Comum acordo nos dissídios de natureza econômica

Por
2 min. de leitura

Dispõe o art. 114, § 2º, da CR/88 que “Recusando-se qualquer das partes à negociação coletiva ou à arbitragem, é facultado às mesmas, de comum acordo, ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica, podendo a Justiça do Trabalho decidir o conflito, respeitadas as disposições mínimas legais de proteção ao trabalho, bem como as convencionadas anteriormente.”.

No RE 1.002.295 (Tema 841 da tabela de Repercussão Geral do STF) foi fixada a tese de que é constitucional a exigência de comum acordo entre as partes para ajuizamento de dissídio coletivo de natureza econômica, conforme o art. 114, § 2º, da CR/88, na redação dada pela EC 45/2004.

Trata-se de pressuposto processual intransponível, cuja ausência conduz à extinção do feito sem exame do mérito. Não é exigido nos dissídios coletivos de greve. Desse modo, apenas havendo mútuo acordo ou em casos de greve, é que o dissídio de natureza econômica pode tramitar na Justiça do Trabalho. Também não se exigirá mútuo acordo se, no curso de dissídio coletivo de natureza econômica, for deflagrada a greve.

Nada obstante, a SDC firmou o entendimento de que a concordância do sindicato ou do membro da categoria econômica para a instauração da instância não precisa ocorrer, necessariamente, de maneira expressa, podendo, em algumas hipóteses com particularidades fáticas e jurídicas que a distinguem dos casos que formaram a jurisprudência dominante sobre o assunto, materializar-se de forma tácita.

Hipóteses aceitas pela jurisprudência do comum acordo tácito[1]:

A hipótese mais frequente de se considerar a anuência tácita consiste na constatação da ausência de insurgência expressa do ente patronal quanto à propositura do dissídio coletivo, no momento oportuno (defesa no processo coletivo instaurado). Nessa circunstância, por se tratar de direito disponível das partes, considera-se configurada a concordância implícita para a atuação da Jurisdição Trabalhista na pacificação do conflito coletivo econômico;

Além do caso acima, o TST também tem vislumbrado a conformação da concordância tácita em hipóteses nas quais se revela a prática de ato incompatível com o pedido de extinção do processo por ausência de comum acordo. Comumente, atos dessa natureza são identificados no curso processual, quando se verifica manifestação do segmento patronal que o desvincula da anterior arguição da ausência de comum acordo como óbice à instauração da instância. Por exemplo: o consentimento com parcela significativa das cláusulas reivindicadas pelo sindicato obreiro, resultando na homologação de acordo parcial pelo Tribunal e, consequentemente, na concordância subjacente para a atuação do poder normativo em relação às cláusulas residuais e remanescentes; ou o próprio assentimento expresso com a instauração do dissídio coletivo, durante o andamento do processo e após a arguição da preliminar em contestação (na audiência de conciliação, por exemplo);

Recentemente, a SDC reconheceu situação excepcional de conduta patronal na fase pré-processual (fase privada de negociações) capaz de configurar a aquiescência tácita para a submissão do dissídio de natureza econômica à Justiça do Trabalho: o segmento patronal, depois de meses de negociação sem êxito, não se opôs expressamente à submissão da questão ao Poder Judiciário, mesmo manifestamente ciente da pretensão do sindicato profissional de buscar a pacificação do conflito coletivo mediante a atuação do Poder Judiciário (ROT-11048-49.2020.5.03.0000, Redator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 03/03/2022). Assim, naquela situação, também se revelou a permissão implícita do segmento patronal;

Outrossim, se o segmento patronal participa do processo negocial sem demonstrar o mínimo de comprometimento na busca dessa solução autônoma, a simples objeção injustificada à instauração da instância não pode gerar o efeito extintivo obrigatório do dissídio coletivo, sem exame do mérito, em seu benefício, sob pena de se convolar o instituto do comum acordo em instrumento de submissão da demanda à vontade unilateral de uma das Partes – condição puramente potestativa, cuja vedação é explícita em nosso ordenamento jurídico (art. 122, in fine, do CCB).

Em síntese, a partir do exame dos diversos julgados desta Corte que identificaram hipóteses fáticas distintas e não tratadas na jurisprudência acerca da exigência do pressuposto processual, conclui-se que a arguição da ausência do comum acordo para o ajuizamento do dissídio coletivo apenas produz os efeitos processuais a favor do segmento patronal se a sua conduta – na fase processual ou na pré-processual – estiver em consonância com o princípio da lealdade e transparência dos sujeitos coletivos (princípio da boa-fé objetiva na negociação coletiva), o qual tem como escopos a vedação do comportamento contraditório e o dever de cooperação para a busca da solução pacífica e consensual dos conflitos.

[1] Por todos: ReeNeceRO-ROT-1002141-37.2016.5.02.0000, SDC, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 21/10/2022.

Por
2 min. de leitura