Por: Projeto Exame de Ordem | Cursos Online
A Cláusula de Reserva de Plenário e a Súmula Vinculante 10
Eu diria que a cláusula de reserva de plenário, ao mesmo tempo que é importantíssima para quem se prepara para concursos públicos, é pouco compreendida pelos candidatos que se preparam para o Exame de Ordem e para concursos públicos em geral!
Prevista no art. 97 da Constituição, é também chamada full bench (banco cheio).
Embora um Juiz de primeira instância possa, isoladamente, declarar a inconstitucionalidade de uma norma (controle difuso), nos tribunais a regra é diferente. Isso porque se prevê que somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros (Plenário) ou dos membros do órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público.
Vale lembrar que, em matéria de controle de constitucionalidade, o ordenamento brasileiro adota um sistema misto, abrangendo o controle difuso – de origem norte-americana – e o controle concentrado, sistema adotado na Europa.
O controle difuso de constitucionalidade pode ser feito por qualquer juiz ou Tribunal do país, enquanto o controle concentrado é realizado apenas pelo STF (guardião da Constituição Federal) e pelo TJ (guardião da Constituição Estadual).
Quando o controle difuso é feito por um tribunal – ex.: STJ, TJDFT, TST, TRE –, incide a regra segundo a qual a norma somente será declarada inconstitucional se houver decisão nesse sentido de maioria absoluta dos membros do tribunal ou de seu órgão especial – ele substitui o plenário do tribunal.
Pensando no STJ para ilustrar, a inconstitucionalidade não poderá ser declarada por um Ministro, por uma Turma ou por uma Seção, ficando reservada à Corte Especial, que é o órgão especial de lá.
A razão da existência da referida cláusula é a seguinte: é certo que uma decisão proferida por um juiz de determinada comarca é importante. No entanto, muito mais importante é uma decisão proferida por um Tribunal da envergadura do STJ, pois nesse último caso todos os Tribunais inferiores indicarão o julgamento a título de orientação e exemplo.
Vale dizer que as decisões dos tribunais são mais importantes e, por isso, não podem ser tomadas monocraticamente ou por um pequeno número de julgadores (órgão fracionário).
Esse tema, de difícil compreensão por grande parte dos estudantes, tem direta relação com a Súmula Vinculante 10, que tem esta redação: “viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”.
Qual a razão de ser da SV 10?
É o seguinte: muitas vezes, para fugir da exigência de submeter a questão relativa à inconstitucionalidade ao Plenário – ou órgão especial –, os órgãos fracionários dos tribunais (turmas, câmaras ou seções) dão ‘um jeitinho’: em vez de dispor que a norma é inconstitucional, eles deixam de aplicá-la. No final das contas, só deixaram de aplicá-la por entenderem que era inconstitucional.
Por fim, cabe alertar que somente será necessário submeter a questão ao Plenário – ou ao órgão especial – quando se entender que a norma é inconstitucional, pois todas as normas nascem com presunção (relativa) de constitucionalidade.
Ou seja, para se afirmar a constitucionalidade da norma, não há necessidade de uma Turma mandar o caso para o Plenário, pois estará confirmando a regra, “chovendo no molhado”.
Foi exatamente dentro dessa diferença que trabalhou o examinador de recente concurso para a Magistratura no DF. Na ocasião, perguntou-se a diferença entre a interpretação conforme a Constituição e a declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto.
Antes mesmo de dar a resposta, vou lembrá-lo de uma dica: todas as vezes que for indagada a diferença entre institutos, você deverá encontrar inicialmente a semelhança – essa dica será importante inclusive para a 2ª fase do Exame de Ordem!
Isso porque as perguntas giram em torno de temas com vários pontos de intersecção. Exemplificando, não será perguntada a diferença entre caneta e relógio. A pergunta recairia sobre a diferença entre tênis e sapato. Em casos assim, o candidato responderia: “embora ambos sejam calçados, masculino e feminino (semelhança), o tênis é utilizado para ocasiões mais casuais, enquanto o sapato para eventos formais” (diferença).
Pois bem.
Voltando à questão feita no concurso do TJDFT, tanto a interpretação conforme a Constituição quanto a declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto são técnicas de manipulação situadas entre os limites constitucionalidade/inconstitucionalidade (elas estariam dentro do grande gênero ‘sentenças intermediárias’, na subdivisão ‘decisões normativas interpretativas’). Além disso, as duas atuam em palavras plurissignificativas – até aqui, vimos as semelhanças!
Avançando sobre a distinção, tem-se que, na interpretação conforme a Constituição, se faz um juízo positivo de constitucionalidade. Em outras palavras, afirma-se a constitucionalidade, o que conduz à desnecessidade de remeter o caso ao Plenário (ou órgão especial, se houver).
Já na declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, o juízo é negativo. Nesse caso, como se profere um juízo de inconstitucionalidade (negativo), será necessária a observância da regra do artigo 97 da CF, ora em estudo.
Por fim, atenção!
Não há necessidade de observância da cláusula de reserva de plenário por juízes de primeira instância, por Turmas Recursais de Juizados Especiais (embora colegiadas, são compostas por juízes de primeiro grau) e também pelas Turmas do STF (STF, AI 607.616).
É isso, futuros advogados! A vermelhinha espera por vocês!
Aragonê Fernandes – Juiz de Direito do TJDF; ex-Promotor de Justiça do MPDF; ex-Assessor de Ministros do STJ; ex-Analista do STF; aprovado em vários concursos públicos. Professor de Direito Constitucional em variados cursos preparatórios para concursos.
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