(IM)Possibilidade de o assistente de acusação ser ouvido como testemunha no âmbito do processo penal.

Por
2 min. de leitura

Olá pessoal, tudo certo?

Nesse final de ano, peguei-me parado fazendo algumas reflexões e, claro, também exercendo a minha criatividade, colocando-me na posição de examinador (“coração peludo”) e imaginando questões inéditas e interessantes que podem ser feitas a vocês nos próximos certames públicos, mormente na área de processo penal.

Nessa toada, uma das questões por mim idealizadas e que pode ser decisiva para a sua aprovação seria: “Candidato, é possível realizar oitiva do assistente de acusação como testemunha?”.

Calma. Antes de se alegrar ou se desesperar, vamos entender e revisar, combinado?

O assistente de acusação, tecnicamente, nada mais é do que a vítima ou seu representante legal. Nos termos do artigo 269 do Código de Processo Penal, a intervenção na qualidade de assistente da acusação poderá ocorrer em qualquer momento da ação penal, desde que ainda não tenha havido o trânsito em julgado, sendo certo que o assistente recebe a causa no estado em que se achar. Ou seja, a primeira conclusão que devemos ter é que o assistente atua objetivamente durante a fase judicial da persecução penal, razão pela qual toda questão que trouxer sua atuação na fase investigativa estará errada. Afirmo isso pelo simples fato de NÃO existir assistente de acusação antes da formalização efetiva da própria acusação (com a ação penal proposta).

Curial se revela registrar que o artigo 271 do Código de Processo Penal preceitua que “ao assistente será permitido propor meios de prova, requerer perguntas às testemunhas, aditar o libelo e os articulados, participar do debate oral e arrazoar os recursos interpostos pelo Ministério Público, ou por ele próprio, nos casos dos arts. 584, § 1º, e 598“. Portanto, consoante reza o supramencionado dispositivo, na qualidade de auxiliar do Ministério Público no curso do processo penal, o assistente de acusação tem o direito de produzir provas, inclusive de arrolar testemunhas, haja que, caso contrário, não teria como exercer o seu papel na ação penal pública.

Ao analisarmos o CPP, verifica-se que o seu art. 202 anota que “toda pessoa poderá ser
testemunha”, sendo que o artigo 208 do mesmo diploma normativo ressalva que “não
se deferirá o compromisso a que alude o art. 203 aos doentes e deficientes mentais e
aos menores de 14 (quatorze) anos, nem às pessoas a que se refere o art. 206”. De acordo com a doutrina, “a norma processual é bastante clara ao estipular que toda pessoa pode ser testemunha”, razão pela qual “as pessoas consideradas de má reputação (…), imaturas (…), interessadas no deslinde do processo (…), mitômanas, emotivas ou de qualquer outro modo afetadas, podem ser testemunhas, devidamente compromissadas, embora o juiz tenha plena liberdade para avaliar a prova produzida”[1].

Em um precedente analisado pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, em 18 de agosto de 2020, houve interessante ponderação acerca da (im)possibilidade de oitiva de assistente de acusação na qualidade de testemunha. Asseverou-se inexistir qualquer óbice à colheita do depoimento da mãe da vítima, que também atuou como assistente de acusação, cabendo ao magistrado aferir o valor probatório das declarações por ela prestadas.

É correto indicar que esse entendimento é majoritário no âmbito jurisprudencial. Em outro recente precedente, analisando situação similar do ponto de vista jurídico, a Corte apontou que “sendo a mãe, representante da ofendida, não há qualquer ilegalidade em seu
depoimento, mesmo sendo ela a assistente da acusação. Prosseguindo, conforme consignado pela Corte de origem, no processo penal, não há vedação legal para a oitiva da vítima ou
sua representante legal, quando figuram como Assistentes de Acusação, podendo suas declarações serem valoradas para formação do livre convencimento motivado do Magistrado, em busca da verdade real, tanto que a jurisprudência é remansosa
em admitir o depoimento da vítima e de seus parentes como meio de prova, pois, caso contrário todos os crimes praticados na clandestinidade (sem testemunhas presenciais), ficariam impunes, mormente em relação aos cometidos contra a dignidade sexual, como no caso. Em síntese, inexiste qualquer óbice à colheita do depoimento da mãe da vítima, que também atuou como assistente de acusação, cabendo ao magistrado oficiante quando do julgamento do acusado, aferir o valor probatório das declarações por ela prestadas”[2].

Espero que tenham compreendido! É um assunto bem bacana para ser trazido em provas!

Vamos em frente!

Pedro Coelho – Defensor Público Federal

 

 

[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 11ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2012, p. 473-474.

[2] AgRg no AREsp 1594445/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 06/02/2020, DJe 14/02/2020.

Por
2 min. de leitura