Jurisprudência 6 – Propriedade industrial e conjunto-imagem (trade dress)

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1 de Novembro de 2017

Informativo de Jurisprudência
Informativo n. 0612
Publicação: 25 de outubro de 2017.

PROCESSO REsp 1.353.451-MG, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, por unanimidade, julgado em 19/09/2017, DJe de 28/09/2017
RAMO DO DIREITO DIREITO EMPRESARIAL
TEMA Propriedade industrial. Conjunto-imagem (trade dress). Comercialização de produto afim. Embalagens assemelhadas. Concorrência desleal. Perícia técnica. Necessidade.

 

DESTAQUE
A caracterização de concorrência desleal por confusão, apta a ensejar a proteção ao conjunto-imagem (trade dress) de bens e produtos é questão fática a ser examinada por meio de perícia técnica.
INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR
A matéria devolvida ao conhecimento do STJ se limita a analisar a extensão protetiva assegurada ao conjunto-imagem de produto ou serviço (trade dress) no que tange à caracterização de danos morais e patrimoniais. Inicialmente, cabe registrar que o conjunto-imagem (trade dress) é a soma de elementos visuais e sensitivos que traduzem uma forma peculiar e suficientemente distintiva, vinculando-se à sua identidade visual, de apresentação do bem no mercado consumidor. Não se confunde com a patente, o desenho industrial ou a marca, apesar de poder ser constituído por elementos passíveis de registro. Embora não disciplinado na Lei n. 9.279/1996, o conjunto-imagem de bens e produtos é passível de proteção judicial quando a utilização de conjunto similar resulte em ato de concorrência desleal, em razão de confusão ou associação com bens e produtos concorrentes (art. 209 da LPI). Cabe destacar que o diálogo entre concorrência e direitos exclusivos decorrentes de propriedades industriais é limitado e somente justificará a intervenção do Judiciário para afastar as condutas concorrenciais que desbordem a razoabilidade da disputa legítima, encontrando suas balizas ora na confusão do consumidor decorrente de imitação desleal (hipótese em análise), ora na usurpação de vantagem alheia decorrente da associação de seu produto ou serviço com a prestação de seu concorrente, situação em que é notório o intuito de “pegar carona” no sucesso obtido pelo investimento de outrem, e não para meramente assegurar um direito de exploração exclusiva a bem não registrado na forma legalmente exigida. Ao se analisar a confusão entre marcas, os parâmetros anunciados pela doutrina já introduziam a importância fundamental dos elementos laterais para captura da atenção e do interesse do público-alvo no momento do posicionamento de produtos no mercado. No contexto do conjunto-imagem, deve-se transpor a fronteira da questão de direito marcário para se adentrar ao campo fático da concorrência desleal, uma vez que se contrapõem marcas dessemelhantes ostensivamente utilizadas, como no caso dos autos, porém se alega que a imagem global do produto é capaz de implantar no imaginário do consumidor a confusão entre os produtos concorrentes. Em razão dessas nuances, a confusão que caracteriza concorrência desleal é questão fática, sujeita a exame técnico, a fim de averiguar o mercado em que inserido o bem e serviço e o resultado da entrada de novo produto na competição, de modo a se alcançar a imprevisibilidade da conduta anticompetitiva aos olhos do mercado.

 
Vamos analisar as regras.
O trade dress ou conjunto-imagem é a imagem do produto apresentado ao consumidor (AQUINO, 2017, 317). Esta imagem consiste em um conjunto de características, que podem incluir, entre outras, uma cor ou esquema de cores, forma, embalagem, configuração do produto, sinais, frases, disposições, estilização e tamanho de letras, gráficos, desenhos, emblemas, brasões, texturas e enfeites ou ornamentos em geral, capazes de identificar determinado produto e diferenciá-lo dos demais (ANIEL, 2007, p. 39).
Uma análise jurisprudencial perante o STJ acerca do tema demonstra que, na maioria dos casos, a caracterização de afronta ao conjunto-imagem tem sido decidida, caso a caso, pelos tribunais locais. Por consequência, o STJ tem se restringido a manter as conclusões dos acórdãos diante da inevitável incidência do óbice do Enunciado n. 7 da Súmula do STJ.
Nesse sentido, citam-se os seguintes acórdãos:
REsp n. 1.306.690/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 23/4/2012;
REsp n. 1.284.971/SP, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, DJe 4/2/2013; e
AgRg no REsp n. 1.391.517/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe 2/3/2015;
Além de decisões monocráticas, entre as quais:
AgRg no AREsp n. 523.706/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, de 16/12/2016;
AREsp n. 969.085/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, de 20/9/2016;
AREsp n. 515.146/SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, de 9/9/2016;
AREsp n. 963.276/SP, Rel. Min. Raul Araújo, de 8/9/2016;
Resp n. 1.354.609/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, de 5/8/2016;
AREsp n. 527.000/SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, de 1º/7/2016;
AREsp n. 688.881/SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, de 11/5/2015.
No REsp. 698.855-RJ, embora versando apenas sobre violação de marca, foi reconhecido, pela egrégia Terceira Turma, que o trade dress merece proteção. A decisão tem a seguinte ementa:
Propriedade Industrial. Alegação de imitação de marca cujo registro fora solicitado pela autora, mas ainda não concedido por ocasião da propositura da ação. Registro obtido no curso do processo. Acórdão que julga improcedente o pedido com fundamento em que, apesar de muito parecidas, as marcas da autora e da ré não seriam capazes de gerar confusão em consumidor atento. Necessidade de reformada decisão. Recurso provido. […] – O fundamento utilizado pelo Tribunal ‘a quo’, de que as marcas do autor e do réu para o sabão em pedra controvertido são parecidas mas não a ponto de confundir o consumidor atento não pode prosperar. O consumidor atento jamais confundiria embalagens de produtos, por mais parecidas que sejam. O que a lei visa a proteger em relação a imitações é a possibilidade de o produto concorrente ser adquirido, por engano, justamente pelo consumidor desatento ou incapaz de reparar nos detalhes da embalagem, seja por falta de instrução, por problemas de visão ou por pressa.Daí a necessidade de prover o recurso especial nessa parte, para conferir aos recorrentes a proteção da marca no período posterior ao deferimento do registro. – A proteção conferida pelo art. 129 da LPI protege apenas a marca a partir do deferimento do registro. O período compreendido entre o protocolo e a concessão do registro é protegido, ou pelo art. 130, III, da referida Lei, ou pelo art. 21, XVI, da Lei nº 8.884/95, conforme o caso. Não tendo sido arguida a violação de nenhum desses artigos, o recurso não merece prosperar nesse aspecto. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.(REsp 698855/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/09/2007, DJ 29/10/2007, p. 218)
No entanto, não é à toa que o constituinte previu de forma expressa a proteção desses direitos no art. 5º, XXIX, da Constituição Federal:
XXIX – a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País
Nesse cenário, dispôs o legislador, no art. 209 da LPI, o direito do prejudicado pela prática de concorrência desleal ao ressarcimento dos prejuízos materiais decorrentes, bem como o respectivo poder-dever de determinar a sustação de eventual violação aos diretos de propriedade industrial atribuído ao Estado-juiz. In verbis:
Art. 209. Fica ressalvado ao prejudicado o direito de haver perdas e danos em ressarcimento de prejuízos causados por atos de violação de direitos de propriedade industrial e atos de concorrência desleal não previstos nesta Lei, tendentes a prejudicar a reputação ou os negócios alheios, a criar confusão entre estabelecimentos comerciais, industriais ou prestadores de serviço, ou entre os produtos e serviços postos no comércio.

  • 1º Poderá o juiz, nos autos da própria ação, para evitar dano irreparável ou de difícil reparação, determinar liminarmente a sustação da violação ou de ato que a enseje, antes da citação do réu, mediante, caso julgue necessário, caução em dinheiro ou garantia fidejussória

Pela definição, percebe-se que o trade dress possui feições distintas da marca tridimensional, pois não abarca apenas a embalagem, o recipiente, pode ir além à medida que pode abarcar o ambiente, ou seja, a decoração da empresa ou de um estabelecimento. A proteção ao trade dress ou conjunto-imagem no Brasil não é considerada uma área cristalina, podendo ser questionada pelo prisma da concorrência desleal, uma vez a Lei n. 9.279/1996 não fez referência expressa (BARBOSA, 2011).
Na própria definição do termo trade dress já se encontra uma primeira interpretação que seria a vestimenta de um produto, sua roupagem. O trade dress é o aspecto geral de como o produto ou serviço é apresentado ao público; é o look and feel, outra expressão que revela bastante o espírito do trade dress, a identidade visual (LIMA, 2009).
Também se distingue do desenho industrial, visto que se considera desenho industrial a forma plástica ornamental de um objeto ou o conjunto ornamental de linhas e cores que possa ser aplicado a um produto, proporcionando resultado visual novo e original na sua configuração externa e que possa servir de tipo de fabricação industrial (art. 95 da LPI). O desenho industrial traz ao produto um novo design, é uma “obra de arte aplicada” à indústria e distingue do modelo de utilidade porque aquele decorre da futilidade, ou seja, não aumenta a utilidade que uma coisa possa ter (MORO, 2010, p. 215). O Desenho Industrial diz respeito à forma dos objetos, especificidades que permitem sua imediata identificação, com caráter meramente estético.
 
Como a situação poderia ser cobrada em Concurso Público:
A Companhia Manufatora de Tecidos de Algodão propôs ação de obrigação de não fazer cumulada com reparação de danos na modalidade lucros cessantes e compensação de danos morais contra a empresa Fábrica de Tecidos São João Evangelista S.A., visto que a requerente sustentou ser titular da marca APOLO de algodão hidrófilo e derivados, cujos produtos seriam comercializados em embalagens especialmente desenvolvidas com padrão de cores e design afeitos à marca. Asseverou que a recorrente, sua concorrente no mesmo segmento de mercado há longa data, sob a marca FAROL, passou, repentinamente, a utilizar embalagens que faziam “clara alusão ao produto”. Diante da situação, assinale a alternativa correta quanto ao posicionamento do STJ acerca do tema do trade dress.

  1. a) A caracterização de concorrência desleal por confusão, apta a ensejar a proteção ao conjunto-imagem (trade dress) de bens e produtos é questão fática a ser examinada por meio de perícia técnica.
  2. b) O trade dress se confunde com a marca tridimensional, visto que ambos os institutos possuem previsão na Lei da Propriedade Industrial, pois podem ter proteção pelo prazo de 10 (dez) anos prorrogáveis por períodos iguais e sucessivos.
  3. c) O trade dress de bens e produtos é passível de proteção judicial expressa na Lei da Propriedade Industrial quando a utilização de conjunto similar resultar em ato de concorrência desleal, em razão de confusão ou associação com bens e produtos concorrentes.
  4. d) O trade dress se confunde com o desenho industrial, por se caracterizar uma inovação estética facilmente reproduzível em escala industrial. A partir de sua publicidade, passa a integrar o estado da técnica, podendo ser protegida pelo prazo de 10 (dez) anos, prorrogáveis por 3 (três) iguais e sucessivos de 5 (cinco) anos.

Gabarito: letra A.
Referências:
AQUINO, Leonardo Gomes de. Curso de direito empresarial: teoria da empresa e direito societário. Brasília: Editora Kiron, 2015.
AQUINO, Leonardo Gomes de. Propriedade Industrial. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2017.
ANIEL, Deniz Allan. Litígios envolvendo conjunto-imagem (trade-dress) no Brasil. ABPI. Rio de Janeiro: nº 87, p. 37-42, mar/ abr. 2007.
BARBOSA, Denis Borges. Do trade dress e suas relações com a Significação secundária. http://www.denisbarbosa.addr.com/ arquivos/200/propriedade/trade_dress.pdf. Novembro de 2011. Acesso em 29.10.2017.
LIMA, Maria Alicia. Pirataria e Contrafação: da propriedade intelectual ao Trade Dress. Anais do XXVIII Seminário Nacional da Propriedade Intelectual. Rio de Janeiro, ABPI, 2008, ps. 69-70
MORO, Maitê Cecília Fabbrini. Marcas tridimensionais. Sua proteção e os aparentes conflitos com a proteção outorgada por outros institutos da propriedade intelectual. São Paulo: Saraiva, 2010.


Leonardo Aquino – Direito Empresarial – Advogado
Mestre em Direito. Pós-Graduado em Direito Empresarial. Pós-graduado em Ciências Jurídico Empresariais. Pós-graduado em Ciências Jurídico Processuais. Especialização em Docência do Ensino Superior. Autor na área jurídica, colunista e articulistas em diversas revistas nacionais e internacionais. Autor dos Livros: (1) Curso de Direito Empresarial: Teoria geral e direito societário; (2) Legislação aplicável à Engenharia; (3) Propriedade Industrial. Conferencista. Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Empresarial. Colaborador na Rádio Justiça. Membro da Comissão de Direito Empresarial da OAB/DF. Presidente da Comissão Nacional de Direito Empresarial da ABA. Professor do Uniceub, do Unieuro e da Escola Superior de Advocacia ESA/DF. Advogado.



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