Lei Geral sobre Concursos Públicos: Uma luz no final do túnel

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21 de fevereiro4 min. de leitura

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No último dia 20/02/14, tive a oportunidade de participar da audiência pública Em defesa do concurso público: diga não ao trem da alegria, realizada na Câmara Federal.

Como todos sabemos, o Senado Federal aprovou em junho do ano passado o Projeto de Lei 74/2010, que trata das normas e procedimentos que deverão ser observados pela Administração Pública para realização de concurso. À época foi aprovado o substitutivo apresentado pelo Senador e virtual candidato ao Governo do DF, Rodrigo Rollemberg, cujas principais características são:

  • o edital do concurso público será publicado integralmente no Diário Oficial da União, com antecedência mínima de 90 dias da realização da primeira prova;
  • é vedada a realização de concurso público com oferta simbólica de vagas ou que se destine, exclusivamente, à formação de cadastro de reserva;
  • exames orais serão apenas classificatórios, não podendo levar à eliminação do candidato;
  • o estabelecimento da taxa de inscrição será de, no máximo, 3% do valor da remuneração inicial prevista para o cargo;
  • a instituição organizadora resguardará o sigilo das provas, podendo seus agentes serem responsabilizados administrativa, civil e penalmente;
  • é assegurado o acesso ao Poder Judiciário para impugnar, no todo ou em parte, o edital normativo do concurso público;
  • o cancelamento ou anulação de concurso público com edital já publicado exige fundamentação objetiva, expressa e razoável, amplamente divulgada, e sujeita o Órgão ou Entidade responsável à indenização pelos prejuízos comprovadamente causados aos candidatos;
  • as inscrições deverão ser disponibilizadas em página da internet, onde os candidatos poderão ler a íntegra do edital e inscrever-se, com a possibilidade de imprimir e salvar em meio eletrônico seu comprovante de inscrição;
  • o período de inscrição será de, no mínimo, 30 dias contados da data da publicação do edital;
  • prova em horário especial por motivo de religião;
  • garante o mínimo de 10% das vagas para pessoas com deficiência;
  • os editas e as provas estarão disponíveis em libras (língua brasileira de sinais);
  • os candidatos aprovados serão nomeados ou contratados com obediência rigorosa da ordem de classificação do concurso público, sob pena de nulidade da investidura;
  • a instituição organizadora deverá disponibilizar sistema de elaboração de recursos pela internet;
  • as provas escritas objetivas serão aplicadas em pelo menos uma capital por região geográfica na qual houver mais de 50 candidatos inscritos.

Em primeiro lugar, não é demais relembrar que a exigência de aprovação prévia em concurso público para se ter acesso à cargo ou emprego públicos tem matriz constitucional e representa um grande avanço da Constituição Federal de 1988.

Nesse sentido, não se tem a necessidade de uma norma de natureza principiológica, mas sim de se estabelecer claramente os parâmetros, limites e regras que devem pautar a Administração Pública na concretização desse princípio constitucional.

O que se vê no Projeto de Lei aprovado no Senado e que agora tramita na Câmara Federal, sob a Relatoria do Deputado Paes Landin, é um conjunto de normas programáticas que, sob alguns aspectos, carecem de maior objetividade e clareza.

Um dos pontos que sinto falta na proposta sob análise, ponto este que venho apresentando há alguns anos em todos os fóruns sobre o assunto, é a previsão da Fase Interna do concurso público.

A Fase Interna serviria para institucionalizar o processo de planejamento e autorização dos concursos públicos. Nesta fase seria necessário se definir e aprovar:

a)      a quantificação das vagas que serão disponibilizadas no certame, considerando os cargos vagos, a previsão de aposentadorias, assim como os projetos de lei aprovados para criação de novos cargos;

b)      declaração da adequação orçamentária, mediante ateste do ordenador de despesas da Unidade gestora, garantindo a existência de recursos orçamentários para suportar as despesas com a realização do certame e com o custeio derivado da posse dos candidatos aprovados e nomeados;

c)      cronograma de lotação do pessoal selecionado.

Além desse aspecto, um tema polêmico que não foi definido no Projeto de Lei, diz respeito às cotas em concursos públicos. O PL limitou-se a determinar a garantia de 10% das vagas para portadores de necessidades especiais, deixando de abordar a questão das cotas para as minorias.

É de conhecimento geral o Projeto de Lei 6738/13, do Executivo, que estabelece cotas raciais em concursos públicos. Também é público o movimento de setores religiosos e daqueles que defendem a igualdade de gêneros para estabelecimento de vagas de preenchimento privativo.

Não me cabe aqui discorrer sobre a importância de se buscar a ampliação do aceso ao mercado de trabalho para as minorias, principalmente aquelas para com as quais o Estado Brasileiro ostenta débitos históricos incalculáveis, como é o caso dos afrodescendentes.

Não obstante, o princípio basilar do concurso público é a meritocracia, aquele que por seu esforço pessoal busca a mobilidade social e o acesso ao cargo público. Qualquer critério diferente da aferição de conhecimentos e competência implicaria no confronto à necessidade de se selecionar os melhores quadros para a Administração Pública.

De forma alguma quero dizer que seria desnecessária a implantação de políticas públicas que viabilizem a redução das desigualdades sociais, tampouco da necessidade de se estabelecer tratamento diferenciado para as minorias.

No entanto, essas políticas públicas e esse tratamento diferenciado devem ser estabelecidos para alterar os mecanismos de acesso à educação e ao mercado de trabalho e para a sociedade, de modo a garantir-lhes igualdade de competição. De forma alguma poder-se-ia criar uma reserva de mercado o que, como falei anteriormente, feriria frontalmente com os princípios constitucionais da isonomia e da eficiência.

Outro ponto que merece destaque, refere-se ao modelo de contratação das bancas examinadora. Comumente, ao se referir a este tema, tem-se à mente a figura das principais e maiores bancas examinadoras nacionais (CESPE, ESAF, FCC, FGV, CESGRANRIO…), mas essa não é a realidade das bancas brasileiras.

Segundo informações da Associação Nacional dos Concurseiros, ANACON, existem mais de duas mil bancas examinadores no país, dos mais diferenciados níveis técnicos, administrativos, gerenciais e operacionais.

Mais do que isso, inexiste no ordenamento jurídico brasileiro qualquer parâmetro ou requisito mínimo de exigência para se criar uma banca examinadora. Basta a elaboração e o registro do ato constitutivo no órgão competente, cadastrar um CNPJ perante a Receita Federal e pronto, pode-se começar a organizar e promover concursos públicos. Dessa forma, proliferam as instituições da espécie. Elas começam com certames de menor porte e de repercussão restrita e, quando menos se espera, são responsáveis por concursos nacionais de médio e grande portes.

Pena o Projeto de Lei não deliberar sobre esse tema de fundamental importância para a adequada implementação dos princípios, normas e regras nele previstos.

É de inexorável relevância se definir requisitos mínimos de caráter técnico, administrativo e operacional para se registrar e estabelecer uma banca examinadora. Ainda, é necessário definir a quem caberia a normatização, a regulamentação, a fiscalização e a punição dos agentes desse mercado.

Finalmente, de se elogiar a forma participativa pela qual vem sendo conduzido esse projeto de lei, assim como a vontade política de se dar uma solução para essa questão, de maneira rápida e eficiente.

Que a Câmara Federal consiga aprimorar o excelente projeto aprovado pelo Senado e, dessa forma, finalmente acabar com os inúmeros trens da alegria e garantir a consolidação dos princípios constitucionais da Administração Pública: legalidade, impessoabilidade, moralidade, publicidade e, acima de tudo, eficiência.

Só quem ganha com a lisura nos concursos públicos, somos nós que nos utilizamos dos serviços do Estado.

WASHINGTON LUÍS BATISTA BARBOSA é especialista em Direito Público e em Direito do Trabalho, MBA Marketing e MBA Formação para Altos Executivos; Desempenhou várias funções na carreira pública e privada, dentre as quais: Assessoria Jurídica da Diretoria Geral e Assessoria Técnica da Secretaria Geral da Presidência do Tribunal Superior do Trabalho, Diretor Fiscal da Procuradoria Geral do Governo do Distrito Federal, Cargos de Alta Administração no Conglomerado Banco do Brasil.Coordenador de Cursos Jurídicos, pós-graduação e preparatórios para concursos públicos.











 

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