A palavra “sabotagem” vem do francês sabot, “tamanco”, aquele sapato de madeira, muito usado na época da Revolução Industrial iniciada no século XVIII. Atribui-se a origem do termo ao ato deliberado dos trabalhadores insatisfeitos do período de quebrar as máquinas da indústria jogando nelas os sapatos. Ações de sabotagem contra terceiros como essa são frequentes. Em guerras, por exemplo, não raro soldados cortam os pneus ou esvaziam os tanques de combustível dos carros; nas disputas comerciais mundo afora, incêndios criminosos são provocados em prédios das empresas rivais; na política, fatos depreciativos do adversário costumam ser trazidos a público, nem sempre de forma legítima.
Além desses tipos de sabotagem tradicional, praticados de forma consciente por rivais na política ou no comércio, há outro, hoje talvez até mais comum e que tem relação direta com o contexto do concurseiro: a autossabotagem. É quando, conscientes ou não, sabotamos nosso próprio futuro, nosso próprio sucesso, nossos próprios sonhos. Você, concurseiro, precisa aprender a reconhecer os indícios de que está em um ciclo de autossabotagem para sair dele e finalmente alcançar seus objetivos. Tenho algumas dicas para ajudá-lo nisso e vou compartilhá-las com você hoje, mas esclareço desde logo: elas reúnem alguns dos ensinamentos do coach Gerônimo Theml. Não preciso nem dizer o quanto seria bom você segui-lo também, não é?
Vejamos primeiro um exemplo de autossabotagem. Sabe aquela pessoa que tem evidente dificuldade de dizer “não” e, assim, acaba pondo as necessidades dos outros à frente das suas sempre? Pense por um instante: por que ela faz isso? Certamente deve haver um ganho imediato a lhe proporcionar alguma satisfação. Quem sabe ela se sinta querida ao ser prestativa? Quem sabe tenha receio de, ao se recusar a colaborar, ser vista como individualista? Quem sabe o problema seja mais profundo e ela esteja inconscientemente buscando desculpas para se esquivar de fazer algo que, no nível da consciência, sabe que precisa fazer? Ora, leitor amigo, ajudar os outros soa nobre, não é mesmo? Parece a desculpa perfeita quando precisamos de um pretexto para não fazer uma dada tarefa, concorda?
Por favor, não me entenda mal: longe de mim orientá-lo a não amparar os outros. Mencionei apenas um clássico caso de autossabotagem. O fato é que ninguém consegue dar uma força a todos o tempo todo sem se prejudicar e atrapalhar o próprio futuro. Para piorar, talvez justamente nesse futuro o indivíduo pudesse usar tudo que conquistou em favor de mais e mais pessoas. Percebe como o ciclo de autossabotagem se fecha?
“Certo, compreendi, mas como faço para saber se estou me autossabotando?”, você pode perguntar. É simples. Você descobre isso ao sentir a dor de não ter conseguido concretizar seus sonhos, ao notar que não vem caminhando rumo a seu objetivo no ritmo idealizado. No exemplo da pessoa prestativa e disposta a ajudar todo o mundo ao mesmo tempo, logo depois da satisfação pelo dever cumprido, vem aquele familiar sentimento de frustração por ter mais uma vez adiado os próprios projetos. Essa dor é o maior indício da autossabotagem.
Eis algo interessante a respeito da sabotagem que infligimos a nós mesmos: muitas vezes, ela tem origem em um mecanismo de autoproteção desenvolvido por nós lá atrás, em nossa infância. Para entender melhor, visualize, por exemplo, uma criança vivendo em um lar violento, no qual ela precise se esquivar de confrontos quase diários para sobreviver. Imagine que, anos mais tarde, ela tenha se tornando extremamente hábil em fugir de problemas. Agora, em outro exemplo, ponha-se no lugar de um menininho cujos pais só lhe dão a merecida atenção quando ele entrega um resultado extraordinário qualquer. Pense nesse menino se transformando em um jovem adulto hiper-realizador.
Note bem: embora as competências dessas duas pessoas hipotéticas pareçam boas, podem resultar em algum grau de autossabotagem. Alguém que viva fugindo dos problemas jamais vai alcançar grandes feitos; afinal, conflitos são essenciais para determinadas realizações. Eventualmente teremos problemas a enfrentar e precisaremos ter coragem para tanto. Um hiper-realizador, por sua vez, ao cobrar muito de si mesmo e deixar de comemorar as pequenas vitórias, em algum momento pode sucumbir à estafa mental ou física e paralisar. Veja que interessante: a autossabotagem pode até nascer de algo bom, mas, como sabemos, tudo em excesso é prejudicial.
Então quais são os perfis mais comuns do autossabotador? Segundo Gerônimo Theml, são nove:
- Perfil insistente;
Na medida certa, a insistência pode ser a base para o sucesso; mas, se cruzar a linha do saudável e se desdobrar em perfeccionismo, pode resultar em lentidão, exaustão, frustração e até mesmo depressão.
- Perfil prestativo;
Como vimos, o excesso de prestatividade pode maquiar um ciclo de autossabotagem. Ajudar os outros, claro, faz bem para a alma, mas dizer não de vez em quando é salutar para evitar a autodestruição.
- Perfil hipervigilante;
Há quem gaste muita energia preocupando-se com eventualidades que muito provavelmente nunca ocorrerão de fato. Manter-se vigilante é bom, mas cuidado para a preocupação não se tornar uma neurose, fonte de imensa dor.
- Perfil controlador;
A pessoa que sabota a si mesma faz de tudo para manter TUDO sob controle. Não se trata de ser mais ou menos organizado, mas de ansiar por controle absoluto de todas as etapas de um processo, em um nível absurdo de detalhamento. Se considerarmos o quão imprevisível nossa vida é, logo concluiremos que esse grau de controle é inviável e tem grande chance de se transformar em autossabotagem.
- Perfil esquivo;
Mal acontece algo um pouco mais complicado, lá vai o esquivo tomar sorvete na praia. Obviamente, os problemas não se resolvem sozinhos e vão se acumulando, até explodirem. Um pai com esse perfil abandona facilmente a educação dos filhos, uma vez que educar demanda confronto de ideias e envolvimento. Ora, relaxar no sofá é muito mais cômodo! Em algumas circunstâncias, esquivar-se de conflitos pode nos manter vivos, então é mesmo importante saber escolher bem as batalhas a enfrentar. Todavia, quando a esquiva se torna a regra, preparamos o palco para o fracasso. Fugir dos problemas, dos conflitos e das decisões difíceis pode até ajudar, mas a fronteira entre o razoável e o danoso, aqui, é muito tênue.
- Perfil hiper-realizador;
Ficar em segundo lugar, para uma pessoa assim, é fonte de frustração, mesmo que tal posição derive de um resultado excelente. Tirar 9,9 em uma prova cuja nota máxima era 10 é motivo de sofrimento para quem tem o perfil de fazer tudo no nível máximo esperado. Muitos bilionários têm características de hiper-realizadores, mas tomam cuidado para não se deixarem corroer pela tendência ao perfeccionismo e acabarem se sabotando após pequenas derrotas. Um hiper-realizador com tudo pra dar certo pode se tornar um fracassado deprimido se não demonstrar gratidão pelas pequenas conquistas nem comemorá-las; se não deixar de se cobrar em excesso, enfim.
- Perfil inquieto;
Você é criativo e dotado de tanta energia, que não consegue parar quieto e está sempre pensando no que fazer em seguida? Isso pode parecer ótimo, não é mesmo? Mas há um problema: a inquietude é inimiga da tranquilidade necessária à conclusão de um projeto de cada vez. Pessoas com perfil inquieto dificilmente conseguem se manter em um mesmo lugar pelo tempo necessário e têm dificuldade para realizar algo que exija ações de médio ou longo prazo.
- Perfil de vítima;
Conhece alguém assim, que sempre atribui a culpa por uma falha qualquer a um terceiro, seja este o governo, o chefe, o clima, a banca organizadora do concurso? A responsabilidade nunca é do indivíduo, que se enxerga como o maior injustiçado do mundo e reclama de tudo, mantendo-se pessimista em relação ao universo e à sua posição dentro dele.
- Perfil hiper-racional.
Embora tenha forte poder de análise e de racionalização dos fatos, uma pessoa que sabota a si mesma tende a calcular tudo com exagero. É curioso, pois ela costuma ficar indecisa com questões bem simples, tudo porque insiste em prever um número infinito de situações com base em uma pretensa lógica. Não consegue, por exemplo, decidir logo qual caminho seguir em uma viagem porque precisa calcular qual estrada será mais rápida, segura e prática. Faz tantas contas que termina sem tomar decisão alguma. Tem um pouco do perfil controlador, porém com óptica mais voltada à lógica como guia de vida.
Posso dizer que me identifico bastante com o perfil do hiper-realizador. E você, concurseiro, se identifica com esse ou algum outro? Se a resposta for sim, fique tranquilo. Saber qual é o seu perfil é de extrema importância. Autoconhecer-se é fundamental em todos os aspectos da vida, sobretudo para evitar a autossabotagem. Conheça-se a si mesmo e saiba quais são os gatilhos que o atrapalham de maneira consciente ou inconsciente. Pode ter certeza: ter esse nível de sabedoria a seu respeito é uma tremenda vantagem.
Concluo nossa conversa de hoje pedindo para você alinhar bem o seu discurso com seus objetivos. Evite palavras sabotadoras como “tentar”, “quero”, “preciso”, “acho”, “tenho de”, “mas”, “porém”, “talvez” e afins, especialmente na hora de definir metas. Se você disser “Vou tentar estudar 30 horas esta semana” ou “Tenho de estudar 30 horas esta semana”, estará modulando a ação e antecipando o fracasso. Ora, a mera tentativa de estudar atende a primeira parte da proposição, o que produzirá em você uma falsa sensação de dever cumprido. A segunda parte da frase, por sua vez, não gera nenhuma necessidade de ação. A tendência será você falhar miseravelmente em seu propósito.
Todos nós entendemos a necessidade de estudar, trabalhar, dar nosso melhor. Somos plenamente capazes de quantificar as horas de estudo necessárias e, em alguns casos, até mesmo de detalhar o que precisamos fazer nessas horas. Então mude a proposição para algo como “Vou estudar 30 horas nesta semana, faça sol, faça chuva” e evolua ao longo do tempo para, quem sabe, definir a forma como será o estudo. Quanto mais detalhada a frase, melhor.
Percebeu a diferença entre uma sentença de características autossabotadoras e outra voltada para o sucesso? Não para por aí. Articuladores como “mas” precisam ser desprezados porque funcionam como desculpa, como forma de anular na mente tudo que vem antes deles. “Eu ia estudar 30 horas esta semana, mas não vai ser possível porque não tenho tempo (ou dinheiro…).” Ignore esse “mas”! Sempre existirão inúmeros deles para justificar sua inércia.
Vamos acabar com a autossabotagem que está prejudicando nossos sonhos! Combinado?
Se a resposta é “sim”, registre nos comentários: “Parei de me autossabotar!” e junte-se a nós, do Gran, rumo a um novo patamar.
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Gabriel Granjeiro – Diretor-Presidente e Fundador do Gran Cursos Online. Vive e respira concursos há mais de 10 anos. Formado em Administração e Marketing pela New York University, Leonardo N. Stern School of Business. Fascinado pelo empreendedorismo e pelo ensino a distância.