Reclamante que reside no exterior é obrigado a comparecer à audiência presencial?

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27 de junho3 min. de leitura

No Informativo TST n.º 255 do TST, a mais alta Corte trabalhista do país foi instada a decidir as seguinte questões: reclamante que reside no exterior é obrigado a comparecer à audiência presencial? E mais: caso ela não possa comparecer, é possível enviar alguém em seu lugar para suprir o comparecimento “pessoal”?

Obrigatoriedade, em regra, de comparecimento do empregado à audiência

O art. 843 da CLT estabelece que “na audiência de julgamento deverão estar presentes o reclamante e o reclamado, independentemente do comparecimento de seus representantes salvo, nos casos de Reclamatórias Plúrimas ou Ações de Cumprimento, quando os empregados poderão fazer-se representar pelo Sindicato de sua categoria”. Como se nota, a regra é o comparecimento “pessoal”, sob pena de arquivamento, se a ausência for imputada ao reclamante.

Ao empregador é facultado fazer-se substituir pelo gerente, ou qualquer outro preposto que tenha conhecimento do fato, e cujas declarações obrigarão o proponente (art. 843, § 1º, da CLT). O preposto a que não precisa ser empregado da parte reclamada, conforme artigo 843, § 3º, da CLT, incluído pela Lei nº 13.467, de 2017 (Reforma Trabalhista).

Exceções ao comparecimento do empregado reclamante à audiência

Contudo, há situações excepcionais previstas no § 2º do art. 843 da CLT que justificam a ausência do reclamante/empregado:

Art. 843. […] § 2º Se por doença ou qualquer outro motivo poderoso, devidamente comprovado, não for possível ao empregado comparecer pessoalmente, poderá fazer-se representar por outro empregado que pertença à mesma profissão, ou pelo seu sindicato. (gn)

Esse dispositivo leva a duas principais interrogações:

  • o que é um motivo poderoso?
  • o outro empregado que pertença à mesma profissão precisa estar com contrato de trabalho vigente?

Motivo poderoso é conceito jurídico indeterminado ou aberto. São dispositivos legais mais abertos, muitas vezes ambíguos ou plurissignificativos, que acabam por conferir ao intérprete maior grau de liberdade na subsunção do fato à norma. Os conceitos jurídicos indeterminados (ou conceitos abertos) compreendem as expressões utilizadas pelo legislador que apresentam incertezas linguísticas, admitindo sentidos e interpretações heterogêneas

Mas, mesmo nestes conceitos, a liberdade não é ampla. Há limites semânticos a serem observados. As expressões não admitem todo e qualquer significado que venha a ser atribuído pelo intérprete da norma, pois as expressões possuem significados linguísticos que limitam a atividade interpretativa.

Dessa forma, é possível extrair determinadas certezas dos conceitos jurídicos indeterminados: zona de certeza positiva (hipóteses que se inserem no conceito) e zona de certeza negativa (situações que não são englobadas pelo conceito). Entre as “zonas de certezas”, encontra-se a denominada “zona de penumbra” (ou “zona de incerteza”) que compreende hipóteses que geram dúvidas no intérprete sobre a sua adequação ao conceito indeterminado.

No caso concreto, a Reclamante estava comprovadamente residindo no exterior. Sem dúvidas, trata-se de motivo poderoso, sobretudo em razão dos custos de deslocamento. Exigir a presença da Reclamante sob pena de arquivamento implica denegação de acesso à Justiça.

Contudo, a discussão central no caso não era o “motivo poderoso”, mas sim a interpretação do trecho normativo “fazer-se representar por outro empregado que pertença à mesma profissão”, previsto na parte final do § 2º, do artigo 843, da CLT.

Ao analisar o caso, o TRT manteve a sentença que determinou o arquivamento do feito, em razão da ausência da reclamante em audiência, mesmo estando ela representada por uma colega de profissão. Em síntese, eis os fundamentos do Regional e da sentença:

Ainda que se reconheça a residência em outro país (Austrália) como motivo poderoso para sua ausência […] Não há como reconhecer que a reclamante foi devidamente representada em audiência por outro empregado da mesma profissão”, pois “a Sra. Amanda, presente em todas as audiências como representante da reclamante (…) teve seu vínculo com a empresa Webjet Linhas Aéreas S/A encerrado em 04/09/2011” e não há “notícia de outro vínculo com empresa da mesma categoria”.

Nota-se que o TRT deu uma interpretação bastante restritiva e literal ao § 2º, do artigo 843, da CLT e entendeu que a representação por outro empregado que pertença à mesma profissão só será válida caso o Representante esteja com vínculo empregatício ativo na categoria.

Contudo, o TST entendeu diferente. Para a Corte trabalhista máxima, o simples fato de a representante não possuir vínculo ativo com empresa da categoria dos aeroviários não afasta a compreensão de que atua na mesma profissão da reclamante, máxime porquanto registrado que a referida representante possuía vínculo com a “Webjet Linhas Aéreas S/A”.

Desse modo, entendeu válida a representação em audiência. Segundo o TST, com base nos registros do acórdão regional, não há dúvida de que, por ocasião da audiência, a reclamante estava residindo fora do país – na Austrália. Assim, há de se concluir que a representante da autora – Sra. Amanda -, além de afigurar-se legítima para o ato processual, desincumbiu-se, a contento, do ônus de demonstrar o motivo da ausência da reclamante na audiência. Portanto, ao manter a determinação de arquivamento do feito, o TRT violou a norma do artigo 843, § 2º, da CLT.

Em síntese, confira o resumo do entendimento:

Comprovação de residência no exterior é motivo poderoso apto a justificar a ausência do Reclamante à audiência. A representação do Reclamante ausente à audiência, por outro empregado que pertença à mesma profissão, será válida ainda que o representante não possua, no momento, vínculo ativo com empresa da mesma categoria. TST-RR-1000580-48.2017.5.02.0321, 1ª Turma, rel. Min. Hugo Carlos Scheuermann, julgado em 1º/6/2022 – Informativo TST n.º 255.

 

 

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