, de um modo geral, não estão na mesma comunidade, não pertencem a mesma agremiação desportiva e estão, geralmente, longe da mídia. O que eles guardam de comum é que são trabalhadores, são pais, são filhos, maridos ou mulheres. São queridos tanto quanto nossos jovens atletas e profissionais que desapareceram neste trágico acidente. A diferença é que só os próximos sabem, sentem, choram e lamentam a perda.
Precisamos refletir e nos conscientizar cada vez mais de que é necessária permanente vigilância contra as más condições de trabalho, contra a terceirização que mata, contra o vale-tudo pelo lucro.
Os acidentes aéreos são rigorosamente investigados para que não se repitam e também para proporcionar mais segurança aos usuários, para projetar mais confiança neste meio de transporte cada vez mais utilizado pelo homem, para poupar vidas, para proporcionar conforto. Em razão disto, são aprimoradas as técnicas de segurança e impõem-se mais rigor no treinamento de profissionais, aperfeiçoam-se os manuais de procedimento. Estes cuidados devem nortear também, de forma permanente, quaisquer outras atividades que envolvam riscos aos trabalhadores, estejam eles na terra, na água ou no ar, sejam atletas ou boias-frias, sejam profissionais de imprensa ou analfabetos, afinal, são todos trabalhadores, e que se elimine, de uma vez por todas, a ganância como um dos fatores de risco.
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