O fracionamento dos sindicatos pode se dar por meio de desmembramentos ou dissociações das categorias econômicas e profissionais. A Jurisprudência e a doutrina, entretanto, não apresentam uma posição uniforme com relação aos termos utilizados, sendo que por vezes utilizam as expressões descentralização ou desconcentração como substitutas destes termos ou mesmo as divisões em fracionamento subjetivo ou objetivo. O fato é que são duas, basicamente, as situações em que se permite o fracionamento das categorias: o baseado no critério geográfico e o no da especificação da categoria.
Parte da jurisprudência e da doutrina diz que o sistema sindical brasileiro comporta a possibilidade de criação por dissociação (categorial/especificação x agregação da categoria ou subjetiva ou desconcentração) e de criação por desmembramento (geográfico ou objetivo ou descentralização). A primeira refere-se à criação de sindicato para representar categoria mais específica antes contemplada em sindicato mais abrangente. A segunda relaciona-se à criação de sindicato para representar categoria em base territorial mais reduzida, observado o módulo municipal, nos termos do art. 571 da CLT[1].
O art. 571 da CLT consagra o princípio da especificidade. Assim, a dissociação, impropriamente designada de desmembramento, é apanágio legal da categoria e célula-mater do sindicalismo, sendo certo que o sindicato não se desmembra nem é desmembrável e as categorias associadas ou reunidas para constituir sindicato é que podem se dissociar.
Nada impede este chamado ‘desmembramento’ da categoria, segundo o princípio legal da especificidade, através da dissociação, admitida pelo art. 571, da CLT, um sindicato eclético, constituído por ramos não específicos, porém similares ou conexos, que pode sofrer redução em sua representação por determinada categoria, a ele, até, então, acoplada simplesmente pelo critério genérico da mera similitude ou conexão.
Dá-se, assim, a especialização, do ramo de representatividade sindical, de categoria genérica para categoria específica, que, mediante registro, torna-se autônoma. Assim, as categorias formadas a partir de atividades similares e conexas compõem as chamadas categorias ecléticas, que podem ser dissociadas em categorias específicas de atividades idênticas (art. 571, CLT).
Ocorre desmembramento quando a entidade é fracionada mantendo-se a mesma categoria (de atividades idênticas, similares ou conexas), mas alterando-se a base territorial. Já na dissociação, há cisão da própria categoria, ainda que seja na mesma base territorial do sindicato preexistente.
Quanto às espécies de desdobramento sindical, explica a doutrina: “O desmembramento tanto pode ser geográfico, pela divisão da ocupação de espaço, capilarizando-se a presença sindical, criando-se nova(s) entidade(s) para atuar especificamente em parte do território que antes estava coberto por uma entidade-matriz, com jurisdição em múltiplos municípios, quanto pode ser categorial, pela valorização do critério da especialização e da especificidade, fazendo-se com que de um sindicato, antes congregando duas categorias, surjam, pela vontade dos próprios interessados, duas entidades, cada uma tratando dos interesses peculiares de uma só delas”. (CHIARELLI, Carlos Alberto Gomes. Trabalho na constituição. Vol. II, São Paulo: LTr, 1990, p. 35).
O desmembramento ou a dissociação independe do consentimento da entidade sindical pré-existente. Mas, de todo modo, se deve respeitar a unicidade. Ainda, deve haver autorização das categorias respectivas em assembleia especificamente convocada para este fim; deve ter o registro em cartório de Títulos e documentos, bem como registro no Cadastro Nacional de entidades sindicais.
Além disso, tem se entendido pela jurisprudência do STF (RMS 21305 e RE 2141935-8/DF), que não poderá haver fracionamento de categoria quando existir esvaziamento do conceito de categoria, que se dá quando se criam sindicatos baseados em meras funções exercidas ou ainda quando se tem o desmembramento de categorias profissionais diferenciadas.
RECURSO ORDINÁRIO EM DISSÍDIO COLETIVO. REPRESENTAÇÃO DE SEGMENTO EMPRESARIAL. ESPECIFICIDADE. PORTE. LEGITIMIDADE. A regra geral para a dissociação sindical fundamenta-se na especificidade do labor ou da atividade empresarial, a teor dos artigos 570 e 571 da CLT. É inviável a representação de segmento de categoria profissional ou econômica com base no maior ou menor porte de cada ramo ou do empreendimento, consoante a Orientação Jurisprudencial 23 da SDC do TST. (TST – ED-RODC – 2027000-52.2006.5.02.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Data de Divulgação, Rel. Márcio Eurico Vitral Amaro, DEJT 21/11/2008)
Dissociação: Critério da Especialização x Critério da Agregação
Mauricio Godinho Delgado critica o critério da especialização que, segundo ele, leva à fragmentação. Aponta que o critério consentâneo com o associativismo e com o regime democrático é da agregação. Godinho explica que o enfraquecimento e pulverização sindical no Brasil se dá justamente pela adoção, inclusive pela jurisprudência majoritária, do critério da especialização. Afirma que o melhor seria aplicação do critério da agregação. O critério da especialização, embora seja critério válido e funcional ao exame de inúmeras questões na vida social e econômica, especialmente questões reguladas pelo Direito Civil, não é, claramente, o critério de classificação e avaliação mais adequado ao exame das estruturas dos sindicatos, ou seja, o cerne das questões principais do Direito Coletivo do Trabalho. Neste campo jurídico sabe-se que as entidades sindicais visam, precipuamente, por meio de seu fortalecimento, a criar condições mais equânimes de equalização e diálogo perante o poder empresarial. Tais condições não se alcançam com o fracionamento, com a incessante especialização, porém, ao revés, com a agregação, a unificação das respectivas entidades associativas. A história e conceito de associações sindicais remete-se ao apelo da união, da unidade, da agregação – e não seu inverso. De fato, a ideia de similitude de condições de vida e labor, em função de vínculo dos obreiros a atividades econômicas empresariais similares ou conexas (ideia que forma o núcleo do conceito de categoria) permite o alargamento dos sindicatos – e não, necessariamente, seu definhamento, como verificado na década de 1990. Entretanto, não obstante essas ponderações, torna-se necessário enfatizar que a jurisprudência do STF e a dominante no TST tem insistido na adoção do critério da especialidade, considerando-o mais consentâneo com os princípios da liberdade de associação e da autonomia sindical. Nesse quadro interpretativo hegemônico, havendo especialização relativamente à nova entidade resultante do desmembramento do sindicato mais amplo e sendo respeitada a base territorial mínima do Município quanto a essa nova entidade, tem essa jurisprudência prevalecente tendido a considerar válida a criação de nova entidade sindical. Veja acórdão de relatoria do Ministro Maurício Godinho Delgado, no qual a terceira turma do TST, no julgamento do processo RR-126600-88.2010.5.16.0020, definiu como legítimo e representativo o sindicato que comprovadamente melhor atendeu o princípio da agregação, do fortalecimento sindical, em vez do critério da especialidade, que a Turma considerou permissivo do fracionamento e da pulverização dos sindicatos:
RECURSO DE REVISTA. REPRESENTAÇÃO SINDICAL. INFERÊNCIA DO SINDICATO MAIS REPRESENTATIVO E LEGÍTIMO, AFIRMATIVO DA UNICIDADE CONSTITUCIONALMENTE DETERMINADA. PRINCÍPIO DA AGREGAÇÃO SINDICAL COMO DIRETRIZ REGENTE DESSA ANÁLISE. SINDICATO OBREIRO MAIS AMPLO, ABRANGENTE, FORTE E REPRESENTATIVO, USUALMENTE MAIS ANTIGO, EM DETRIMENTO DO SINDICATO MAIS RESTRITO E DELIMITADO, USUALMENTE MAIS RECENTE. AGREGAÇÃO SINDICAL PRESTIGIADA PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E PELO TRT DE ORIGEM. A Constituição Federal afastou a possibilidade jurídica de intervenção e interferência político-administrativas do Estado, via Ministério do Trabalho e Emprego, no sindicalismo (art. 8º, I, CF/88). Reforçou o papel dos sindicatos na defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais e administrativas (art. 8º, III, CF/88). Alargou os poderes da negociação coletiva trabalhista, sempre sob o manto da participação sindical obreira (art. 8º, VI; art. 7º, VI, XIII, XIV e XXVI, CF/88). Entretanto, manteve o sistema de unicidade sindical (art. 8º, II, CF/88), no sentido de estruturação por categoria profissional ou diferenciada, com monopólio de representação na respectiva base territorial, preceito direcionado no texto constitucional às organizações sindicais de qualquer grau (art. 8º, II, CF). Decidiu o TRT o conflito intersindical com suporte no princípio da agregação, de modo a identificar como mais legítimo e representativo o sindicato com categoria profissional mais larga e abrangente, além de mais antigo, que na hipótese é o Sindicato dos Trabalhadores na Agricultura Familiar de Joselândia. Esse sindicato representa diversos trabalhadores enquadrados como rurais, entre os quais os agricultores e agricultoras que exerçam suas atividades individualmente ou em regime de economia familiar, portanto, de forma mais ampla do que o segmento específico e delimitado referenciado pelo outro sindicato mais recente (SINTRAF). Esse entendimento ajusta a interpretação ao melhor e mais consistente sentido objetivado pelo Texto Máximo de 1988 (art. 8º, I, II e III, CF). A diretriz da especialização pode ser útil para a análise de certos aspectos de outras relações jurídicas, sendo porém incompatível para a investigação da estrutura sindical mais legítima e representativa, apta a melhor realizar o critério da unicidade sindical determinado pela Constituição (art. 8º, I e II CF/88) e concretizar a consistência representativa que têm de possuir os sindicatos (art. 8º, III e VI CF/88). Para esta investigação sobre a legitimidade e representatividade dos sindicatos torna-se imprescindível, portanto, o manejo efetivo e proporcional do princípio da agregação, inerente ao Direito Coletivo do Trabalho. Sendo assim, o recurso de revista não preenche os requisitos previstos no art. 896 da CLT, pelo que inviável o seu conhecimento. Recurso de revista não conhecido. (TST, 3ª Turma, RR-126600-88.2010.5.16.0020; publicação 01/07/2013).
Assim, pelo critério da agregação, devem ser observados outros critérios para a definição da representatividade os seguintes: quantitativos, institucionais, ideológicos, funcionais, estruturais. Então, a representação sindical a ser aferida pela Justiça do Trabalho não pode se limitar a critérios burocráticos, pautado unicamente em registros no órgão competente, sem que se tenha uma concreta inspeção sobre a efetiva capacidade de determinado ente sindical de defender os interesses de uma categoria.
Referências
[1] Art 571 da CLT. Qualquer das atividades ou profissões concentradas na forma do parágrafo único do artigo anterior poderá dissociar-se do sindicato principal, formando um sindicato específico, desde que o novo sindicato, a juízo da Comissão do Enquadramento Sindical (não recepcionado – art. 8º, I, CR/88), ofereça possibilidade de vida associativa regular e de ação sindical eficiente.
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