O trabalho rural na infância e seus efeitos previdenciários

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Salve Gran Guerreiros(as).

A contagem de tempo de trabalho infantil para efeito previdenciário não deve ter idade mínima. Esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que, ao reformar acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que entendeu que só seria possível admitir o referido tempo a partir dos 14 anos, tendo em vista que o trabalho infantil é proibido pela Constituição Federal.

O que isso significa na prática? O trabalho infantil foi, afinal, “liberado” pelo STJ? Não. Permanece incólume e explícita a proteção ao menor prevista no art. 7º, XXXIII, da CF/88: “é proibido o trabalho noturno, perigoso ou insalubre ao menor de 18 anos e de qualquer trabalho a menor de 16 anos, salvo se aprendiz a partir de 14 ano”.

Além da Constituição Federal, vale mencionar as diversas outras normas referentes à proteção do menor e à vedação à exploração de seu trabalho: o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS); bem como os tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, entre eles o Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, adotado pela ONU em 1966, que aponta o propósito de coibir a exploração da mão de obra infantil.

Feitas essas considerações, vamos à análise da justificativas do relator do Agravo em Recurso Especial nº 956558/SP que deu origem ao entendimento jurisprudencial. Para o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, desconsiderar a atividade exercida antes dos 12 anos (o que era o caso o autor da ação) resultaria em dupla punição ao trabalhador que teve a infância sacrificada pelo trabalho e, no momento da aposentadoria, não poderia considerar esse tempo para o cálculo do benefício.

Importante mencionar a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) no tocante à matéria, evocada pelo relator. Para o STF, a Constituição não pode ser interpretada em prejuízo da criança ou adolescente que exerce atividade laboral, haja vista que a regra constitucional foi criada para a proteção e defesa dos Trabalhadores, não podendo ser utilizada para privá-los dos seus direitos (RE 537.040/SC, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 9.8.2011).

Nessa linha, a interpretação de qualquer regra positivada deve atender aos propósitos de sua edição; no caso de regras protetoras de direitos de menores, a compreensão jurídica não poderá, jamais, contrariar a finalidade protetiva inspiradora da regra jurídica.

Alinhado à jurisprudência do STF,  para o STJ, a rigor, não há que  se estabelecer uma idade mínima para o reconhecimento de labor exercido por crianças e adolescentes, impondo-se ao julgador analisar em cada caso concreto as provas acerca da alegada atividade rural, estabelecendo o seu termo inicial de acordo com a realidade dos autos, e não em um limite mínimo de idade abstratamente preestabelecido.

Outro ponto que foi considerado pelo STJ é o caráter jurídico-positivo da Seguridade Social, conforme a conceituação trazida pelo art. 194 da Constituição Federal, que a coloca em patamar indissociável da garantia da dignidade da pessoa humana: “a seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social”.

Sendo, portanto, o objetivo a proteção social, não deve ser admitido que o não preenchimento do requisito etário, por uma criança impelida a trabalhar antes mesmo dos seus doze anos, prejudique o acesso ao benefício previdenciário.

Ainda no campo jurisprudencial, importante mencionar o entendimento da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) que, ainda em 2016, entendeu ser possível o cômputo do tempo trabalhado por menores de 12 anos, mesmo não se tratando de atividade realizada na agricultura.

À época, a TNU decidiu aplicar entendimento já pacificado para a área rural, nos temos da Súmula 5: “a prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários”.

Portanto, meus caros alunos, se a questão tratar sobre averbação do tempo de trabalho rural para concessão de aposentadoria, ligue o seu radar jurisprudencial e lembre-se das expressões-chaves: universalidade da cobertura da Seguridade Social e dignidade da pessoa humana.

Bons estudos a todos!

Continuem contando comigo nessa caminhada rumo à aprovação!

Prof. Fernando Maciel*

(*) Professor de Direito Previdenciário do Grancursos Online, Procurador Federal em Brasília, Vice-Presidente do Conselho de Recursos da Previdência Social – CRPS, Mestre em Direito das Relações Sociais pela UDF, Master em Prevenção de Acidentes Laborais pela Universidade de Alcalá de Henares (Espanha) e Especialista em Direito de Estado pela UFRGS.

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