Permuta entre membros do Ministério Público: considerações iniciais sobre a Resolução nº 215.2020

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06 de julho3 min. de leitura

No recente dia 02 de julho de 2020 foi publicada, pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), a Resolução n.º 215, a qual regulamenta a permuta no âmbito do Ministério Público brasileiro.

Iniciando por uma análise vertical do tema, é preciso desde logo que se diga: referido ato encontra supedâneo no art. 130-A, § 2º, inciso I da Lei Maior, expressando exercício do poder regulamentador por parte daquele órgão.

Sob o aspecto material, a permuta está prevista no art. 93, inciso VIII-A da Constituição. Em síntese, o preceito dispõe que a remoção a pedido ou a permuta de magistrados de comarca de igual entrância atenderá, no que couber, aos critérios previstos para a promoção na carreira, em razão da antiguidade e do merecimento[1].

Não há dúvidas acerca da existência de margem regulamentar do tema por parte do Conselho Nacional do Ministério Público, bem como da conveniência de se estabelecerem parâmetros mínimos e uniformes que se apliquem a todas as ramificações do Ministério Público brasileiro.

Ao contrário do que se pode imaginar em um primeiro momento, a normativa NÃO autoriza a permuta de membros do Ministério Público pertencentes a ramos diversos. Não está a Resolução n.º 215.2020 a permitir, por exemplo, a permuta entre membros do Ministério Público do Estado de São Paulo e do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, ou mesmo entre membros o Ministério Público Federal e do Ministério Público do Trabalho.

Afinal, é lição corrente que o regulamento não pode contrariar a lei. No que tange ao Ministério Público da União, o art. 182 da LC n.º 75.93 é expresso ao dispor que “os cargos do Ministério Público da União, salvo os de Procurador-Geral da República, Procurador-Geral do Trabalho, Procurador-Geral da Justiça Militar e Procurador-Geral de Justiça do Distrito Federal e Territórios, são de provimento vitalício e constituem as carreiras independentes de cada ramo”. E mais: veda-se a transferência ou aproveitamento nos cargos do Ministério Público da União, mesmo de um para outro de seus ramos (art. 185 da LC 75.93).

Embora o Ministério Público seja uma única instituição, não há dúvidas de que cada um dos seus ramos é detentor de autonomia administrativa, o que implica possuir uma carreira própria de membros.

Assim, a norma possui campo de incidência restrito à permuta entre membros da mesma carreira, o que significa, em outras palavras, que os membros do Ministério Público Federal poderão permutar entre si, o mesmo ocorrendo com os membros do Ministério Público do Trabalho.

Permuta traz consigo a premissa da equivalência. A resolução parte do mesmo suposto e prevê que a permuta será concedida mediante requerimento dos interessados integrantes da mesma carreira, instância e entrância, preservada a respectiva antiguidade no cargo.

Cuida-se, portanto, de ato voluntário, dependente da habilitação dos interessados e que não gera direito à ajuda de custo, em razão do interesse preponderante dos membros requerentes.

Existem impeditivos ao deferimento da permuta, sendo forçoso reconhecer que vários deles possuem o nítido objetivo de preservação do interesse do serviço, evitando que uma das unidades fique com quantitativo inferior de membros.

Nessa linha, não será deferida a permuta: a) se qualquer dos interessados houver requerido aposentadoria voluntária ou já possua tempo suficiente, devidamente homologado, que lhe possibilite requerê-la a qualquer tempo; b) quando o solicitante estiver inscrito em concurso de remoção não finalizado ou quando houver abertura de concurso de remoção; c) se um dos interessados estiver habilitado à promoção por antiguidade em carreira, instância ou entrância superior ou estiver integrado à última lista para ser promovido por merecimento (art. 6º).

Contudo, salvo melhor juízo, destoa do poder regulamentador, o qual deve obediência aos parâmetros previstos na Constituição e nas leis, vedar a permuta quando um dos membros houver sofrido sanção disciplinar no período de 1 (um) ano anterior ao pedido de permuta ou mesmo houver sofrido remoção compulsória no período de 2 (dois) anos anteriores ao pedido de permuta (art. 6º, inciso III, alíneas “e” e “f”).

Isso porque, especialmente no que tange à prática de ilícitos disciplinares, as penalidades encontram-se taxativamente previstas em lei formal, não podendo o poder regulamentar ampliar seus efeitos. Note-se, ainda, que as proibições em nada guardam congruência com os parâmetros previstos no art. 93, inciso VIII-A da Constituição da República.

Enfim, embora a norma possua inegáveis méritos, não soa como uma notícia alvissareira para os membros Ministério Público. Traz disciplina que, mesmo em uma primeira análise, revela problemas. Soma-se, assim, ao extenso arcabouço de atos normativos infralegais e provocará, ainda, uma segunda onda de regulamentações internas.

[1] Com exceção no disposto do art. 93, inciso II, alínea “d”: “na apuração de antiguidade, o tribunal somente poderá recusar o juiz mais antigo pelo voto fundamentado de dois terços de seus membros, conforme procedimento próprio, e assegurada ampla defesa, repetindo-se a votação até fixar-se a indicação”. Todos os demais parâmetros devem, na medida da compatibilidade, serem aplicados à permuta entre magistrados.

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